domingo, 25 de outubro de 2020

 

“MESTRE, QUAL É O MAIOR MANDAMENTO DA LEI?” (Mt 22,36).

 XXX DOMINGO DO TEMPO COMUM

Ano – A; Cor – Verde; Leituras: Ex 22,20-26; Sl 17 (18); 1Ts 1,5-10; Mt 22,34-40.


Diácono Milton Restivo


No Evangelho desta liturgia as autoridades religiosas judaicas continuam azucrinando o sossego de Jesus.

Neste capítulo 22 de Mateus, em primeiro lugar, Jesus fez calar os fariseus quando eles perguntaram se era lícito pagar o imposto a César (cf Mt 11,15-22), fato que vimos no Evangelho do domingo passado.

Os saduceus, sabendo que Jesus calara os fariseus, voltam à carga, testando Jesus sobre a ressurreição, considerando que eles, os saduceus, não acreditavam na ressurreição dos mortos (cf Mt 22,23-33), tendo-os, também, calado Jesus.

Agora os fariseus voltam à carga: “Os fariseus ouviram dizer que Jesus tinha feito os saduceus se calarem. Então eles se reuniram em grupo, e um deles perguntou a Jesus: ‘Mestre, qual é o maior mandamento da Lei’?” (Mt 22,34-36).

Que idiotice. Que pergunta mais estúpida, considerando que eles, os fariseus, se julgavam os mestres da Lei e os orientadores do povo em tudo aquilo que dizia respeito à Lei de Moisés.

É ou não é para tentar Jesus?

Todos os judeus que se prezavam, tinham conhecimento pleno da Lei de Moisés e sabiam de cor e salteado todos os Salmos e todos os mandamentos da Lei mosaica e, com certeza sabiam, de uma maneira especial, qual seria o maior mandamento da Lei.

Aos dez mandamentos de Moisés os fariseus acrescentaram, por conta deles mesmos, mais 613 mandamentos que chegavam às raias do absurdo que obrigavam o povo conhecê-los e cumpri-los, e quem não os cumprissem eram considerados “malditos”: “Essa multidão que não conhece a Lei é feita de malditos” (Jo 7,49).

Os fariseus desprezavam os judeus que não cumpriam as suas leis e o chamavam de maldito, merecendo, por isso, uma reprimenda por parte de Jesus, que chamou a atenção do povo a respeito deles, dizendo: “Os doutores da Lei e os fariseus têm autoridade para interpretar a Lei de Moisés. Por isso, vocês devem fazer o observar tudo o que eles dizem. Mas não imitem suas ações, pois eles falam e não praticam. Amarram pesados fardos e os colocam no ombro dos outros, mas eles mesmos não estão dispostos a movê-los, nem sequer com um dedo.” (Mt 23,2-4) e, voltando-se para os fariseus, Jesus lhes disse: “Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas! Vocês fecham o Reino do Céu para os homens. Nem vocês entram, nem deixam entrar aqueles que desejam. [...] Guias cegos! Vocês coam um mosquito, mas engolem um camelo. [...] Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas. Vocês são como sepulcros caiados: por fora parecem bonitos, mas por dentro estão cheio de ossos de mortos e podridão. Assim também vocês: por fora parecem justos diante dos outros, mas por dentro estão cheios de hipocrisia e injustiça.” (Mt 23,13.24.27-28).

Será que nós mesmos não nos identificamos com esse tipo de gente? Aonde essa corja quer chegar tentando Jesus dessa maneira?

A primeira leitura, tirada do livro do Êxodo, fala sobre as leis morais e religiosas que é transmitida ao povo israelita quando ainda estava na caminhada do deserto, rumo a Terra Prometida. Orienta sobre o respeito que se deve ter ao estrangeiro e a assistência que se deve dispensar para a viúva e ao órfão; orienta sobre tomar objetos como penhor do pobre e, se acaso for necessário emprestar dinheiro ao necessitado, que não o faça com usura, isto é, cobrando altos juros. Tudo isso gira em torno do amor e do respeito que deve ser dispensado ao próximo, seja ele estrangeiro, ou do próprio povo, ou viúva, ou órfão, ou pobre, ou necessitado (cf Ex 22,20-26).

O amor e o respeito ao próximo deve ser indiscriminado. E essa passagem do Êxodo refere-se ao segundo mandamento mais importante da Lei, conforme o próprio Jesus respondeu aos fariseus, que se faziam passar por inconvenientes e idiotas a respeito do amor e respeito que se deve dedicar ao próximo, ao que Jesus classificou como o segundo mandamento mais importante: “O segundo é semelhante a esse: ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22,39).

Esse mandamento do amor ao próximo está prescrito no livro do Levítico, 19,18, que os fariseus sabiam como ninguém: “Não espalhe boatos nem levante falso testemunho contra o seu próximo. Eu sou Yahweh. Em seu coração não rejeite o seu irmão. [...] Não seja vingativo, nem fique vigiando contra os filhos do seu povo. Ame o seu próximo como a si mesmo. Eu sou Yahweh. Observem meus estatutos” (Lv 19,16-17a.18-19).

Então os fariseus conheciam esse mandamento e queriam somente conturbar a presença de Jesus em Jerusalém.

Na Lei de Moisés, apesar de ser citado esse mandamento, não consta esse mandamento como sendo o segundo mais importante, mas Jesus assim o coloca porque só se pode amar a Deus através do próximo, do irmão, da irmã e, por várias vezes, Jesus insiste neste mandamento, que se resume em uma única palavra: “amor”.

A partir do ensinamento de Jesus fica claro um mandamento novo, que se resume exatamente no amor: “Eu dou a vocês um mandamento novo: amem-se uns aos outros. Assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros.” (Jo 13,34).

Mas, o que Jesus quer dizer com um “mandamento novo”? Estaria Jesus abolindo os mandamentos da antiga aliança, os mandamentos ditados por Moisés? Não, porque ele mesmo dissera: “Não pensem que eu vim abolir a Lei e os Profetas. Não vim abolir, mas dar-lhes pleno cumprimento”. (Mt 5,17).

Certo. Está claro que Jesus não altera, absolutamente, o decálogo, os dez mandamentos transmitidos por Moisés. Então, será que Jesus quer acrescentar mais um mandamento aos dez do Antigo Testamento? Absolutamente, não.

O novo mandamento do amor, deixado por Jesus, não altera o antigo e nem acrescenta um novo mandamento. Apenas reforça e insiste no cumprimento dos mandamentos da antiga aliança porque, quem ama de verdade o próximo, ama em primeiro lugar a Deus sobre todas as coisas, não pronunciando o santo nome de Deus em vão, respeita o domingo, que é o dia do Senhor, honra o pai e a mãe, jamais procura fazer o mal a quem quer que seja, não praticando violência contra o próximo, procurando dele não tirar proveito, não atenta contra a vida do próximo, não comete adultério, não rouba e nem furta, não fala mal do próximo, procurando não levantar falso testemunho, não deseja nada que seja do próximo, respeitando a sua propriedade, os seus direitos, a sua mulher, o seu marido.

Então, o novo mandamento do amor deixado por Jesus abrange todos os mandamentos da lei antiga, porque, quem ama o próximo, nos moldes dos ensinamentos de Jesus, nada fará que prejudique o próximo, amando, em primeira instância a Deus sobre todas as coisas.

Temos que considerar também que, os mandamentos de Moisés são expressos de maneira negativa: não matar... Não roubar... Não desejar... O novo mandamento de Jesus é positivo: “amem-se uns aos outros. Assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros.” (Jo 13,34).

Interessante. Jesus não somente dá um mandamento novo e positivo: “amem-se uns aos outros”, mas ele próprio nos dá o exemplo de como devemos nos amar: “assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros”. E como Jesus nos amou? Quais foram as consequências? Temos consciência disso? Nos amamos como Jesus nos amou?  

Jesus não somente incentivou aos seus discípulos a amarem-se uns aos outros. Ele os amou primeiro e até o fim, até a sua morte: “Antes da festa da Páscoa, Jesus sabia que tinha chegado a sua hora. A hora de passar deste mundo para o Pai. Ele que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.” (Jo 13,1). “O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros como eu amei vocês. Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos. Vocês são meus amigos, se fizerem o que eu estou mandando.”. (Jo 15,12-14).  Mentalize a música do padre Zezinho: “Um dia uma criança me parou... amar como Jesus amou...”

Quando foi feita a Jesus a pergunta: "Qual é o maior mandamento da lei?", Jesus responde "Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: amarás o teu próximo como a ti mesmo. Desses dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas" (Mt 22,37-40).

O decálogo de Moisés deve ser interpretado à luz desse duplo e único mandamento do amor – amar a Deus sobre todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo -, que é a plenitude da lei.

Para aqueles que lhe fizeram essa pergunta, os fariseus, Jesus deixa claro que a justiça de Deus supera a lei dos escribas e fariseus como também a dos pagãos, conforme disse Jesus ao povo: “Porque eu lhes digo: Se a justiça de vocês não superar a justiça dos doutores da Lei e fariseus, vocês não entrarão no Reino dos Céus” (Mt 5,20).

Jesus desenvolveu todas as exigências dos mandamentos e os explicita de modo claro, preciso e como nunca haviam antes sido interpretados: “Vocês ouviram o que foi dito aos antigos: ‘Não mate! Quem matar será condenado pelo tribunal’. Eu, porém, lhes digo: todo aquele que fica com raiva do seu irmão, se torna réu perante o tribunal’.” (Mt 5,21-22a).

Repito: Jesus não somente incentivou aos seus discípulos a amarem-se uns aos outros. Ele os amou primeiro e até o fim, até a sua morte: “Antes da festa da Páscoa, Jesus sabia que tinha chegado a sua hora. A hora de passar deste mundo para o Pai. Ele que tinha amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.” (Jo 13,1), vivendo e confirmando aquilo que ele diria aos seus discípulos, o que seria uma verdadeira prova de amor: “O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros como eu amei vocês. Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos. Vocês são meus amigos, se fizerem o que eu estou mandando.”. (Jo 15,12-14).  

João Evangelista, chamado também de “o apóstolo do amor”, na sua carta, ratifica esse testemunho de amor de Jesus: “Compreendemos o que é amor, porque Jesus deu a sua vida por nós. Portanto, nós também devemos dar a vida pelos irmãos,” (1Jo 3,16).

Depois de dar o exemplo do verdadeiro amor, Jesus continua falando sobre o novo mandamento: “Assim como o Pai me amou, eu também amei vocês: permaneçam no meu amor. Se vocês obedecem aos meus mandamentos, permanecerão no meu amor, assim como eu obedeci aos mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor.” (Jo 15,9-10). “Se vocês tiverem amor uns pelos outros, todos reconhecerão que vocês são meus discípulos.” (Jo 13,35).

O Apóstolo do amor reafirma aos seus discípulos o novo mandamento de Jesus: “Filhinhos, não lhes comunico um mandamento novo, mas o mandamento antigo, esse mesmo que vocês receberam desde o princípio. O mandamento antigo é a palavra que vocês ouviram. E, no entanto, o mandamento que lhes comunico é novo – pois ele é verdadeiro em Jesus e em vocês – porque as trevas já estão se afastando, e a verdadeira luz já está brilhando. Quem afirma que está na luz, mas odeia o seu irmão, ainda está nas trevas. Quem ama o seu irmão permanece na luz, e nele não há ocasião de tropeço. Ao contrário, quem odeia o seu irmão está nas trevas: caminha nas trevas e não sabe aonde vai, porque as trevas lhe cegaram os olhos.” (1Jo 2,7-11).

E João continua na insistência do mandamento do amor ao próximo que ele aprendera com Jesus: “Amados, amemo-nos uns aos outros, pois o amor vem de Deus. E todo aquele que ama, nasceu de Deus, e conhece a Deus, porque Deus é amor. [...] No amor não existe medo; pelo contrário, o amor perfeito lança fora o medo, porque o medo supõe castigo. Por conseguinte, quem sente medo, ainda não está realizado no amor. Quanto a nós, amemo-nos porque ele nos amou primeiro. Se alguém diz: ‘Eu amo a Deus’ e, no entanto, odeia o seu irmão, esse tal é mentiroso; pois quem não ama a seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê. E este é justamente o mandamento que dele recebemos: quem ama a Deus, ame também o seu irmão.” (1Jo 4,7-8.18-21).

Amar a Deus significa fazer-se próximo do próximo a quem se manifesta amor de Deus em forma de fraternidade.

O amor é a manifestação da fé e do respeito que temos ao próximo, porque o amor a Deus não se mede de outra maneira que não seja pelo amor dedicado ao próximo.

Deus não admite o amor a si sem que este amor se torne gestos concretos de caridade.

João é categórico quando fala a respeito disso: “Se alguém possui os bens deste mundo e, vendo seu irmão em necessidade, fecha-lhe o coração, como pode o amor de Deus permanecer nele? Filhinhos, não amemos com palavras nem com a língua, mas com obras e de verdade.” (1Jo 4,17-18).

Para que os homens pudessem entender melhor o novo mandamento do amor, Jesus os prepara com a chamada “regra de ouro”: “Não julguem e vocês não serão julgados. De fato, vocês serão julgados com o mesmo julgamento com que vocês julgarem, e serão medidos com a mesma medida com que vocês medirem. [...] Tudo o que vocês desejam que os outros façam a vocês, façam vocês também a eles. Pois nisso consiste a Lei e os Profetas.” (Mt 7,1-2.12).

Nisso consiste a Lei e os Profetas, sim, mas Jesus transfere essa regra de ouro aos seus discípulos porque, o verdadeiro amor que se deve dedicar ao próximo seria tratá-lo como gostaríamos de ser tratados, ou seja, nos colocarmos no lugar do próximo quando lhe dedicamos atenção e respeito.

Amar ao próximo como a nós mesmos: fazer pelos outros o que desejaríamos que os outros fizessem por nós e para nós. Essa é a expressão mais completa do amor, da caridade, porque resume e inclui todos os deveres do homem para com o próximo, de um ser humano para outro ser humano, feitos à imagem e semelhança do Criador: “E Deus disse: ‘Façamos o ser humano à nossa imagem e semelhança” (Gn 1,26).

Essa é a regra de ouro a respeito do que devemos fazer aos outros, que foi ensinada a Tobias por seu pai, que lhe disse: “Não faça para ninguém aquilo que você não gosta que façam para você” (Tb 4,15a), e que foi repetida por Jesus centenas de anos mais tarde: “Portanto, façam às pessoas o mesmo que vocês desejam que elas façam a vocês” (Mt 7,12).  

Aquilo que desejamos que os outros façam para nós, façamos para eles também. Com que direito exigiríamos dos nossos semelhantes melhor procedimento, mais respeito, mais benevolência e devotamento para conosco, do que os teríamos para com eles?

Jesus, na oração sacerdotal, quando preparava os discípulos para a sua morte de cruz, pede ao Pai, que o amor do Pai por ele, seja o mesmo amor que o Pai destinará aos seus discípulos: “Pai justo, o mundo não te reconheceu, mas eu te reconheci. Estes também reconheceram que tu me enviaste. E eu tornei o teu nome conhecido para eles. E continuarei a torná-lo conhecido para que o amor com que me amaste esteja neles, e eu mesmo esteja neles.” (Jo 17,25-26).

Meu Deus, agora me apercebo que, aproveitando o ensejo da pergunta dos fariseus a Jesus sobre qual seria o maior mandamento, só falei do amor ao próximo. E o primeiro mandamento, como fica? 

O Antigo Testamento e a Lei de Moisés, em particular, são claros, objetivos, precisos e insistentes quanto ao amor que se deve ter com Deus, e afirmam: “Ame a Yahweh seu Deus com todo o seu coração, com toda a sua alma com toda a sua força.” (Dt 6,5), e foi isso que Jesus repetiu aos fariseus no que diz respeito ao primeiro mandamento.

Quanto a isso, todas as autoridades religiosas judias, os fariseus, os saduceus, os escribas e os doutores da Lei conheciam.

O que eles não levavam a sério seria que “o segundo é semelhante a esse: ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22,39). Isso eles não sabiam e, se soubessem, desprezavam.

Com respeito ao amor que devemos a Deus, ouçamos João: “Amados, amemo-nos uns aos outros, pois o amor vem de Deus. E todo aquele que ama, nasceu de Deus e conhece a Deus. Quem não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. Nisto se tornou visível o amor de Deus entre nós: Deus enviou o seu Filho único a este mundo para dar-nos a vida por meio dele. E o amor consiste no seguinte: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele que nos amou, e nos enviou o seu Filho como vítima expiatória por nossos pecados. [...] Quanto a nós, amemo-nos, porque ele nos amou primeiro.” (1Jo 4,7-19).

Deus nos amou primeiro. Pelo menos por isso, amemos a Deus sobre todas as coisas.

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