III DOMINGO DA QUARESMA
Ano – B; Cor – Roxo; Leituras: Ex 20,1-17; Sl 18; 1Cor 22-25; Jo 2,13-25.
"DESTRUAM ESSE TEMPLO, E EM TRÊS DIAS O LEVANTAREI." (Jo 2,19).
Diácono Milton Restivo
Na primeira leitura Moisés recebe de Yahweh o decálogo, as dez palavras, os dez mandamentos para que o povo israelita entendesse qual seria o coração da lei mosaica. A Lei da Antiga Aliança vai manter o seu valor na nova Aliança. Jesus lembra os mandamentos dados por Yahweh aos israelitas no deserto acrescentando a eles o selo da perfeição, os conselhos evangélicos, conforme consta em Marcos 10,7-21.
Os mandamentos, também chamados de Aliança de Yahweh com seu povo, determinam os princípios fundamentais da lei hebraica: “Ele (Yahweh) lhes comunicou então a sua Aliança, para que vocês a cumprissem: as Dez Palavras, que ele escreveu em duas tábuas de pedra.” (Dt 4,13).
O livro do Êxodo inicia a narrativa do decálogo dizendo que os dez mandamentos foram transmitidos oralmente por Yahweh a Moisés: “Então Deus pronunciou todas estas palavras...” (Ex 20,1). Já, em outras partes desse mesmo livro, diz-se que Yahweh escreveu, com suas próprias mãos, os dez mandamentos e os entregou a Moisés: “Yahweh disse a Moisés: ‘Suba até junto de mim na montanha, pois eu estarei ai para lhe dar as tábuas de pedra com a lei e os mandamentos que escrevi para você os instruir.” (Ex 24,12); “As tábuas eram obras de Deus, e a escritura era feita por Deus, gravada nas tábuas.” (Ex 32,16); “Yahweh disse a Moisés: [...] e eu escreverei as mesmas palavras que estavam nas primeiras tábuas que você quebrou.” (Ex 34,1).
Depois de receber os mandamentos e outras orientações e descer do monte, e ao ver que o povo havia se afastado de Deus, adorando um bezerro de ouro (cf Ex 32,1-6), Moisés, num ímpeto de raiva quebrou as tábuas: “Quando se aproximou do acampamento e viu o bezerro e as danças, Moisés ficou enfurecido, jogou as tábuas e as quebrou no pé da montanha.” (Ex 32,19).
Yahweh, porém, determinou a Moisés que subisse novamente à montanha para receber novas tábuas: “Yahweh disse a Moisés: Corte duas tábuas de pedra, como as primeiras, suba ao meu encontro na montanha, e eu escreverei as mesmas palavras que estavam nas primeiras tábuas que você quebrou.” (Ex 34,1). Os dez mandamentos deveriam ser os conceitos fundamentais da lei mosaica para o povo da Antiga Aliança, aperfeiçoados por Jesus para o povo da Nova Aliança.
Os mandamentos dados por Yahweh a Moisés estão repetidos na sua íntegra no livro do Deuteronômio 5,6-21 e são chamados, também, de “Aliança” (cf Dt 4,13). O objetivo dos mandamentos dados por Yahweh a Israel era que esse povo tivesse uma vida de santidade e justiça.
Jesus resumiu os mandamentos da Antiga Aliança em apenas dois mandamentos: amar a Deus acima de tudo, com todo o nosso coração, alma, fé e entendimento, e ao nosso próximo como a nós mesmo: “Ame ao Senhor seu Deus com todo o seu coração, com toda a sua alma, e com todo o seu entendimento. Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: ame ao seu próximo como a si mesmo. Toda a Lei e os Profetas dependem desses dois mandamentos.” (Mt 22,36-40). Jesus resume os mandamentos da Antiga Aliança no mandamento do amor: “Eu dou a vocês um mandamento novo: amem-se uns aos outros. Assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros. Se vocês tiverem amor uns para com os outros, todos reconhecerão que vocês são meus discípulos.” (Jo 13,34-35). Este é o grande e o único mandamento da nova Lei: o Amor.
Amar em primeira instância a Deus, depois ao próximo. Quem ama de verdade o próximo não mata, não rouba, não comete violência, não levanta falsos testemunhos, não deseja nada do que é do próximo, não comete adultério e não faz nada que possa prejudicar de qualquer maneira o próximo. No novo mandamento do amor deixado por Jesus estão incluídos todos os demais mandamentos.
No Salmo 18 Davi agradece a Yahweh por ter ouvido suas orações e súplicas e manifesta seu amor e adoração a Yahweh: “Eu te amo, Yahweh. Tu és a minha força.” (Sl 18,3). Davi fala de sua felicidade e vitória na confiança em Deus e expressa tudo aquilo que Yahweh representa em sua vida: “Yahweh, meu rochedo, minha fortaleza, meu libertador; meu Deus, rocha minha, meu refúgio, meu escudo, força que me salva, meu baluarte! Louvado seja! Eu invoquei Yahweh, e fui salvo dos meus inimigos!” (Sl 18,3-4). Neste salmo de adoração pública, o salmista louva a Deus por livrá-lo de todos os seus inimigos: “Louvado seja! Eu invoquei Yahweh, e fui salvo dos meus inimigos. [...] Livrou-me de um poderoso inimigo, de adversários mais fortes do que eu.” (Sl 18,4.18). Davi considera sua vitória uma recompensa de Deus ao seu modo justo de viver: “Yahweh me tratou segundo minha justiça, e me retribuiu conforme a pureza de minhas mãos, porque observei os caminhos de Yahweh, e não me rebelei contra meu Deus. [...] Yahweh retribuiu a minha justiça, a pureza de minhas mãos em sua presença.” (Sl 18,21-22.25).
Davi enaltece o caminho de Deus e atesta a veracidade da Palavra de Yahweh: “O caminho de Deus é perfeito, a palavra de Yahweh é comprovada, Ele é um escudo para os que nele se abrigam. Quem é Deus além de Yahweh? E quem é rochedo, fora o nosso Deus? Ele é o Deus que me cinge de força, e torna perfeito o meu caminho.” (Sl 18,31- 33). Davi agradece e dá vivas a Yahweh por te-lo atendido em suas orações: “Viva Yahweh! Bendito seja o meu rochedo! Exaltado seja o meu Deus e salvador, o Deus que me concedeu as vinganças e submeteu a mim os povos; que me livrou de inimigos furiosos, me exaltou sobre os meus agressores, e me salvou do homem cruel. Por isso eu te louvo entre as nações, Yahweh, e toco em honra de teu nome.” (Sl 18,47-50).
A oração é expressão de confiança. Somente aqueles que confiam em Deus o invocam.
No Evangelho deste domingo “Estando próxima a páscoa dos judeus, Jesus subiu a Jerusalém.” (Jo 2,13). Chegando à cidade de Jerusalém Jesus sentiu necessidade de recolhimento e oração e dirigiu-se ao Templo, aquele mesmo majestoso Templo construído pelo rei Salomão e, depois, reconstruído pelo rei Herodes, e que era o orgulho da nação judaica. Ao adentrar no Templo, que decepção: Jesus “encontrou os vendedores de bois, de ovelhas, de pombas e os cambistas sentados.” (Jo, 2, 14). Jesus, cuidadoso com as coisas do Pai e, como não poderia deixar de ser e mostrando plena coerência com aquilo que, quando aos doze anos de idade, havia dito à sua mãe quando por ela foi encontrado no Templo “... sentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os” (Lc 2,46), tendo afirmado: “Porque me procuravam? Não sabia que eu devo estar na casa do meu Pai?” (Lc, 2,49), ao ver aquela baderna no interior do Templo que mais parecia um mercado persa ou mercado de peixe, ficou extremamente indignado e, sem pensar duas vezes, “... fez um chicote de cordas, expulsou todos do Templo, com as ovelhas e com os bois; lançou ao chão o dinheiro dos cambistas e derrubou as mesas, e disse aos que vendiam pombas: Tirem tudo isso daqui; não façam da casa de meu Pai uma casa de comércio.” (Jo 2,15-16).
O sangue de Jesus ferveu nas veias. Ele não podia suportar e permitir tão grande desrespeito com o Templo, a casa do Senhor. Não titubeou: lançou mão de uma corda, fazendo-a de chicote como fazem as mães que querem disciplinar seus filhos por algo que tenham feito de errado, (pelo menos antigamente) e começou a bater indistintamente em quem vendia ou comprava promovendo aquela baderna no Templo expulsando-os a todos e, indignado, dizendo, como já havia dito seiscentos anos antes o profeta Isaias: “A minha casa será chamada casa de oração, mas vocês fizeram dela um covil de ladrões.” (Mt 21,13; Is 56,6b).
Em seguida, Jesus compara o Templo de pedra com o seu próprio corpo, fazendo uma alusão à sua morte e ressurreição ao terceiro dia depois de os judeus terem-no interpelado sobre com que autoridade Jesus agira daquela maneira, dizendo: “’Com que sinal nos mostras tu que tens autoridade para fazer estas coisas?’ Jesus respondeu-lhes e disse: ‘Destruí este templo e eu o reedificarei em três dias’.” (Jo 2,18-19).
Jesus se referia ao Templo de seu corpo que seria entregue para a morte e ao terceiro dia seria reedificado pela ressurreição. Mas os judeus não o entenderam, julgando que ele falava do Templo de pedra que Herodes levara quarenta e seis anos para reconstruir e como Jesus o reconstruiria, depois de destruído, em apenas três dias? “Replicaram, pois, os judeus: ‘Este templo foi edificado em quarenta e seis anos, e tu o reedificarás em três dias?’ Ora, ele falava do templo de seu corpo. Quando, pois, ressuscitou dos mortos lembraram-se seus discípulos do que ele dissera e creram na Escritura e nas palavras que Jesus tinha dito." (Jo 2, 20-22).
O Apóstolo Paulo, mais tarde em suas cartas, corrobora essa afirmativa de Jesus, dizendo: “Vocês não sabem que são Templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vocês? Se algum violar o Templo de Deus, Deus o destruirá. Com efeito, é santo o Templo de Deus, que são vocês.” (1Cor 3,16-17). Jesus fica indignado com o desrespeito promovido contra a casa do Senhor, o Templo de pedra construído por mãos humanas, mas deixa claro que, mais importante que o Templo de pedra é o Templo de carne e osso que somos nós, que é o nosso próprio corpo, conforme afirmativa de Paulo, Apóstolo: “Porventura vocês não sabem que os seus membros são Templo do Espírito Santo que habita em vocês, que foi dado a vocês por Deus, e que não vocês não pertencem a si mesmos? Porque vocês foram comprados por um grande preço. Glorifiquem e tragam Deus no seu corpo.” (1Cor 6,19-20). Jesus teve tanto zelo com o Templo de pedra, quanto mais os cristãos deveriam ter zelo com o seu próprio corpo que é a casa de Deus, o templo do Espírito Santo.
Ao expulsar os vendilhões do templo Jesus diz indignado: “... minha casa será chamada casa de oração. Vocês, porém, fazem dela um covil de ladrões.” (Mt 21,13). Quantas vezes transformamos o nosso corpo em “covil de ladrões", permitindo que pensamentos escusos, ações indignas, gestos agressivos, atitudes anticristãs, desrespeito ao próximo, mentiras, falsos testemunhos, infidelidades se apoderem do nosso corpo, maculando, assim, o templo do Espírito Santo. Quantas vezes permitimos que o nosso corpo se transforme num “covil de ladrões”, um esconderijo de más intenções e de atitudes dúbias e escusas que magoam o coração de Jesus, e ele, zeloso como é com as coisas de Deus, não tem outra alternativa senão empunhar uma corda, dobrá-la em duas, fazer dela um chicote e nos chicotear através de uma chamada de atenção, de uma doença, de uma infelicidade, de um contratempo, de um mau negócio para nos dizer que alguma coisa está errada em nossas atitudes, em nossas vidas. Como profanamos o nosso corpo; como o desrespeitamos sem medirmos consequências. Todos os excessos que praticamos são prejudiciais à saúde e um ultraje ao nosso corpo, em suma, uma profanação ao Templo do Espírito Santo.
O cigarro fumado indiscriminadamente e em qualquer lugar, envenena os pulmões, contamina o sangue, atingindo com a sua fumaça e nicotina a todos os que circundam o fumante, poluindo o ambiente. A bebida alcoólica que é ingerida contamina o sangue, diminui a capacidade de ação e raciocínio do cérebro, tira a sobriedade e a seriedade da vida normal, fazendo quem ingere tais bebidas ser agressivo ou passar por chacotas. Os remédios em excesso que é ingerido provocam distúrbios de toda espécie. Drogas violentam a natureza humana e a saúde. A prostituição degrada ao nível dos animais irracionais, e quantas coisas mais que são feitas que profanam o corpo humano que é a casa de Deus, o Templo do Espírito Santo. Tudo o que é feito e que coloca em risco a saúde, o bem estar, a integridade física, males tanto materiais como espirituais, está profanando o Templo de Deus, que é o corpo: “Vocês não sabem que os seus membros são templo do Espírito Santo que habita em vocês, que foi dado a vocês por Deus, e que vocês não pertencem a si mesmos?... Glorifiquem e tragam a Deus no vosso corpo.” (1Cor 6,19-20).
Assim como Jesus expulsou do templo os vendilhões que profanavam a casa do Senhor, usando até de violência, nós também devemos ter a dignidade e coragem de expulsar do corpo, que é o Templo de Deus, tudo aquilo que o macula, o deturpa, o diminui, o degrada.
Assim como Jesus Cristo, ao expulsar os que desrespeitavam a casa de Deus, derrubou mesas, bancas e animais que estavam à venda, deve-se também derrubar preconceitos, violências, discriminações e expulsar do corpo pecados, ações pouco dignas e atitudes que contradizem os ensinamentos do Senhor. Jesus fez uma operação limpeza no Templo de Jerusalém e nos chama a atenção para também fazermos uma operação limpeza no nosso corpo, que é a primeira morada de Deus no nosso meio. Jesus Cristo apanhou um chicote para expulsar do Templo de pedra de Jerusalém todos aqueles que o profanavam. A exemplo de Jesus veríamos, nem que seja a poder de violência, expulsar do nosso corpo tudo aquilo que profana a morada de Deus, o Templo do Espírito Santo. E muitos pecados só conseguimos expulsar do nosso corpo praticando violência contra nós mesmos... O nosso corpo é a morada de Deus, o Templo do Espírito Santo. Não podemos profaná-lo e nem permitir que seja profanado.
O cuidado que Jesus teve com o Templo de pedra de Jerusalém é o mesmo e muito mais que precisamos ter com o nosso corpo. Nós somos o Templo de Deus e a morada do Espírito Santo.
Não vamos provocar a ira de Jesus para que não haja necessidade de ele empunhar o chicote e nos ferir a fim de nos chamar a atenção de que algo em nossa vida ou em nossas atitudes não esteja de conformidade com os seus ensinamentos e, para que isso aconteça, estejamos sempre alertas para recepcioná-lo, cuidando para que o nosso corpo, que é a casa de Deus e o Templo do Espírito Santo, esteja sempre limpo e bem arrumado.
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