V DOMINGO DO TEMPO COMUM
Ano – A; Cor – verde; Leituras: Is 58,7-10; Sl 111 (112); 1Cor 2,1-5;
Mt 5,13-16.
“VOCÊS SÃO O SAL DA TERRA... VOCÊS SÃO A LUZ DO MUNDO”. (Mt
5,13.14).
Diácono
Milton Restivo
A liturgia de
hoje versa sobre dois elementos básicos que, sem eles, o homem não teria
condições de uma vida confiável, confortável e saudável: o sal e a luz.
O profeta Isaías,
na primeira leitura, apela para a misericórdia, à sensibilidade e à generosidade
de coração: “repartir a comida com quem
passa fome, hospedar em sua casa os pobres sem abrigo vestir aquele que se
encontra nu, e não se fechar à sua própria gente” (Is 58,7), o que nos
recorda aquilo Jesus diria mais tarde quando se referia ao fim dos tempos: “eu estava com fome e vocês me deram de comer;
eu estava com sede e me deram de beber; eu era estrangeiro e me receberam em
sua casa; eu estava sem roupa e me vestiram; eu estava doente e cuidaram de
mim; eu estava na prisão e vocês foram me visitar”. (Mt 25,35-36).
Como é
interessante a semelhança entre essas duas passagens. Isaías diz que, “se você fizer isso, a sua luz brilhará como
aurora, suas feridas vão sarar rapidamente, a justiça que você pratica irá à
sua frente e a glória de Yahweh virá acompanhando você. Então você clamará, e
Yahweh responderá; você chamará por socorro, e Yahweh responderá: ‘Eis-me
aqui’”. (Is 58,8-9a). E Isaías já dissera: “... se você der o seu pão ao faminto e matar a fome do oprimido. Então
a sua luz brilhará nas trevas e a escuridão será para você como a claridade do
meio dia.” (Is 58,1).
O profeta Isaías
relaciona a vinda do Messias com a luz que iluminará o mundo: “O povo que andava nas trevas viu uma grande
luz, e uma luz brilhou para os que habitavam um país tenebroso” (Is 9,1).
Na primeira
leitura Isaías diz que quem usar da caridade para com o próximo necessitado e
oprimido, “a sua luz brilhará como aurora...
a sua luz brilhará nas trevas”, e Jesus diz que, quem fizer isso, irá de
encontro dele próprio, Jesus, que á a luz por excelência: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue não andará nas trevas, mas
possuirá a luz da vida” (Jo 8,12).
Um dia Jesus
dirá aos misericordiosos: “Venham vocês,
que são abençoados por meu Pai. Recebam como herança o reino que meu Pai lhes
preparou desde a criação do mundo” (Mt 25,34).
Isaías é explícito
quando afirma que a verdadeira luz que deve iluminar o mundo é Yahweh, cuja luz
se manifestou esplendorosamente no Messias, no Filho de Deus: “O sol não será mais a luz do seu dia, e de
noite não será a lua a iluminá-la; o próprio Yahweh será para você uma luz
permanente, e o seu Deus será o seu esplendor. O sol dela jamais vai se por, e
a sua lua não terá mais minguante, pois o próprio Yahweh será para você uma luz
permanente”. (Is 60,19-20).
Os israelitas
que caminhavam no deserto à busca da liberdade desfrutaram dessa luz para protegê-los,
iluminá-los e direcioná-los à Terra Prometida: “Yahweh ia na frente deles: de dia, numa coluna de nuvens, para
guiá-los; de noite, numa coluna de fogo para iluminá-los”.(Ex 13,21).
O salmista encontra
repouso em Yahweh, que é a luz: “Pois em
ti se encontra a fonte da vida e com a tua luz nós vemos a luz”. (Sm
36,10).
O Apóstolo João,
na sua primeira carta, afirma que Deus é luz, quando relata uma mensagem ouvida
por ele do próprio Jesus: “Esta é a que
agora lhes anunciamos: Deus é luz e nele não há trevas. Se dizemos que estamos
em comunhão com Deus e, no entanto, andamos em trevas, somos mentirosos e não
pomos em prática a Verdade. Mas, se caminhamos na luz, como Deus está na luz,
estamos em comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, o Filho de Deus,
nos purifica de todo pecado” (1Jo 1,5-7).
O Evangelho
desta liturgia leva-nos de volta ao Sermão da Montanha, que é um código de
conduta que continua a ser a base da moralidade cristã. O Sermão da Montanha é extraordinário pelo fato de que engloba
todo o Evangelho e resume tudo o que é de mais importante para o cristão, o que
ele deve saber e fazer.
A leitura desta
liturgia é a sequência imediata do que deveria ter sido lido no domingo passado
quando deveriam ter lidas e meditadas as bem-aventuranças.
Depois de dizer
quem são bem-aventurados, Jesus diz o que são os bem-aventurados, usando de
metáforas: “Vocês são o sal da terra. [...]
Vocês são a luz do mundo”. (Mt
5,13.14).
Jesus, através
das metáforas de sal e de luz, deixa claro a enorme força do testemunho e a
importante função dos discípulos, especialmente dos pregadores que é, sobretudo,
preservar e proteger a humanidade contra as influências malignas da corrupção e
da maldade - a função do sal - e ajudar a humanidade a conhecer, através da sua
fé e seu bom exemplo iluminadores, o caminho da salvação - a função da luz -.
O sal em si não
tem qualquer valor. Sozinho não é alimento, não tem outra serventia que não seja
a de ressaltar o sabor dos alimentos. O sal é indispensável à vida e, no
entanto, em excesso é danoso. Sem o sal, não seria possível estocar uma série
de alimentos em um mundo sem geladeiras.
A palavra
salário, aliás, surgiu a partir da porção de sal que era dada como pagamento aos
soldados na Roma antiga. Daí vem a palavra “salário”: porção de sal paga por
trabalho prestado.
Ao descobrir
que o sal, além de ajudar na cicatrização das feridas ocasionadas no combate,
servia para conservar e dar sabor à comida, os romanos passaram a considerá-lo
um alimento divino, uma dádiva de Salus, a deusa da saúde.
O sal é para
temperar e conservar alimentos. O sal é para dar sabor aos alimentos.
Um alimento sem
sal é um alimento insosso, sem sabor e desagradável ao paladar e péssimo para
degustar. O sal é usado para que os alimentos tenham mais durabilidade e para
evitar que os alimentos entrem rapidamente em processo de decomposição. Por
conservar os alimentos e lhes dar sabor, cor e valor, o sal tornou-se um
símbolo de preciosidade e perpetuidade, desempenhando um papel importante nos
ensinamentos de Jesus. Por isso Jesus diz que seus discípulos são o sal da
terra, isto é, dar valor e sabor à vida, à existência, ao mundo.
Se o mundo anda
tão insosso, tão sem sabor e tão desagradável é porque o cristão deixou de ser
sal, deixou de ter sabor e de dar sabor à vida e ao mundo, e o sal com essa
qualidade “não serve para mais nada;
serve só para ser jogado fora e pisado pelos homens” (Mt 5,13b); “O sal é bom. Mas se até o sal perde o
sabor, com que salgaremos? Não serve mais para nada: nem para a terra, nem para
o esterco. Por isso é jogado fora” (Lc 14,34-35).
Se o sal perde
o sabor, perde também a função. Por isto Mahatma Ghandi afirmou que “acredita no Cristo, mas não no cristianismo”
porque ele, mais do que ninguém, sentiu na pele e na vida a falta de sal do
cristianismo do seu tempo. Mudou alguma coisa hoje?
Dizendo aos
seus discípulos que eles são “o sal da
terra”, Jesus atribui a eles o símbolo da sabedoria e da pureza moral: “Tenham o sal em vocês, e estejam em paz uns
com os outros” (Mc 9,50b).
Paulo assimilou
tão bem o ensinamento de Jesus de ser sal da terra que o transformou em
obrigação de viver e transmitir o Evangelho, dedicando-se inteiramente à
evangelização, temperando o mundo com o Evangelho de Jesus: “Anunciar o Evangelho não é título de glória
para mim; pelo contrário, é uma necessidade que me foi imposta. Ai de mim se eu
não anunciar o Evangelho. [...] Qual
é então o meu salário? É que, pregando o Evangelho, eu o prego gratuitamente,
sem usar dos direitos que a pregação do Evangelho me confere” (1Cor 9,16.18);
“Mas de modo algum considero a minha vida
preciosa para mim mesmo, contanto que eu leve a bom termo a minha carreira e o
serviço que recebi do Senhor Jesus, ou seja, testemunhar o Evangelho da graça
de Deus” (At 20,24).
Jesus disse
também: “Vocês são a luz do mundo” (Mt
5,14).
Quem poderia
definir o que seja “luz”? Se buscarmos nos dicionários encontraremos as mais
diversas definições e sentidos e, com certeza, todas estariam certas. Em
primeira instância, luz é a claridade que o sol espalha sobre a terra.
A primeira
atitude do Criador na criação do mundo foi que existisse luz: “No princípio Deus criou o céu e a terra. A
terra estava sem forma e vazia; as trevas cobriam o abismo e um vento impetuoso
soprava sobre as águas. Deus disse: ‘Que exista a luz’” (Gn 1,1-2).
Só existiam
trevas, e Deus fez a luz. Sem esse elemento o homem viveria em perpétua
escuridão. A falta de luz causa dificuldades e desastres; por isso escuridão é
sinônimo de calamidade: “Eu esperava a
felicidade, mas veio a desgraça; eu esperava a luz, mas veio a escuridão” (Jó
30,26).
No Antigo
Testamento a luz tornou-se um elemento de salvação messiânica: “O povo que andava nas trevas viu uma grande
luz, e uma luz brilhou para os que habitavam um país tenebroso” (Is 9,1); “Se você fizer isso, a sua luz brilhará como
a aurora, suas feridas vão sarar rapidamente, a justiça que você pratica irá à
sua frente e a glória de Yahweh virá acompanhando você” (Is 58,8). As
coisas ruins, a violência e a maioria dos pecados ocorrem na escuridão. É na
escuridão que agem os ladrões, é na escuridão que se cometem os maiores
pecados!
A escuridão
esconde o crime para os olhos dos homens: “Outros
são rebeldes à luz, não conhecem os caminhos de Deus nem frequentam suas
estradas. De madrugada, o assassino se levanta para matar o pobre e o
indigente. Durante a noite, o ladrão ronda, cobrindo o rosto com uma máscara. O
olho do adúltero aguarda o anoitecer, pensando: ‘Ninguém me verá’. Na escuridão
eles arrombam as casas, enquanto de dia se escondem aqueles que não querem nada
com a luz” (Jó 24,13-16).
A oposição
entre luz e trevas tem, no Novo como no Antigo Testamento, um fundamento moral,
e a luz põe fim ao reino das trevas: “Eu
vim ao mundo como luz, para que todo aquele que acredita em mim não fique nas
trevas” (Jo 12,46); “Vocês, porém,
são raça eleita, sacerdócio régio, nação santa, povo adquirido por Deus, para
proclamar as obras maravilhosas daquele que chamou vocês das trevas para a luz
maravilhosa” (1Pd 2,9).
É na luz que
desponta a sabedoria e o conhecimento: “Amei
a sabedoria mais do que a saúde e a beleza, e resolvi tê-la como luz, porque o
brilho dela nunca se apaga” (Sb 7,10).
Aquele que, por
palavras ou obras, cooperar para difundir essa luz, como por exemplo, o Servo
de Yahweh, é chamado também uma luz: “Eu,
Yahweh, chamei você para a justiça, tomei-o pela mão, e lhe dei forma, e o
coloquei como aliança de um povo e luz para as nações. Para você abrir os olhos
aos cegos, para tirar os presos da cadeia, e do cárcere os que vivem no escuro.
Eu sou Yahweh: esse é o meu nome” (Is 42,6-8a).
No Novo
Testamento Mateus repete a profecia de Isaias quando, metaforicamente, anuncia
a presença do Messias no meio do povo: “O
povo que vivia nas trevas viu uma grande luz: e uma luz brilhou para os que
viviam na região escura da morte” (Mt 4,16; Is 8,12).
Na sua carta,
João diz qual é o caminho do cristão: “Esta
é a que agora lhes anunciamos: Deus é luz e nele não há trevas. Se dizemos que
estamos em comunhão com Deus e, no entanto, andamos em trevas, somos mentirosos
e não pomos em prática a Verdade. Mas, se caminhamos na luz, como Deus está na
luz, estamos em comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, o Filho de
Deus, nos purifica de todo pecado” (1Jo 1,5-7).
A existência da
luz no mundo tem a força de um julgamento: “O
julgamento é este: a luz veio ao mundo, mas os homens preferiram as trevas à
luz, porque suas ações eram más. Quem pratica o mal tem ódio da luz, e não se
aproxima da luz, para que suas ações não sejam desmascaradas. Mas, quem age
conforme a verdade se aproxima da luz, para que suas ações sejam vistas, porque
são feitas como Deus quer” (Jo 3,19-21); “Porém, tudo o que é denunciado, torna-se manifesto pela luz, pois tudo
o que se torna manifesto é luz. É por isso que se diz: ‘Desperte você que está
dormindo. Levante-se dentre os mortos, e Cristo o iluminará” (Ef 5,13-14).
O Apóstolo João
vai ao extremo, como todo e qualquer cristão deveria ir, ao afirmar: “Caríssimos, não lhes comunico um mandamento
novo, mas o mandamento antigo, esse mesmo que vocês receberam desde o
princípio. O mandamento antigo é a palavra que vocês ouviram. E, no entanto, o
mandamento que lhes comunico é novo – pois ele é verdadeiro em Jesus e em vocês
– porque as trevas já estão se afastando, e a verdadeira luz já está brilhando.
Quem afirma que está na luz, mas odeia o seu irmão, ainda está nas trevas. Quem
ama o seu irmão permanece na luz, e nele não há ocasião de tropeço” (1Jo
2,7-10).
No seu discurso
Jesus afirma que o sal que perde o sabor torna-se imprestável e é jogado no
lixo e que a luz escondida é inútil: “Se
o sal perde o gosto, com que poderemos salgá-lo? Não serve para mais nada;
serve só para ser jogado fora e ser pisado pelos homens. [...] Ninguém acende uma lâmpada para colocá-la
debaixo de uma vasilha, e sim para colocá-la no candeeiro, onde ela brilha para
todos os que estão em casa” (Jo 5,13b.15).
No batismo o
batizando degusta o sal e é colocada em sua mão uma vela acesa e isso para
lembrá-lo, para o resto da vida que, pelo batismo, ele se tornou sal e luz do
mundo.
O cristão deve
dar sabor aos relacionamentos, à sua vida e de todos os que o rodeiam e
principalmente deve ser o elemento que protege a família, os amigos e a
sociedade da corrupção e do pecado. Através do seu exemplo e de sua vivência
cristã, o cristão deve ser o elemento que transforma e destaca o sabor da vida
e que conserva em perfeito estado, sem pecado e sem corrupção as vidas de quem
o rodeia, daqueles com quem convive em casa, no trabalho, no clube, na igreja e
em todos os ambientes da sociedade.
O cristão deve
ser fiel à sua missão e não pode perder jamais sua função de sal da terra, pois
assim como Jesus disse no evangelho: se o sal perder seu sabor, se ficar
insosso não servirá para mais nada além de ser jogado à terra e ser pisado
pelos homens.
A força do cristão
vem dos ensinamentos de Jesus: quando não se segue a palavra perde-se o sabor e
a finalidade da vida, tornando-se inútil para a missão para a qual foi
destinado e acabará sendo jogado ao chão do mundo e pisado pelos inimigos da
fé!
Por que o mundo
está tão insosso, tão sem sabor, tão desmotivado para as coisas do céu? É
porque os cristãos deixaram de ser sal.
Por que o mundo
anda tão violento, a discriminação impera, a justiça passa ao longe, a moral e
a ética perderam o sentido, o respeito mútuo deixou de existir? Por que o mundo
anda nas trevas? É porque os cristãos deixaram de ser luz.
Seria oportuno
transcrever aqui parte da homilia de João Paulo II por ocasião de sua visita
apostólica ao México e aos Estados Unidos: “Infelizmente, hoje demasiadas
pessoas vivem distante da luz - num mundo de ilusões, de sombras fugazes e de
promessas não mantidas. Se olhardes para Jesus, se viverdes a Verdade que é
Jesus, tereis em vós a luz que revela as verdades e os valores sobre os quais
podeis construir a vossa própria felicidade, enquanto edificareis um mundo de
justiça, de paz e de solidariedade. Recordai o que Jesus disse: “Eu sou a luz
do mundo; quem me seguir não caminhará nas trevas, mas terá a luz da vida” (cf.
Jo 8, 12). Uma vez que Jesus é a Luz, também nós nos tornamos luz quando O
proclamamos. Este é o cerne da missão cristã à qual cada um de vós foi chamado
através do Batismo e da Confirmação. Sois chamados a fazer com que a luz de
Cristo brilhe esplendidamente no mundo”.
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