XXII DOMINGO DE TEMPO COMUM
Ano C; Cor verde; Leituras: Eclo 3,17-21.30-31; Sl 67 (68); Hb
12,18-19.22-24; Lc 14,1.7-14.
“QUEM SE ELEVA SERÁ HUMILHADO E QUEM SE HUMILHA SERÁ EXALTADO”. (Lc
14,11).
Diácono
Milton Restivo
A primeira
leitura da liturgia de hoje é tirada do livro do Eclesiástico, também chamado
“Sirácida”, “Sirácide” ou ainda, “Sabedoria de Jesus, filho de Sirac” em
algumas tradições da Bíblia. Na Igreja primitiva Latina o Eclesiástico era
chamado “Livro da Igreja” porque era utilizado com frequência para a instrução,
a catequese dos fiéis. Está relacionado entre os “livros sapicienciais” da
Bíblia como o Eclesiastes, com o qual não se confunde, além de Salmos,
Provérbios, Cântico dos Cânticos, Jó e Sabedoria.
Desde os
primeiros séculos do Cristianismo o nome mais comum para designar este livro foi
“Eclesiástico” (do latim “Ecclesiasticus liber”), o que significa o livro da
igreja ou da assembléia. São Cipriano (200-258), bispo da cidade de
Cartago e mártir, parece ter sido o primeiro a usar esse nome, devido ao
uso que dele se fazia na Igreja primitiva para a catequese dos catecúmenos, ou
seja, dos que estavam sendo preparados para o batismo.
Com efeito, de
entre os Livros Sapienciais, é o Eclesiástico o mais rico de ensinamentos
práticos, apresentados de um modo paternal e persuasivo. Apesar de se lhe
chamar também, como vimos acima, de “Sirácide” ou “Sirácida”, derivado de uma
forma alternativa de “Sirac”, os principais manuscritos gregos usam o título de
“Sabedoria de Jesus, filho de Sirac” (Eclo 50,27) ou então, simplesmente, “Sabedoria
de Sirac”: “Jesus, filho de Sirac de
Jerusalém, escreveu neste livro uma doutrina de sabedoria e ciência, e derramou
nele a sabedoria de seu coração. Feliz aquele que se entregar a essas boas
palavras; aquele que as guardar no coração será sempre sábio; pois, se ele as
cumprir, será capaz de todas as coisas, porque a luz de Deus guiará os seus
passos”. (Eclo 50,29-31).
Este livro não
consta da Bíblia protestante, considerado por esses nossos irmãos queridos como
livro apócrifo, isto é, não revelado, mas, contrariando essa postura, o Livro
do Eclesiástico é citado centenas de vezes nos livros do Novo Testamento.
Podemos citar alguns exemplos das centenas que ali existem: Tg 1,19; “Vocês já sabem, meus queridos irmãos: cada
um seja pronto para ouvir, mas lento para falar...”; = Eclo 5,11: “Esteja pronto para ouvir e lento para dar
a resposta”; Mt 11,29: “Aprendam de
mim, porque sou manso e humilde de coração” = Eclo 51,23ss: “Aproximem-se de mim, vocês que não tem
instrução”; Lc 1,52: “Derruba do
trono os poderosos e eleva os humildes” = Eclo 10,14: “O Senhor derruba o trono dos poderosos e faz os humilhados
assentarem-se no lugar deles”; Ef 6,1: "Filhos,
obedecei a vossos pais segundo o Senhor: porque isto é justo”. = Eclo 3,2: “Ouvi, meus filhos, os conselhos de vosso
pai, segui-os de tal modo que sejais salvos”.
Os Evangelhos
segundo Mateus, Marcos, Lucas e João, os Atos dos Apóstolos, as cartas paulinas
e as cartas dos outros apóstolos estão repletos de citações do livro do
Eclesiástico, o que coloca por terra a alegação dos nossos queridos irmãos que
negam o livro do Eclesiástico como sendo revelado. Nos Evangelhos muitas
passagens do livro do Eclesiástico são usadas por Jesus nos seus ensinamentos.
Mas, que benefício nos traz em querer discutir quantos livros tem uma e outra
Bíblia se não lemos nem uma e nem outra e ignoramos e não seguimos os seus
ensinamentos? Seria pelo prazer de discutir e de dizer que se sabe mais do que
os outros? O egocentrismo, o culto ao “eu” se infiltra onde a Palavra de Deus é
deixada de lado e, com isso, é deixado de lado o amor para com o irmão e o
relacionamento íntimo com Jesus Cristo. Não se convive mais com a Sagrada
Escritura. E a caridade, onde ficou?
A passagem do
Livro do Eclesiástico lida nesta liturgia vai de encontro com os ensinamentos
de Jesus nos Evangelhos. Fala da mansidão, da generosidade, da humildade e do
poder do Senhor que é glorificado pelos humildes. Combate o mal do orgulhoso e
orienta que “quanto mais importante você
for, tanto mais seja humilde, e encontrará favor diante do Senhor. Pois o poder
do Senhor é grande, mas ele é glorificado pelos humildes. [...] Um coração orgulhoso acabará mal, e quem ama
o perigo nele cairá.” (Eclo 3,18-20.25). Não foi isso que Jesus falou
quando orava em voz alta, no meio do povo, para agradecer ao Pai por ter
revelado as suas maravilhas aos pequeninos e humildes e as ocultado aos que se
consideravam e consideram sábios e entendidos? “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultastes estas
coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai,
porque assim foi do teu agrado”. (Lc 10,21; Mt 11,25).
O Salmo
responsorial demonstra o grande amor que Deus tem pelos humildes,
discriminados, desamparados: “Pai dos
órfãos, protetor das viúvas, assim é Deus em sua morada santa. Deus dá aos
marginalizados uma casa, liberta os cativos e os enriquece. [...] Derramaste sobre tua herança, ó Deus, uma
chuva copiosa, aliviando a terra esgotada, e o teu rebanho habitou na terra que
tua bondade, ó Deus, preparou para o pobre. [...] Bendito seja o Senhor a cada dia! Deus leva nossas cargas. Ele é o
nosso salvador.” (Sl 68 (67),6-7.10-11.20).
Toda a Liturgia
da Palavra se encaminha na direção da frase dita por Jesus no Evangelho: “Quem se eleva será humilhado e quem se
humilha será exaltado”. (Lc 14,11). Nos nossos dias esse ensinamento soa
como ridículo. Todos querem aparecer, se destacar entre os demais, ser melhores
que os outros. O mundo à nossa volta enaltece quem se destaca numa telenovela,
no futebol, na loteria, na sociedade, nos clubes, nos negócios e até nos
grandes escândalos que a mídia notifica a cada dia que passa, uns maiores que o
outro. As colunas sociais das revistas e jornais estão cheias de senhores e
madames que possuem conta bancária abarrotada de dinheiro, mas de coração e
espírito vazios da presença de Deus e
da solidariedade para com o próximo. Todos querem abrir um grande sorriso para
as luzes estonteantes das máquinas fotográficas e televivas para exibirem os
seus momentos de vanglória ou glória vã, usando perfumes, roupas, sapatos e
jóias que compraram à custa do suor e do sangue dos seus empregados a quem
pagam um mísero salário, o salário da fome. Ninguém quer olhar para o
pequenino, para aquele que sofre, nem mesmo para aquele que se apaga para que
outros brilhem.
E assim vai o
mundo... “Vaidade das vaidades, tudo é
vaidade. Que proveito tira o homem de todo trabalho com que se afadiga debaixo
do sol?” (Ecl 1,2-3). Cheio de
orgulho, cheio de vaidade, e tudo isso sugere hipocrisia. A hipocrisia entre
aqueles que se dizem cristãos e que professam a Jesus Cristo como Senhor e
Salvador continua a ser um obstáculo para aqueles que gostariam de crer. O
problema, provavelmente, nunca foi dito de maneira tão clara e objetiva do que
quando disse Mahatma Ghandi, de religião hindu, a respeito da cristandade: “Gosto do Cristo deles, mas não gosto dos
cristãos. Eles são tão pouco parecidos com seu Cristo”.
Desde o início
da realização de seu plano de salvação para todos os homens, o Senhor nosso
Deus buscou os simples e humildes, os rejeitados, os discriminados, aqueles que
se humilhavam diante de Deus e eram por Deus exaltados. Quer pessoa mais
humilde para ser a mãe de seu Filho Unigênito, senão uma virgem? “E o nome da virgem era Maria”. (Lc
1,26c). E essa virgem revela toda a sua confiança e se entrega nas mãos de Deus
e declara toda sua humildade e nada ser se não for por vontade de Deus, e Deus
a enaltece sobre todas as gerações: “Minha
alma glorifica o Senhor, e exulta meu espírito em Deus, meu salvador, porque
ele olhou para a humildade de sua serva. De hoje em diante todas as gerações me
chamarão bem-aventurada, porque o Senhor realizou em mim grandes coisas.” (Lc
1,46-49).
Por que será
que todas as gerações que se identificam como cristãs ainda não a tem como
bem-aventurada? E através da humildade dessa virgem “Deus fez-se homem para que o homem pudesse se tornar Deus”. Isso
não é para nos deixar exuberantes de alegria? Quando do nascimento do seu
Filho, a quem Deus Pai se propôs anunciar a magnitude desse evento? Aos homens
e mulheres da alta sociedade, aos intocáveis de Belém ou de Judá? Aos
sacerdotes elitisados que cumpriam, como que por obrigação, como profissionais
do altar como tantos ainda hoje, o seu turno no Templo de Jerusalém? Ao sumo
sacerdote que vivia no seu palácio rodeado de servidores e mordomias? Às
pessoas que se julgavam santas e devotas, como os fariseus, e que tinham o povo
e os pastores dos rebanhos como ignorantes por não conhecerem e nem poderem
conhecer, como eles, a Lei de Moisés, e bem por isso estavam destinados à
condenação eterna? Não! O Pai não escolhe nenhum desses para anunciar o maior
acontecimento da história da humanidade: a encarnação de um Deus no seio de uma
virgem e o seu nascimento num curral de animais como um excluído, um rejeitado,
um pária da sociedade. O povo simples e humilde, os pobres, os pastores eram
tidos pelos “sábios” fariseus como “malditos
por não conhecerem a Lei”: “Esse povo que não conhece a Lei, são uns malditos”.
(Jo 7,49). E o Pai anuncia o nascimento de seu Filho Unigênito precisamente
para esse povo, considerado pelos “santos
e sábios” como malditos: os pastores, os ignorantes, os pobres, os
excluídos da sociedade da época e de hoje também...
Que coisa
desconcertante. E o Pai, exatamente com os pastores, os rejeitados e
discriminados, dá início a série das desconcertantes surpresas e novidades
evangélicas. Os últimos tornam-se os primeiros, e a sociedade hipócrita e podre,
que se julgava e se julga a primeira, torna-se a última.
E quanto ao rei
Herodes, como será que ele deveria saber do nascimento daquele que,
ironicamente, teria sobre sua cabeça na cruz o título de “rei dos judeus”? Afinal das contas, Herodes havia reconstruído o
Templo de Jerusalém onde os sacerdotes ofereciam sacrifícios e o povo adorava a
Yahweh, mas, por que? Por motivos políticos. Herodes só queria ser o primeiro. Herodes
queria destacar-se no meio do povo e na história. Ah! Esses políticos atuais...
Aprenderam tanto com Herodes... Para que Herodes tomasse conhecimento do
nascimento do Filho Unigênito do Pai outros marginalizados lhe trouxeram a
notícia; gente de povos estrangeiros e desprezados pelos judeus porque não
comungavam a mesma crença, a mesma fé; eram pagãos, eram gentios... Os magos...
Vieram de fora, vieram de longe, e Herodes só teve conhecimento do nascimento
do Salvador através da boca desses estrangeiros considerados pagãos pelos
judeus.
Os humildes
continuam sendo exaltados e o Pai coloca na boca dos rejeitados, dos humildes e
desprezados a notícia da redenção do gênero humano. E qual foi a atitude de
Herodes? E quais são as atitudes dos Herodes dos nossos dias? Dinheiro na meia,
dinheiro na cueca, dinheiro na bolsa, dinheiro nos paraísos fiscais, e os
pobres que se danem... Assim como Herodes mandou matar as crianças de Belém (cf
Mt 2,13-18), os que assim ainda agem hoje matam a expectativa de um povo que
ainda busca na fé a realização de suas esperanças...
Mas Jesus não
desistiu dessas investidas do Pai. Ao iniciar a sua missão, Jesus escolhe doze.
Doze discípulos, doze amigos que depois vieram a ser chamados de apóstolos, que
foram os primeiros a receber a mensagem de salvação, mas se tornaram os últimos
a entender o sacrifício do Cristo porque não participaram com ele da sua paixão
e morte: covardemente fugiram, debandaram, se esconderam “estando fechadas as portas do lugar onde se achavam os discípulos por
medo das autoridades dos judeus.” (Jo 20,19). E a seguir seriam esses os
primeiros chefes da Igreja de Jesus Cristo. Mas, qual deles ajudou Jesus a
carregar a sua cruz? Nenhum! Nem Pedro, nem João, nem Tiago... Muito pelo
contrário; se acovardaram e fugiram na hora em que Jesus mais precisava
deles.
Esses foram os
primeiros dirigentes da nossa Igreja, e assim começou a nossa Igreja... Para
complicar ainda mais, foi um desses doze que traiu Jesus, entregando-o aos
inimigos, à morte...
Quem ajudou
Jesus a carregar a sua cruz? Um marginalizado, um estrangeiro, um homem que
veio de fora... Um cirineu... O último, que não fora chamado para ser seu
discípulo, passa a ser o primeiro a ajudar a Jesus a carregar o seu pesado
madeiro... O último, novamente, foi o primeiro.
E depois, para
levar a sua mensagem além das fronteiras da Judéia, de quem Jesus lançou mão?
De uma mulher que não pertencia à raça israelita, uma mulher cuja conduta não
era das mais recomendáveis e nem muito exemplar... A samaritana... A última, a
desprezada, a marginalizada, a olhada com desprezo, passa a ser a primeira a
levar a mensagem de Jesus ao seu povo.
Depois Jesus
teve necessidade de transmitir por parábola um “novo mandamento”, de quem ele
lançou mão para ser seu personagem? Não foi de um sacerdote, nem de um levita, nem
de um fariseu que se julgava santo e devoto, mas de um excomungado pelo povo
judeu: um samaritano, a quem a tradição costumou chamar de “o bom samaritano”. O
último passa a ser o primeiro a transmitir e a vivenciar o novo mandamento do
amor. Não termina ai a escolha do Pai pelos rejeitados e que Jesus os escolhe
para pertencer ao Reino que ele veio trazer. Quem foi o primeiro que Jesus
recebeu no seu reino? Não foi um ladrão? Não foi aquele que burlava a Lei? E a ele
Jesus agonizante na cruz, disse: “Eu lhe
garanto: hoje mesmo você estará comigo no Paraíso”. (Lc 23,43). O último de
todos passa a ser o primeiro a entrar no Reino dos Céus.
Toda a mensagem
de Jesus foi no sentido de que os seus discípulos não se encharcassem de
vanglória, de honrarias, de riquezas que os ladrões roubam e a traça come e a
ferrugem corroi (cf Mt 6,20; Mt 19,21; Lc 12,33) porque “onde está o seu tesouro , ai estará também o seu coração” (Lc
12,34). Entre os próprios apóstolos de Jesus surgiu a ganância e a vaidade de
quem seria o primeiro, o manda-chuva, quem mandaria nos demais, e isso gerou
uma discussão entre eles. E para dirimir qualquer dúvida, Jesus chama uma
criança e ensina algo fundamental, não somente para os seus discípulos e
apóstolos, mas para toda a sua Igreja. Este ensino, contudo, se revela por meio
de três momentos de suma importância. Em primeiro lugar, por meio de uma
pergunta desconcertante. A pergunta de Jesus é simples: “sobre o que vocês discutiam no caminho?” (Mc 9,33b). Depois de Jesus
haver dito que o Filho do Homem deveria padecer nas mãos dos homens, os discípulos
ficaram intrigados. Eles não entendiam muito bem sobre o que Jesus estava
falando: “O Filho do Homem vai ser
entregue nas mãos dos homens, e eles o matarão”. (Mc 9,32). E era
exatamente sobre isso que os apóstolos estavam discutindo. E se Jesus morresse
como estava dizendo, quem deles seria o substituto? Quem, dentre eles, seria o
maior? Esta era a discussão.
Jesus tem um
ensinamento a dar e o faz, em segundo lugar, por meio de uma afirmação
conclusiva: “Se alguém quer ser o
primeiro, deve ser o último, e aquele que serve a todos”. (Mc 9,35b). Jesus
inverte totalmente os valores do mundo. Em um lugar onde o primeiro é servido,
ele exige que o primeiro sirva. Em uma sociedade em que a honra, a hierarquia,
a mordomia é algo de suma importância, Jesus estabelece outro critério para
mostrar superioridade: o serviço, a diaconia.
A Igreja parece
que ainda não compreendeu isso. É por isso que sempre buscamos as honras, os
melhores lugares, a companhia dos poderosos, a complacência dos tiranos, a
aprovação dos governantes deste mundo. Mas a palavra de Jesus continua atual: “Mas entre vocês não deverá ser assim: quem
de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês, e quem de vocês
quiser ser o primeiro, deverá tornar-se o servo de todos. Porque o Filho do
Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e para dar a sua vida
como resgate em favor de muitos.” (Mc 10,42-45). O sinal de superioridade
nos seguidores de Jesus Cristo será, a partir de agora, o serviço.
O maior será o
que serve e não o que é servido. Finalmente, e terceiro, a lição que Jesus quer
ensinar é dada por meio de uma atitude reveladora: “Quem recebe uma criança, tal como esta... a mim me recebe” (Mc
9,37). Em uma sociedade como a nossa, em que as crianças e os velhos são desprezados
porque não são seres produtivos e porque só dão despesas, as palavras de Jesus
são importantíssimas. Acolher as crianças se torna um sinal de acolhimento do
Cristo e do Reino.
Nossa atenção
não deve estar voltada para os poderosos, mas para os fracos. Não para os reis
e governantes, mas para os fracos e indefesos. Nestes, Jesus se revela com
muito mais propriedade e força e se identifica nos fracos, pobres e oprimidos: “Todas as vezes que vocês fizeram isso a um
dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizeram.” (Mt 25,40).
O que aconteceu
na última ceia, quando Jesus reuniu os seus discípulos e apóstolos para
despedir-se deles? O espanto foi geral: “Jesus
se levantou da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura.
Colocou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando com a
toalha que tinha na cintura.” (Jo 13,4-5). Ao pegar a bacia e toalha, Jesus
agia como um escravo. Pior: exercia uma atividade que um judeu, mesmo na
condição de servo, não aceitava fazer porque, afinal de contas, aquela era a
obrigação de um escravo. Pedro reagiu a seu modo: “O senhor não vai lavar os meus pés nunca”. (Jo 13,8). Pedro só
aceitou a contra gosto, quando viu que não ia convencer Jesus do contrário. Depois
Jesus afirmou: “Vocês me chamam de Mestre
e Senhor; e dizem bem, pois eu o sou…” (Jo 13,13). E ai vem o ensinamento
básico: “Pois bem, eu que sou o Mestre e
o Senhor lavei seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu
lhes dei o exemplo, vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. [...] Se vocês
compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”. (Jo
13,14-15.17).
É essa
preocupação que os discípulos do Divino Mestre devem ter sempre em mente: “Quem se eleva será humilhado e quem se
humilha será exaltado”. (Lc 14,11). Quantos cristãos não vivem exercendo
formas de poder baseadas na força e na arrogância? Quantos, com um “cargozinho”
ou missão dentro da comunidade, não se comportam como se tivessem “um rei na
barriga”? Quantos porque assumiram funções de ministérios extraordinários
leigos, ou de coordenação de grupos ou pastorais, acham que são os donos da
igreja e olham a todos os irmãos por cima? Menosprezam, querem honras e
reconhecimento. E o mundo perde a oportunidade de reconhecer, nestes cristãos,
o Jesus extraordinário, revolucionário, libertador do Evangelho. Porque
enfraquecemos as palavras de Jesus, os gestos de Jesus com nosso contra-testemunho.
E aqui volta o
que disse Mahatma Ghandi a respeito da cristandade: “Gosto do Cristo deles, mas não gosto dos cristãos. Eles são tão pouco
parecidos com seu Cristo”. Que pena...
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