II DOMINGO DO ADVENTO
Ano – B; Cor –
Roxo; Leituras: Is 40,1-5.9-11; Sl 84 (85); 2Pd 3,8-14; Mc 1,1-8.
“DEPOIS DE MIM
VIRÁ ALGUÉM MAIS FORTE QUE EU”. (Mc 1,7).
Diácono
Milton Restivo
Estamos
vivendo o Tempo do Advento, na expectativa da vinda da Luz do mundo:
ü “O
povo que andava em trevas viu uma grande luz, e aos que habitavam na região da
sombra da morte, resplandeceu-lhes a luz.” (Is 9,2).
O profeta Isaias é uma constante no Tempo do Advento.
O livro do profeta Isaias tem uma particularidade
única: é dividido em três partes chamadas Proto-Isaías, do capítulo
1 ao 39, Segundo Isaias também chamado Dêutero-Isaías ou “Livro da Consolação”
que compreende dos capítulos 40 ao 55 e o Trito-Isaías, dos capítulos 56 a 66.
A história dos
poemas narrativos constantes do Dêutero-Isaías ou Livro da Consolação tem a ver
com o regresso dos judeus depois do cativeiro da Babilônia.
A primeira
deportação dos judeus para a Babilônia deu-se em 597 aC ; em 586 aC é a
conquista de Jerusalém e a segunda deportação.
No “Livro da Consolação” Isaías fala em palavras luminosas,
não só da restauração de Judá, mas da vinda do “Servo de Yahweh”, que seria o
Rei Messias, o próprio Servo de Yahweh que iria remir o seu povo.
Num período
sombrio da história do seu povo, através do seu profeta Isaías, Yahweh torna-se
presente. A mensagem do Livro da Consolação (Is 40 – 55) é clara: num momento
em que o povo conhece o exílio e o sentimento de abandono, Yahweh escuta e
responde à sua súplica enviando um profeta para anunciar que o fim da desgraça
está próximo. A imagem de Deus que os judeus tinham adquirido foi purificada
através da enorme provação do exílio.
Quando o
Segundo Isaías fala de Yahweh, não se encontram
referências à cólera, nem às ameaças, nem a afirmações autoritárias. Deus ama,
e ama apenas por causa do seu amor:
ü “...
porque você é precioso para mim, é digno de estima e eu o amo; dou homens em
troca de você, e povos em troca de sua vida. Não tenha medo, pois eu estou com
você. [...] Era eu mesmo, por minha conta quem acabava limpando suas
transgressões e não me lembrava mais de seus pecados.” (Is 43,4-5ª.25); “Num
ímpeto de ira, por um momento eu escondi de você o meu rosto; agora, com amor
eterno, volto a me compadecer de você, diz Yahweh, seu redentor. Como no tempo
de Noé, agora faço a mesma coisa: jurei que as águas do dilúvio nunca mais
iriam cobrir a terra; da mesma forma, agora eu juro que não deixarei minha ira
se inflamar contra você e que nunca mais vou castigá-la.” (Is 54,8-9).
As primeiras
palavras deste pequeno conjunto de textos e da leitura deste domingo, são
repetidas insistentemente:
ü “Consolem,
consolem o meu povo, diz o Deus de vocês.” (Is 40,1).
O anúncio, que
consta da primeira leitura da liturgia deste segundo domingo do Advento, começa
com a palavra: “Consolem” não uma única vez, mas duas vezes.
Deus não está
mais contra o seu povo, como o sofrimento poderia fazer crer. Depois de um
tempo de grande desolação, o povo deve ser consolado, o que significa que
deverá poder deixar de se lamentar, para se pôr de pé e retomar o ânimo e a
confiança.
Apesar de o
povo estar numa situação limite, a consolação
deve mostrar que o seu futuro jorrará do coração de Deus:
ü “Falem
ao coração de Jerusalém, gritem para ela que já se completou o tempo de sua
escravidão, que o seu crime já foi perdoado, que ela já recebeu da mão de
Yahweh o castigo em dobro por todos os seus pecados.” (Is 40,2).
Deus não quer
o desespero humano. Ele não usa o sofrimento para ganhar o seu povo, quer antes
abrir-lhe um caminho de vida dando-lhe uma vida futura.
Isaias, nesta
leitura, não para por ai. Como Isaias é o mais messiânico e mais evangélico de
todos os profetas, mais ou menos seiscentos antes de Cristo, ele antevê e
profetiza sobre o precursor do Messias anunciado por ele:
ü “Uma
voz grita: ‘Abram no deserto um caminho para Yahweh; na região da terra seca,
aplainem uma estrada para o nosso Deus. Que todo vale seja aterrado, e todo
monte e colina sejam nivelados; que o terreno acidentado se transforme em
planície, e as elevações em lugar plano.” (Is 40,3-4).
No seu
Evangelho Mateus confirma a veracidade dessa profecia, quando afirma:
ü “Naqueles
dias, apareceu João Batista, pregando no deserto da Judéia: ‘Convertam-se,
porque o Reino do Céu está próximo’. João foi anunciado pelo profeta Isaias,
que disse: ‘Esta é a voz daquele que grita no deserto: Preparem o caminho do
Senhor, endireitem suas estradas’.” (Mt 3,1-3).
A figura de
João Batista começa a ser delineada através da profecia de Isaias. Como Isaias,
João Batista é personagem indispensável neste Tempo do Advento. É o mensageiro
da Boa Nova.
O profeta
Malaquias, também, anuncia o mensageiro que haveria de vir antes da Boa Nova:
ü “Vejam!
Estou mandando o meu mensageiro para preparar o caminho à minha frente. De
repente, vai chegar ao seu Templo o Senhor que vocês procuram, o mensageiro da
Aliança que vocês desejam. Olhem! Ele vem! – diz Yahweh dos Exércitos.” (Ml
3,1).
Malaquias
compara João Batista ao profeta Elias pela sua coragem e destemor em acusar os
pecados dos reis e das autoridades de sua época:
ü “Vejam,
eu mandarei a vocês o profeta Elias, antes que venha o grandioso Dia de Yahweh.
Ele há de fazer que o coração dos pais volte para os filhos e o coração dos
filhos para os pais; e assim, quando eu vier, não condenarei o país à
destruição total.” (Ml 3,23-24).
João Batista
começa a sua missão identificando-se:
ü “Eu
não sou o Messias.” (Jo 1,20)
E declara ser
aquela voz que prepara o caminho do rei:
ü “Eu
sou uma voz gritando no deserto: ‘Aplainem o caminho do Senhor’, como disse o
profeta Isaias.” (Jo 1,23).
O anjo
Gabriel, no Evangelho de Lucas, quando anunciava o nascimento de João Batista
ao seu pai, reafirma a profecia de Malaquias a respeito de João:
ü “Caminhará
à frente deles, com o espírito e o poder de Elias, a fim de converter o coração
dos pais aos filhos e os rebeldes à sabedoria dos justos, preparando para o
Senhor um povo bem disposto.” (Lc 1,17).
No Evangelho
de Mateus, Jesus, falando sobre João Batista, diz:
ü “É
de João que a Escritura diz: ‘Eis que eu envio o meu mensageiro à tua frente;
ele vai preparar o teu caminho diante de ti. [...] E se vocês o quiserem
aceitar, é este o Elias que devia vir.” (Mt 11,10.14).
João Batista,
que teria nascido aproximadamente seis meses antes do Messias (cf Lc 1,26.36),
foi esse mensageiro enviado por Yahweh para abrir as cortinas do Novo
Testamento, de uma Nova Aliança, e apontar aos seus discípulos a chegada da
Salvação e proclamar a presença do Cordeiro de Deus no meio do seu povo:
ü “No
dia seguinte, João viu Jesus, que se aproximava dele. E disse: ‘Eis o Cordeiro
de Deus, aquele que tira o pecado do mundo. Este é aquele de quem eu falei;
Depois de mim vem um homem que passou na minha frente, porque existia antes de
mim’. (Jo 1,29.35).
João declarou
sua insignificância diante do Messias que já estava no meio do povo, e
antecipou a missão do Messias:
ü “Eu
batizo vocês com água. Mas vai chegar alguém mais forte do que eu. Eu não sou
digno nem sequer de desamarrar a correia das sandálias dele. Ele é quem
batizará vocês com o Espírito Santo e com fogo. Ele terá na mão uma pá; vai
limpar sua eira, e recolher o trigo no seu celeiro; mas a palha ele vai queimar
no fogo que não se apaga.” (Lc 3,16-17).
Mais tarde, o
próprio Jesus destacaria a importância do ministério profético de João Batista,
quando disse:
ü “Eu
garanto a vocês: de todos os homens que já nasceram, nenhum me maior que João
Batista.” (Mt. 11,11).
João Batista
foi um homem de aspecto rude e caráter firme. Era austero, com hábitos
aparentemente anti-sociais; sua vestimenta era primária e seu alimento era
apenas aquilo que a natureza lhe oferecia:
ü “João
usava roupas de pelos de camelo, e cinto de couro na cintura; comia gafanhotos
e mel silvestre.” (Mt 3,4; Mc 1,6).
João Batista
não tinha papas na língua, jamais vacilou em falar clara, aberta e
contundentemente quando se fizesse necessário e, para ele não importava quem
estivesse cometendo algum delito, fosse gente do povo, fosse autoridade ou até
rei.
Às pessoas
simples do povo, os publicanos, que eram considerados pecadores públicos, aos
soldados e ao povo em geral, que buscavam a verdade, o amor, o perdão e a
reconciliação com Deus, e que perguntavam a João Batista: “O que é que
devemos fazer?” (Lc 3,10), João recomendava a partilha e a generosidade:
ü “Quem
tiver duas túnicas, dê uma a quem não tem. E quem tiver comida, faça a mesma
coisa.” (Lc 3,10-11).
ü Para
aqueles que tinham cargos públicos e que podiam se aproveitar dos impostos que
cobravam do povo, João recomendava a honestidade: “Não cobrem nada além da
taxa estabelecida.” (Mt 3,13).
Para aqueles
que eram responsáveis pela segurança do povo, os soldados, João recomendava a
não violência e o contentamento pelo salário recebido:
ü “Não
maltratem ninguém; não façam acusações falsas, e fiquem contentes com o salário
de vocês.” (Lc 3,14).
A preparação
feita por João Batista para receber a Salvação que vinha de Deus, foi para um
caminho de santidade, e o povo de Deus deve andar nesse caminho, conforme
dissera o profeta Isaias:
ü “Haverá
ai uma estrada, um caminho, que chamarão de caminho santo. Impuro nenhum
passará por ele, e os bobos não vão errar o caminho. [...] Por ele
andará os que foram redimidos e os que foram resgatados por Yahweh.” (Is 35,8.9b.10a).
Mas,
voltando-se para os fariseus e saduceus que eram as autoridades religiosas e
civis do povo judeu, que se julgavam santos e superiores a tudo e a todos, que
exploravam o povo simples e humilde, que se julgavam já salvos simplesmente por
se acharem filhos de Abraão, João Batista denunciou a religiosidade aparente e
falsa deles, que eram as classes sociais abastadas, assim os condenou, dizendo:
ü “Quando
viu muitos fariseus e saduceus vindo para o batismo, João disse-lhes: ‘Raça de
cobras venenosas, quem lhes ensinou a fugir a ira que vai chegar? Façam coisas
que provem que vocês se converteram. Não pensem que basta dizer: ‘Abraão é
nosso pai’. Porque eu lhes digo: até destas pedras Deus pode fazer nascer
filhos de Abraão. O machado já está posto na raiz das árvores. E toda árvore
que não der bom fruto, será cortada e lançada no fogo.” (Mt 3,7-10; Lc
3,7-9).
Ao rei
Herodes, que era um homem violento e sanguinário, mas fraco e acovardado, que
fora influenciado por Herodíades, que fora esposa de seu irmão e a quem o rei
havia tomado-a para si, João Batista não se intimidou e o condenou abertamente,
o que lhe custou a própria vida:
ü “João
dizia a Herodes: ‘Não é permitido você se casar com a mulher do seu irmão’. Por
isso, Herodíades ficou com raiva de João e queria matá-lo, mas não podia. Com
efeito, Herodes tinha medo de João, pois sabia que ele era justo e santo, e por
isso o protegia. Gostava de ouvi-lo, embora ficasse embaraçado quando o
escutava.” (Mc 6,18-20).
O resultado dessa
ousadia e sinceridade foi a decapitação de João Batista a pedido da própria
Herodíades (cf Mc 6,17-29; Mt 14,1-12). Mais tarde, talvez corroído pelo
remorso, como se isso fosse possível, o rei Herodes viu em Jesus a ressurreição
de João Batista:
ü “Herodes,
governador da Galiléia, ouviu falar da fama de Jesus. Disse então aos seus
oficiais: ‘Ele é João Batista que ressuscitou dos mortos. É por isso que os
poderes agem nesse homem.” (Mt 14,1-2).
As Sagradas
Escrituras não informam se João Batista e Jesus se conheciam antes de se
encontrarem no rio Jordão, por ocasião do batismo de Jesus, mas o próprio João
Batista afirma que:
ü “Eu
mesmo não o conhecia...”. (Jo 1,31).
João Batista
era filho do sacerdote Zacarias e Isabel (Lc 1,15-25). O mesmo Lucas diz que
Isabel era “parenta” de Maria, possivelmente prima (cf Lc 1,36).
Jesus se
dirige ao rio Jordão para ser batizado por João Batista, muito embora não
precisasse desse ritual para se lavar dos pecados, porque ele, Jesus, não os
tinha; Jesus não precisava do batismo de João Batista, pois não tinha qualquer
culpa, a não ser a culpa da humanidade que ele assumira. Quis, entretanto, nos
deixar o exemplo do que fazer e a lição de que ninguém é puro, a não ser ele
próprio, Jesus.
A princípio,
João, conhecedor dessa realidade, se recusa a batizar Jesus, conforme narra
Mateus no seu Evangelho:
ü “Jesus
foi da Galiléia para o rio Jordão, a fim de se encontrar com João, e ser
batizado por ele. Mas João procurava impedi-lo, dizendo: ‘Sou eu que devo ser
batizado por ti, e tu vens a mim’. Jesus, porém, lhe respondeu: ‘Por enquanto
deixe como está! Porque devemos cumprir toda a justiça’. E João concordou.” (Mt
3,13-15).
Nessa
oportunidade acontece uma teofania: pela primeira vez e publicamente, a
Santíssima Trindade se manifesta:
ü “Logo
que Jesus saiu da água, viu o céu se rasgando, e o Espírito como pomba, desceu
sobre ele. E do céu veio uma voz: ‘Tu és o meu Filho amado; em ti encontro o
meu agrado’.” (Mc 1,10-11),
O fato acima
foi testemunhado pelo próprio João Batista:
ü “Eu
vi o Espírito descer do céu, como uma pomba, e pousar sobre ele.” (Jo
1,32). ”
A vida pública
de Jesus tem início com seu Batismo por João, no rio Jordão:
ü “Jesus
tinha cerca de trinta anos quando começou sua atividade pública.” (Lc 3,23).
Até para o
povo e para os próprios discípulos de Jesus, a figura de João Batista, depois
de sua morte, ainda permanecia entre todos porque, quando Jesus perguntou aos
discípulos quem os homens diziam que ele era, eles responderam:
ü “Alguns
dizem que é João Batista...” (Mt 16,14).
A vaidade, o
orgulho, a soberba, jamais estiveram presentes na vida de João Batista.
Por sua
austeridade e fidelidade ao seu Deus, João Batista foi confundido com o próprio
Cristo, mas, imediatamente, retruca:
ü “Eu
não sou o Cristo” (Jo 3,28) e ainda “não sou digno de desatar a correia
de sua sandália”. (Jo 1,27; Mc 1,7).
Quando seus
discípulos hesitavam, sem saber a quem seguir, João Batista apontava em direção
ao único caminho, demonstrando o rumo certo, ao exclamar:
ü "Eis
o cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo". (Jo 1,29).
A pregação de
João Batista foi totalmente cristológica.
Como faltam
profetas como João Batista nos nossos dias...
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