XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM
Ano – B; Cor – Verde; Leituras: Ex
16,2-4.12-15; Sl 77; Ef 4,17.20-24; Jo 6,24-35.
"EU SOU O PÃO DA VIDA." (Jo 6,24-35).
Diácono Milton Restivo
É interessante ver na vida de Jesus como que, apesar
de muitos estarem interessados em suas mensagens de vida eterna, da vida que
não se acaba, da vida em abundância (cf Jo 10,10), outros se preocuparem apenas
com a parte material e seguirem-no à busca do alimento material, como vimos no
Evangelho da Liturgia do domingo passado, e como dirá Jesus mais adiante: “Eu garanto a vocês: vocês estão me
procurando, não porque viram os sinais, mas porque comeram os pães e ficaram
satisfeitos”. (Jo 6,26).
É interessante. O povo somente julgava ser Jesus
alguém especial, "o profeta que deve
vir ao mundo" (Jo 6,14), depois de saciados, depois de barriga cheia,
e aí, depois de verem as suas necessidades materiais satisfeitas, obrigando a Jesus
a se refugiar na montanha porque quiseram fazer de Jesus, um rei (f Jo 6,15).
Jesus teve de se refugiar na montanha para fugir a
essa honraria mundana considerando que, o Reino que ele veio trazer e propagar
não seria deste mundo: “Meu reino não é
deste mundo... Meu reino não é daqui... Para isso nasci e para isso vim ao
mundo: para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade escuta a minha voz.”
(Jo 18,36-37).
E Jesus, fugindo desse ímpeto do povo de fazê-lo rei,
refugia-se na montanha para um merecido repouso. Mas a multidão era como um
rebanho desordenado, sem pastor (cf Mc 6,34); quando perdia de vista a Jesus,
desesperava-se e o procurava por toda a parte, até encontrá-lo: “Quando a multidão viu que Jesus não estava
ali, nem os seus discípulos, subiu aos barcos e veio para Cafarnaum, à procura
de Jesus. Encontrando-o do outro lado do mar, disseram-lhe: ‘Rabi, quando
chegaste aqui’?” (Jo 6,24-25).
Jesus, para a multidão, na pior das hipóteses, era uma
mina de ouro no que diz respeito a atender as necessidades materiais, porque,
se a multidão estivesse doente, Jesus a curava; se a multidão tivesse com fome
novamente, sem sombra de dúvidas Jesus multiplicaria novamente pães e peixes,
e, estando com ele, ninguém precisaria de médico e nem passaria fome, e, para
dissimular essa preocupação material, chegaram a Jesus e disseram: “Rabi, quando chegaste aqui?”(Jo 6, 25),
o mesmo que dizer: “O Senhor desapareceu
de repente do nosso meio e viemos procurá-lo, porque ficamos preocupados...”
Que hipocrisia farisaica... Jesus, que conhecia bem o
coração dos homens, responde à multidão, procurando fazê-la entender que não
era esse o caminho para se chegar à verdade: “Em verdade, em verdade digo a vocês: vocês me procuram, não porque viram
sinais, mas porque comeram dos pães e ficaram saciados.” (Jo 6, 26).
Jesus diz de maneira direta que o povo não estava
interessado na Boa Nova do Reino de Deus, nas palavras de vida eterna que ele
viera trazer a este mundo, e sim, mais preocupado em encher a barriga de pão de
trigo ou cevada e peixe do que alimentar o seu espírito das coisas que vêm de
Deus. Seria diferente nos nossos dias?
A partir de então Jesus começa a utilizar-se da
pedagogia divina, porque sabia que ninguém mudaria de vida e de mentalidade,
ninguém se converteria de barriga vazia: primeiro ele alimentou a multidão com
o pão de cevada; a partir de agora ele ia oferecer o “pão da vida”, e continua na sua preleção: “Não trabalhem pelo alimento que se estraga; trabalhem pelo alimento
que dura para a vida eterna. É este alimento que o Filho do Homem dará a vocês,
porque foi ele quem Deus Pai mandou com seu selo”. (Jo 6,27).
À primeira vista o povo se interessou por essa
proposta de Jesus, porque o pão de cevada que comiam, horas depois iriam sentir
fome novamente; agora, que tipo de pão é esse, “o pão da vida”, que Jesus lhes propunha e incitava-o a trabalhar
para obtê-lo? Que alimento seria esse que permaneceria até a vida eterna? Mais
pela curiosidade e pelo interesse de não comer do pão de cevada e voltar a ter
fome e obter esse alimento que permanece até a vida eterna, perguntaram a
Jesus: “O que é que devemos fazer para
realizar as obras de Deus’? Jesus respondeu: ‘A obra de Deus é que vocês
acreditem naquele que ele enviou’.” (Jo 6,28-29).
A princípio, Jesus realiza a multiplicação dos pães; o
grande milagre que, com apenas cinco pães e dois peixes havia alimentado cerca
de cinco mil homens, sem contar as mulheres e crianças, ou melhor, incentiva o
povo à partilha para que todos seguissem o exemplo do menino que ofertara cinco
pães de cevada e dois peixes; para que todos colocassem em comum os pães e
peixes que traziam em seus alforjes, e este gesto redundaria, depois de todos
haverem se alimentados, na sobra “de doze
cestos” (cf Jo 6,1-15).
Diante dessa possibilidade de Jesus de saciar com o
alimento material, o povo começa a não deixar Jesus em paz. O povo começa a ver
Jesus como alguém que tem a capacidade de matar a fome física, mas, a partir
dai, Jesus começa a chamar a atenção da multidão para que começasse a se
preocupar com o alimento que durasse para a vida eterna.
Mas, a multidão, incrédula como sempre foi, quer
detalhes, quer provas de como Jesus pode oferecer esse pão que dura até a vida
eterna, já se esquecendo do maravilhoso milagre da multiplicação ou partilha
dos pães e peixes, e insiste nas suas perguntas: “Que sinal realizas para que vejamos e creiamos em ti? Que obras
fazes? Nossos pais comeram o maná no deserto, como está escrito: ‘Deu-lhes pão
do céu para comer’.” (Jo 6,30-31).
Que perguntas mais absurdas: será que o povo já não
havia visto sinais e obras suficientes por parte de Jesus para acreditar que
ele pudesse dar do alimento que dura a vida eterna? E os cegos, a quem ele
devolveu a vista? E os paralíticos a quem ele fez voltar a andar? E os surdos
que voltaram a ouvir? E os mudos que nunca emitiram uma única palavra desde que
nasceram, e estavam falando? E Lázaro, e a filha de Jairo, e o filho da viúva
de Naim que ele havia ressuscitado? Não fora Jesus quem fizera tudo isso? E a
multiplicação dos pães e peixes que lhe matou a fome?
Como a memória do homem é curta; o homem só se lembra
daquilo que lhe interessa.
Quando disseram a Jesus: “... como está escrito: ‘Deu-lhes pão do céu para comer’.” (Jo
6,31), evocaram a passagem do povo israelita no deserto, passando fome, narrada
na primeira leitura, quando “Yahweh disse
a Moisés: ‘Eis que vos farei chover pão do céu...’.” (Ex 16,4), e Jesus
responde, prontamente: “Eu garanto a
vocês: Moisés não deu para vocês o pão
que veio do céu. É o meu Pai quem dá para vocês o verdadeiro pão que vem
do céu, porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá a vida ao mundo”. (Jo
6,32-33).
Mais adiante Jesus irá dizer: “Eu sou o pão da vida. Os pais de vocês comeram o maná no deserto e, no
entanto morreram. Eis aqui o pão que desceu do céu; quem dele comer nunca
morrerá.” E Jesus continuou: “Eu sou
o pão vivo que desceu do céu. Quem come deste pão viverá para sempre.” (Jo
6,48-51).
O povo logo se interessa por esse pão maravilhoso,
verdadeiro pão do céu, o pão de Deus, o pão que desce do céu e dá a vida ao
mundo; por esse pão que, não somente dá a vida ao corpo por apenas algumas
horas, mas dá a vida ao mundo e permanece até a vida eterna, e pedem a Jesus: “Senhor, dá-nos sempre deste pão!” (Jo
6,34).
E ai vem a prova de fogo; um momento decisivo e
crucial para a credulidade do povo, e Jesus responde: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim, nunca mais terá fome, e o que
crê em mim nunca mais terá sede.” (Jo 6,35).
O povo, que antes buscava Jesus onde estivesse e que
corria atrás dele quando se ausentava após ter-lhe matado a fome material, de
repente, já não o vê como “... o profeta
que deve vir ao mundo.” (Jo 6,15), como o havia proclamado no dia anterior,
após a multiplicação dos pães e peixes, e já se divide, murmurando: “Esse não é Jesus, o filho de José, cujo
pai e mãe conhecemos? Como diz agora: ‘Eu desci do céu’?” (Jo 6,42).
Que absurdo. Quando lhes matou a fome material, Jesus
era “o profeta que deve vir ao mundo”;
quando se diz o enviado de Deus e o pão da vida, já não passa de alguém do povo
cujo pai, José, o carpinteiro, e mãe, Maria, todos conhecem... Que demérito tem
de ser Jesus filho de José e Maria, casal humilde, que todos conheciam?
Realmente, o povo conhecia os pais de Jesus; conhecia José, o carpinteiro, conhecia
Maria, aquela senhora humilde que, onde quer que ele estivesse, ali estava ela,
a acompanhá-lo.
Se todos conheciam os pais de Jesus, como poderia ele
dizer que descera do céu e que era “O pão
da vida?” (Jo 6,35); e ainda mais: “...
pois desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me
enviou?” (Jo 6, 38). E ainda mais: afirmar categoricamente que “Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem
comer deste pão viverá eternamente. O pão que eu darei é a minha carne para a
vida do mundo.” (Jo, 6,51).
Após essa afirmativa, o povo vai à loucura: para
ganhar a vida eterna, haveria a necessidade de se tornar canibal, antropófago? Isso
jamais poderia caber na cabeça daquela gente, e “Os judeus discutiam entre si, dizendo: ‘Como esse homem pode dar-nos a
sua carne a comer’?” (Jo 6,52).
Jesus, como um verdadeiro profeta do Senhor que não se
intimida, não se acovarda diante dos obstáculos apresentados para obstruir as
suas afirmativas e, mais do que um profeta, falando como Deus que era, é, e sempre
será, retruca: “Eu garanto a vocês se
vocês não comem a carne do Filho do Homem e não bebem o seu sangue, não terão a
vida em vocês. Quem
come a minha carne e bebe o meu sangue, eu o ressuscitarei no último dia.
Porque a minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira bebida.
Quem come a minha carne e bebe o meu sangue vive em mim e eu vivo nele. E como
o Pai, que vive, me enviou e eu vivo pelo Pai, assim aquele que me receber como
alimento viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu. Não é como o pão que o
pai de vocês comeram e depois morreram. Quem come deste pão viverá para
sempre”. (Jo 6,53-58).
Pronto. E daí? O
que pensou o povo? Não somente o povo! E os seus discípulos? E os homens e
mulheres em geral? E nós? E aqueles que o seguiam onde quer que fosse e
acreditavam realmente que era o Messias prometido desde o início dos tempos? “Muitos de seus discípulos, ouvindo-o,
disseram: ‘Essa palavra é dura! Quem pode escutá-la’?” (Jo 6,60), e, “a partir dai, muitos discípulos voltaram
atrás e não andavam mais com ele.” (Jo 6,66). “Então, disse Jesus aos Doze (apóstolos): ‘Vocês também querem ir embora?’ Simão Pedro respondeu-lhe: ‘Senhor, a
quem iremos? Tens palavra de vida eterna e nós cremos e reconhecemos que tu és
o santo de Deus’.” (Jo 6,67-69).
Depois de ouvirmos tudo o que Jesus disse, continuamos
ainda com a mesma opinião de Simão Pedro?
Dito isso, deu do pão aos seus apóstolos para comerem
e do vinho para beberem, deixando claro que o pão é verdadeiramente o seu corpo
que foi dado para a salvação de todos os homens, e o vinho é verdadeiramente o
seu sangue que foi derramado para o perdão de todos os pecados...
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