domingo, 2 de agosto de 2015

"EU SOU O PÃO DA VIDA." (Jo 6,24-35).



XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM
Ano – B; Cor – Verde; Leituras: Ex 16,2-4.12-15; Sl 77; Ef 4,17.20-24; Jo 6,24-35.

"EU SOU O PÃO DA VIDA." (Jo 6,24-35).


Diácono Milton Restivo

É interessante ver na vida de Jesus como que, apesar de muitos estarem interessados em suas mensagens de vida eterna, da vida que não se acaba, da vida em abundância (cf Jo 10,10), outros se preocuparem apenas com a parte material e seguirem-no à busca do alimento material, como vimos no Evangelho da Liturgia do domingo passado, e como dirá Jesus mais adiante: “Eu garanto a vocês: vocês estão me procurando, não porque viram os sinais, mas porque comeram os pães e ficaram satisfeitos”. (Jo 6,26).
É interessante. O povo somente julgava ser Jesus alguém especial, "o profeta que deve vir ao mundo" (Jo 6,14), depois de saciados, depois de barriga cheia, e aí, depois de verem as suas necessidades materiais satisfeitas, obrigando a Jesus a se refugiar na montanha porque quiseram fazer de Jesus, um rei (f Jo 6,15).
Jesus teve de se refugiar na montanha para fugir a essa honraria mundana considerando que, o Reino que ele veio trazer e propagar não seria deste mundo: “Meu reino não é deste mundo... Meu reino não é daqui... Para isso nasci e para isso vim ao mundo: para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade escuta a minha voz.” (Jo 18,36-37). 
     E Jesus, fugindo desse ímpeto do povo de fazê-lo rei, refugia-se na montanha para um merecido repouso. Mas a multidão era como um rebanho desordenado, sem pastor (cf Mc 6,34); quando perdia de vista a Jesus, desesperava-se e o procurava por toda a parte, até encontrá-lo: “Quando a multidão viu que Jesus não estava ali, nem os seus discípulos, subiu aos barcos e veio para Cafarnaum, à procura de Jesus. Encontrando-o do outro lado do mar, disseram-lhe: ‘Rabi, quando chegaste aqui’?” (Jo 6,24-25).
Jesus, para a multidão, na pior das hipóteses, era uma mina de ouro no que diz respeito a atender as necessidades materiais, porque, se a multidão estivesse doente, Jesus a curava; se a multidão tivesse com fome novamente, sem sombra de dúvidas Jesus multiplicaria novamente pães e peixes, e, estando com ele, ninguém precisaria de médico e nem passaria fome, e, para dissimular essa preocupação material, chegaram a Jesus e disseram: “Rabi, quando chegaste aqui?”(Jo 6, 25), o mesmo que dizer: “O Senhor desapareceu de repente do nosso meio e viemos procurá-lo, porque ficamos preocupados...”
Que hipocrisia farisaica... Jesus, que conhecia bem o coração dos homens, responde à multidão, procurando fazê-la entender que não era esse o caminho para se chegar à verdade: “Em verdade, em verdade digo a vocês: vocês me procuram, não porque viram sinais, mas porque comeram dos pães e ficaram saciados.” (Jo 6, 26).
Jesus diz de maneira direta que o povo não estava interessado na Boa Nova do Reino de Deus, nas palavras de vida eterna que ele viera trazer a este mundo, e sim, mais preocupado em encher a barriga de pão de trigo ou cevada e peixe do que alimentar o seu espírito das coisas que vêm de Deus.  Seria diferente nos nossos dias?
A partir de então Jesus começa a utilizar-se da pedagogia divina, porque sabia que ninguém mudaria de vida e de mentalidade, ninguém se converteria de barriga vazia: primeiro ele alimentou a multidão com o pão de cevada; a partir de agora ele ia oferecer o “pão da vida”, e continua na sua preleção: “Não trabalhem pelo alimento que se estraga; trabalhem pelo alimento que dura para a vida eterna. É este alimento que o Filho do Homem dará a vocês, porque foi ele quem Deus Pai mandou com seu selo”. (Jo 6,27).
À primeira vista o povo se interessou por essa proposta de Jesus, porque o pão de cevada que comiam, horas depois iriam sentir fome novamente; agora, que tipo de pão é esse, “o pão da vida”, que Jesus lhes propunha e incitava-o a trabalhar para obtê-lo? Que alimento seria esse que permaneceria até a vida eterna? Mais pela curiosidade e pelo interesse de não comer do pão de cevada e voltar a ter fome e obter esse alimento que permanece até a vida eterna, perguntaram a Jesus: “O que é que devemos fazer para realizar as obras de Deus’? Jesus respondeu: ‘A obra de Deus é que vocês acreditem naquele que ele enviou’.” (Jo 6,28-29).
A princípio, Jesus realiza a multiplicação dos pães; o grande milagre que, com apenas cinco pães e dois peixes havia alimentado cerca de cinco mil homens, sem contar as mulheres e crianças, ou melhor, incentiva o povo à partilha para que todos seguissem o exemplo do menino que ofertara cinco pães de cevada e dois peixes; para que todos colocassem em comum os pães e peixes que traziam em seus alforjes, e este gesto redundaria, depois de todos haverem se alimentados, na sobra “de doze cestos” (cf Jo 6,1-15).
Diante dessa possibilidade de Jesus de saciar com o alimento material, o povo começa a não deixar Jesus em paz. O povo começa a ver Jesus como alguém que tem a capacidade de matar a fome física, mas, a partir dai, Jesus começa a chamar a atenção da multidão para que começasse a se preocupar com o alimento que durasse para a vida eterna.
Mas, a multidão, incrédula como sempre foi, quer detalhes, quer provas de como Jesus pode oferecer esse pão que dura até a vida eterna, já se esquecendo do maravilhoso milagre da multiplicação ou partilha dos pães e peixes, e insiste nas suas perguntas: “Que sinal realizas para que vejamos e creiamos em ti? Que obras fazes? Nossos pais comeram o maná no deserto, como está escrito: ‘Deu-lhes pão do céu para comer’.”  (Jo 6,30-31).
Que perguntas mais absurdas: será que o povo já não havia visto sinais e obras suficientes por parte de Jesus para acreditar que ele pudesse dar do alimento que dura a vida eterna? E os cegos, a quem ele devolveu a vista? E os paralíticos a quem ele fez voltar a andar? E os surdos que voltaram a ouvir? E os mudos que nunca emitiram uma única palavra desde que nasceram, e estavam falando? E Lázaro, e a filha de Jairo, e o filho da viúva de Naim que ele havia ressuscitado? Não fora Jesus quem fizera tudo isso? E a multiplicação dos pães e peixes que lhe matou a fome?
Como a memória do homem é curta; o homem só se lembra daquilo que lhe interessa.
Quando disseram a Jesus: “... como está escrito: ‘Deu-lhes pão do céu para comer’.” (Jo 6,31), evocaram a passagem do povo israelita no deserto, passando fome, narrada na primeira leitura, quando “Yahweh disse a Moisés: ‘Eis que vos farei chover pão do céu...’.” (Ex 16,4), e Jesus responde, prontamente: “Eu garanto a vocês: Moisés não deu para vocês o pão  que veio do céu. É o meu Pai quem dá para vocês o verdadeiro pão que vem do céu, porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá a vida ao mundo”. (Jo 6,32-33).
Mais adiante Jesus irá dizer: “Eu sou o pão da vida. Os pais de vocês comeram o maná no deserto e, no entanto morreram. Eis aqui o pão que desceu do céu; quem dele comer nunca morrerá.” E Jesus continuou: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem come deste pão viverá para sempre.” (Jo 6,48-51).
O povo logo se interessa por esse pão maravilhoso, verdadeiro pão do céu, o pão de Deus, o pão que desce do céu e dá a vida ao mundo; por esse pão que, não somente dá a vida ao corpo por apenas algumas horas, mas dá a vida ao mundo e permanece até a vida eterna, e pedem a Jesus: “Senhor, dá-nos sempre deste pão!” (Jo 6,34).
E ai vem a prova de fogo; um momento decisivo e crucial para a credulidade do povo, e Jesus responde: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim, nunca mais terá fome, e o que crê em mim nunca mais terá sede.” (Jo 6,35).
O povo, que antes buscava Jesus onde estivesse e que corria atrás dele quando se ausentava após ter-lhe matado a fome material, de repente, já não o vê como “... o profeta que deve vir ao mundo.” (Jo 6,15), como o havia proclamado no dia anterior, após a multiplicação dos pães e peixes, e já se divide, murmurando: “Esse não é Jesus, o filho de José, cujo pai e mãe conhecemos? Como diz agora: ‘Eu desci do céu’?” (Jo 6,42).
Que absurdo. Quando lhes matou a fome material, Jesus era “o profeta que deve vir ao mundo”; quando se diz o enviado de Deus e o pão da vida, já não passa de alguém do povo cujo pai, José, o carpinteiro, e mãe, Maria, todos conhecem... Que demérito tem de ser Jesus filho de José e Maria, casal humilde, que todos conheciam? Realmente, o povo conhecia os pais de Jesus; conhecia José, o carpinteiro, conhecia Maria, aquela senhora humilde que, onde quer que ele estivesse, ali estava ela, a acompanhá-lo.     
Se todos conheciam os pais de Jesus, como poderia ele dizer que descera do céu e que era “O pão da vida?” (Jo 6,35); e ainda mais: “... pois desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou?” (Jo 6, 38). E ainda mais: afirmar categoricamente que “Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. O pão que eu darei é a minha carne para a vida do mundo.” (Jo, 6,51).
Após essa afirmativa, o povo vai à loucura: para ganhar a vida eterna, haveria a necessidade de se tornar canibal, antropófago? Isso jamais poderia caber na cabeça daquela gente, e “Os judeus discutiam entre si, dizendo: ‘Como esse homem pode dar-nos a sua carne a comer’?” (Jo 6,52).
Jesus, como um verdadeiro profeta do Senhor que não se intimida, não se acovarda diante dos obstáculos apresentados para obstruir as suas afirmativas e, mais do que um profeta, falando como Deus que era, é, e sempre será, retruca: “Eu garanto a vocês se vocês não comem a carne do Filho do Homem e não bebem o seu sangue, não terão a vida em vocês. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue vive em mim e eu vivo nele. E como o Pai, que vive, me enviou e eu vivo pelo Pai, assim aquele que me receber como alimento viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu. Não é como o pão que o pai de vocês comeram e depois morreram. Quem come deste pão viverá para sempre”. (Jo 6,53-58).
Pronto. E daí?  O que pensou o povo? Não somente o povo! E os seus discípulos? E os homens e mulheres em geral? E nós? E aqueles que o seguiam onde quer que fosse e acreditavam realmente que era o Messias prometido desde o início dos tempos? “Muitos de seus discípulos, ouvindo-o, disseram: ‘Essa palavra é dura! Quem pode escutá-la’?” (Jo 6,60), e, “a partir dai, muitos discípulos voltaram atrás e não andavam mais com ele.” (Jo 6,66). “Então, disse Jesus aos Doze (apóstolos): ‘Vocês também querem ir embora?’ Simão Pedro respondeu-lhe: ‘Senhor, a quem iremos? Tens palavra de vida eterna e nós cremos e reconhecemos que tu és o santo de Deus’.” (Jo 6,67-69).
Depois de ouvirmos tudo o que Jesus disse, continuamos ainda com a mesma opinião de Simão Pedro?
Em Mateus Jesus concretiza essa sua afirmativa na quinta-feira que antecede o dia de seu sacrifício supremo, quando reunido com seus apóstolos, comemora a Páscoa dos judeus e “Enquanto comiam, Jesus tomou um pão e, tendo-o abençoado, partiu-o e, distribuiu aos discípulos, disse: ‘Tomai e comei, isto é o meu corpo’. Depois tomou um cálice e, dando graças, deu-lho dizendo: ‘Bebei dele todos, pois isto é o meu sangue, o sangue da Aliança, que é derramado por muitos para a remissão dos pecados. Eu vos digo: desde agora não bebereis deste fruto da videira até aquele dia em que convosco beberei o vinho novo no Reino do meu Pai’.” (Mt 26,26-29).

Dito isso, deu do pão aos seus apóstolos para comerem e do vinho para beberem, deixando claro que o pão é verdadeiramente o seu corpo que foi dado para a salvação de todos os homens, e o vinho é verdadeiramente o seu sangue que foi derramado para o perdão de todos os pecados...

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