IV DOMINGO DO TEMPO COMUM
Ano – B; Cor – verde; Leituras: Dt 18,15-20; Sl 94
(95); 1Cor 7,32-35; Mc 1,21-28.
“CALA-TE E SAIA DELE.” (Mc 1,25).
Diácono Milton Restivo
O livro do Deuteronômio, constante da primeira
leitura, tem o seu nome derivado das palavras gregas: “deuteros”, que quer
dizer segunda e “nomos”, Lei. É um dos cinco livros do Pentateuco para os
cristãos e da Torah para os judeus.
Pentateuco também é derivado do grego: “penta”, cinco
e “teuco”, tomos ou livros, ou rolos.
Os cinco livros do Pentateuco são pela ordem: Gênesis,
Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.
Citações do livro do Deuteronômio são uma constante no
Novo Testamento. Na tentação do deserto, no debate com o tentador, Jesus cita-o
várias vezes (Mt 4,1-11 e Lc 4,1-13, referindo-se a Dt 8,3; 6,16; 6,13 e
10,20).
Os ensinamentos e discursos deste livro, de maneira
geral, reforçam a idéia de que servir a Deus não é apenas seguir sua lei. O
amor está acima da lei e, quem ama, não contraria a Lei de Deus, pelo
contrário, cumpre a Lei fielmente.
O livro do Deuteronômio é categórico quanto ao amor
que se deve a Deus:
·
“São estes os
mandamentos, os estatutos e as normas que Yahweh vosso Deus ordenou
ensinar-vos... [...] “Ouve, ó
Israel: Yahweh nosso Deus é o único Yahweh! Portanto, amarás a Yahweh teu Deus
com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força”. (Dt
6,1.4-5).
Isso que foi repetido por Jesus na íntegra em Marcos 12-29,
Mateus 22,37 e pelo escriba quando perguntado por Jesus em Lucas 10,27.
Também, no livro do Deuteronômio, Yahweh coloca à
disposição do povo os dois caminhos à escolha de cada um: o caminho da vida e o
caminho da morte, o caminho da benção e o caminho da maldição:
·
“Eis que hoje
estou colocando diante de ti a vida e a felicidade, a morte a infelicidade. Se
ouves os mandamentos de Yahweh teu Deus, andando em seus caminhos e observando
seus mandamentos, seus estatutos e suas normas, viverás e multiplicarás.” (Dt 30,15-16).
A escolha é de cada um. O homem tem o livre arbítrio.
A escolha de cada um é livre. O livre arbítrio dá a liberdade de plantar o que
se quiser e onde quiser. Mas ai entra a justiça de Deus.
E a justiça é colher exatamente o que se plantou: se
plantou o mal, colhe-se o mal, se o bem, colhe-se o bem.
A
respeito disso, disse o Apóstolo Paulo:
·
“Não se iludam, pois com Deus não se brinca: cada um colherá aquilo que
tiver semeado. Quem semeia nos instintos egoístas, dos instintos egoístas
colherá corrupção; quem semeia no Espírito, do Espírito colherá a vida eterna.”
(Gl 6,7-8).
Na passagem do livro do Deuteronômio lido nesta
liturgia, Moisés cita quando o povo, no deserto, ficou atemorizado ao ouvir a
voz de Yahweh sobre o monte Sinai, como consta:
·
“os trovões e
os relâmpagos, o som da trombeta e a montanha fumegante” (Ex 20,18).
O povo pede que o próprio Moisés lhe transmita a
mensagem de Yahweh para que eles não morram:
·
“Foi
exatamente o que pediste ao Senhor teu Deus, no monte Horeb, quando todo o povo
estava reunido, dizendo: ‘Não quero mais escutar a voz do Senhor meu Deus nem
ver este grande fogo, para não acabar morrendo.” (Dt 18,16; Ex 20,18-19).
Para que Yahweh não perdesse a comunicação com o seu
povo, Moisés afirma que o próprio Yahweh lhe prometera que o povo escolhido
sempre teria um porta-voz seu, um profeta e que faria surgir no meio do povo um
profeta semelhante a Moisés (Dt 18,18).
Para cumprir isso, Yahweh não mandou para o seu povo
alguém que fosse igual a Moisés, mas superior a ele, porque, na plenitude dos
tempos a Palavra - Jesus Cristo - veio até nós:
·
“a Palavra se
fez homem e veio habitar entre nós. E nós contemplamos a sua glória: glória do
Filho único do Pai, cheio de amor e fidelidade”. (Jo 1,14).
Para o povo da Nova Aliança, do Novo Testamento, o Pai
não somente mandou um profeta igual a Moisés, mas alguém superior a Moisés, a
própria Palavra do Pai, seu Filho único, a segunda Pessoa da Santíssima
Trindade, personificada em
Jesus Cristo.
O Pai fala-nos através de Jesus Cristo, não mais
através de Moisés.
O próprio Moisés falou de Jesus, advertindo de que,
quem não o ouvisse, seria destruído:
·
“Porei em sua
boca as minhas palavras e ele lhes comunicará tudo o que eu lhe mandar. Eu
mesmo pedirei contas a quem não escutar as minhas palavras que ele pronunciar
em meu nome”. (Dt 18,18b-19).
E isso Pedro, cheio do Espírito Santo, afirma com
autoridade:
·
“De fato
Moisés afirmou: ‘O Senhor Deus fará surgir, entre os irmãos de vocês, um
profeta como eu. Escutem tudo o que ele disser a vocês. Quem não der ouvidos a
esse profeta será eliminado do meio do povo. E todos os profetas que falaram
desde Samuel e seus sucessores, também eles anunciaram este dia.” (At 3,22-24).
O autor da carta aos Hebreus é categórico quando
afirma:
·
“Nos tempos
antigos, muitas vezes e de muitos modos Deus falou aos antepassados por meio
dos profetas. No período final em que estamos, falou a nós por meio do Filho.
Deus o constituiu herdeiro de todas as coisas e, por meio dele, também criou os
mundos.” (Hb 1,1-2).
Há necessidade de acrescentar alguma coisa mais para
afirmar que Jesus é a Palavra do Pai?
E o próprio Jesus evoca Moisés como testemunha de
condenação para aqueles que não ouviram a sua voz:
·
“Não pensem
que eu vou acusar vocês diante do Pai. Já existe alguém que os acusa: é Moisés,
no qual vocês põem a sua esperança. Se vocês acreditassem mesmo em Moisés,
também acreditariam em mim, porque foi a respeito de mim que Moisés escreveu.
Mas, se vocês não acreditam naquilo que ele escreveu, como irão acreditar nas
minhas palavras?” (Jo 5,45-47).
O Salmo 94 (95) é um convite para louvar a Yahweh:
·
“Venham,
exultemos em Yahweh, aclamemos o Rochedo que nos salva. Entremos com louvor em
sua presença, vamos aclamá-lo com instrumentos. [...] Entrem e se prostrem e se inclinem,
bendizendo a Yahweh que nos fez.” (Sl 95 (94), 1-2.6).
Deus merece adoração porque ele é o Criador e o
supremo Rei que domina toda a criação (cf Sl 95 (94),1-6). Ele é o pastor do
seu rebanho:
·
“Porque ele é
nosso Deus, e nós somos o seu povo, o rebanho que ele conduz.” (Sl 95 (94),7).
Yahweh chama seu povo para ser fiel e obediente e não
fazer como os israelitas rebeldes que não entraram na Terra Prometida (cf Sl 95
(94),8-11).
No Evangelho Jesus está na cidade de Cafarnaum e,
·
“num dia de
sábado, entrou na sinagoga e começou a ensinar”. (Mc 1,21).
O fato de Jesus ensinar na sinagoga não traz nada de
novo, porque os escribas e doutores da Lei assim o faziam. O que chama a
atenção é que
·
“todos ficam
admirados com o seu ensinamento,
pois ensinava como quem tem autoridade, não como os mestres da Lei”. (Mc
1,22).
Isso é interessante porque os ouvintes notaram que, o
que Jesus ensinava, era alguma coisa diferente, algo que eles ainda não tinham
ouvido por parte das autoridades religiosas judaicas, e
·
“todos ficaram
muito espantados e perguntavam uns aos outros: ‘O que é isso? Um ensinamento
novo dado com autoridade...” (Mc
1,27b).
Ensinar com autoridade quer dizer: com poder legítimo,
irrecusável e incontestável e que não deixava margem de dúvida sobre o que
ensinava.
·
“pois ensinava
como quem tem autoridade, não como os mestres da Lei”. (Mc 1,22).
De repente, entra em cena, dentro da própria sinagoga,
·
“um homem
possuído por um espírito mau” (Mc
1,23).
Quando se fala em espírito mau nas Sagradas
Escrituras, muitos entendem como sendo o demônio, portanto, um homem possuído
do demônio.
Muitas seitas que se dizem cristãs, as pseudo-cristãs,
aproveitam-se dessas passagens para valorizar o demônio, falando mais do
demônio em suas reuniões e cultos do que de Jesus Cristo, intimidando os seus
fiéis com o demônio, esquecendo-se do que Paulo disse:
·
“Se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).
O termo “espírito” na língua hebraica é “ruah” e
significa respiração, vento ou brisa, ou seja, o ar sempre em movimento, pois
onde há vento ou brisa, há movimento.
Vento impetuoso ou turbilhão, são
imagens que servem para exprimir a força, a liberdade e a transcendência do
Espírito de Deus, como aconteceu no dia de Pentecostes com a vinda do Espírito
Santo:
·
“De repente, veio do céu um barulho como o sopro de um forte
vendaval, e encheu a casa onde eles se encontravam. Apareceram então como umas
línguas de fogo, que se espalharam e foram pousar sobre cada um deles. Todos
ficaram repletos do Espírito Santo...” (At 2,2-4a).
Quem tem um espírito mau, quer
dizer que virou as costas para o espírito bom ou para o Espírito de Deus, que é
o Espírito Santo. Se o espírito é o vento em movimento, quem tem dificuldades
de respírar sente-se acuado, incomodado, importunado e até agressivo.
Quem deixa de ter o espírito bom,
nas Sagradas Escrituras é como se tivesse caido na desgraça, no infortúnio, na
calamidade e, para essa pessoa, tudo o que a rodeia é ameaçador e,
incontinente, ela parte para a agressão buscando se defender.
Se entendermos desta forma,
podemos chegar à conclusão que o espírito mau não chega a ser um demônio como
tantos pregam, e sim um espírito que traz sofrimento, angústia, desespero para
si próprio e insegurança para todos.
·
“Se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).
Temos necessidade de entender que
aquilo que foi escrito pelos Evangelistas foi para os que ainda não tinham sido
convertidos ou para cristãos imaturos, por isso, a linguagem que foi usada
tinha que lhes ser familiar, ou seja, falar uma linguagem que eles entendiam.
O objetivo do Evangelista era
mostrar que não deveriam ter medo de demônios ou espíritos maus, de
contradições da vida, de infortúnios ou contratempos, considerando que existia
alguém superior a eles, o próprio Jesus, e Jesus deu esse poder aos seus
discípulos, o de escurraçar de perto de si qualquer demônio ou espírito mau,
conforme disse Paulo:
·
“Se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).
Nos escritos das Sagradas
Escrituras, que são direcionados para cristãos maduros na fé, não são
mencionadas pessoas possuídas por demônios ou tomadas por espíritos maus.
O Evangelho de João e as cartas
dos Apóstolos não citam pessoas dominadas pelos demônios. É a Igreja que confia
no seu Deus:
·
“Se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).
Jesus disse:
·
“... Em verdade, em verdade vos digo que todo aquele que comete pecado é
escravo do pecado.” (Jo 8,34).
Quem comete pecado fecha as
portas para o espírito bom, o Espírito de Deus, o Espírito Santo e as abre para
o espírito mau que toma posse de suas atitudes, repito o disse Paulo:
·
“Não se iludam, pois com Deus não se brinca: cada um colherá aquilo que
tiver semeado. Quem semeia nos instintos egoístas, dos instintos egoístas
colherá corrupção; quem semeia no Espírito, do Espírito colherá a vida eterna.”
(Gl 6,7-8).
O demônio não tem nada com
isso. O demônio só tem voz, vez e força nas seitas pseudo-cristãs que querem
intimidar seus fiéis com a possessão demoníaca, esquecendo-se do que Paulo
disse:
·
“Se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).
Muitas vezes atribuímos ao demônio coisas que
ele nunca fez.
Os piores demônios nós mesmos
os fabricamos. Os piores demônios estão dentro de cada um de nós, e são esses
os espíritos maus que não nos deixam em paz, como a inveja, o orgulho, a
vaidade, a violência, a prepotência, o egoísmo, a ganância, o desamor, a
luxúria, o ódio, a discriminação e tantos outros que fazem fechar as portas
para o Espírito de Deus e passam a ocupar o espaço no nosso coração que Deus
reservou somente para si, conforme disse Paulo:
·
"Vocês
não sabem que vocês são templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em
vocês? Se alguém destruir o templo de Deus, Deus o destruirá; pois o templo de
Deus é santo, e esse tempo são vocês. [...]
Ou vocês não sabem que o seu corpo é templo do Espírito Santo, que está em
vocês e lhes foi dado por Deus?” (1Cor 3,16-17; 6,19).
O livro do Deuteronômio é categórico. Deus estabelece
normas que, quando contrariadas, ocasionam consequências, tanto danosas como
boas, podendo colher recompensa ou castigo pelas suas atitudes:
·
“Eis que hoje
estou colocando diante de ti a vida e a felicidade, a morte a infelicidade. Se
ouves os mandamentos de Yahweh teu Deus, andando em seus caminhos e observando
seus mandamentos, seus estatutos e suas normas, viverás e multiplicarás.” (Dt 30,15-16).
Jesus veio para libertar o homem de todos os males,
tanto dos espíritos maus como das doenças; veio para libertar o homem de toda e
qualquer escravidão do mundo e deixá-lo livre, para livre caminhar para o reino
dos céus.
A missão de Jesus é liberar o homem de suas tendências
maléficas, deixar o homem livre dos espíritos maus que ele mesmo criou, das
inclinações do pecado que pretendem manipular as mais puras intenções; libertar
das doenças do corpo e da alma.
É Jesus quem liberta o homem, todos os dias, dos
demônios dos vícios, do sexo, do tóxico, do desemprego, do desamor, da fome de
comida e da fome de Deus. Jesus liberta o homem todo, de corpo e alma;
liberta-o do pecado e do mal físico porque o sofrimento, a doença e a fome
também estão na lista dos pecados, isto é, das coisas que Deus não quer para os
seus filhos.
Quem está com fome não é livre. Quem está doente não é
livre. Quem não tem onde morar não é livre. Quem não tem instrução não é livre,
como não é livre quem se deixa dominar pelo pecado.
Em todos esses casos o homem está sendo manipulado e possuído
por algo que lhe tira a liberdade e a sua autonomia; que lhe mata a alegria de
viver e a vontade de trabalhar e progredir; que lhe rouba o amor e a esperança.
E a isso muitos dão o nome de demônio.
São esses os espíritos maus dos nossos tempos.
A ignorância do homem o escraviza, não permite que ele
seja livre.
Ignorante que o homem é das coisas de Deus, que desconhece
que Jesus é o Caminho que o Senhor envia e pede que todos o sigam se quiserem
deixar de ser escravos, dos vícios, do pecado, da opressão do próprio homem.
O homem se esquece ou ignora que Jesus é o irmão
supremo e tem plenos poderes para libertá-lo. Ignora essa força divina e
infinita que o Senhor envia na pessoa de Jesus Cristo e se encolhe com medo das
provações, com medo dos que não respeitam os direitos dos irmãos, com medo dos
que exploram o povo de Deus, com medo dos que violentam os direitos dos que não
tem voz e nem vez.
Jesus é o Libertador. Jesus não é só o libertador da
alma: é também o libertador do corpo, porque todos os cristãos filhos de Deus
são um composto de corpo e alma, matéria e espírito, e o Senhor Nosso Deus se
preocupa com o homem como um todo, e não em partes.
O homem desconhece Jesus como Libertador, e quando lhe
vem a provação, quando é oprimido pelos grandes, quando lhe vem o desemprego e
a doença, quando é atacado pela fome, ao invés de se apegar ao seu Libertador
que pode tudo, porque ele é o Senhor da vida, o Filho Unigênito de Deus e, por
conseguinte,
Deus, o homem recorre às baixarias da macumba, às
ignorâncias das crendices populares, aos engodos do espiritismo, aos charlatães
da fé do povo simples como tantas igrejas que se dizem cristãs que, para
resolver os seus problemas evocam mais o demônio do que o próprio Jesus.
Jesus é o nosso irmão, e somente ele recebeu das mãos
do Pai plenos poderes para libertar-nos de tudo o que nos oprime e nos afasta
de Deus.
Jesus Cristo tem poderes de libertar-nos da opressão e
do pecado. Jesus tem autoridade para mandar calar os poderes opressores dos espíritos
maus, das doenças e dos homens e somente ele pode libertar o homem da opressão
e do pecado para que sejam plenamente livres.
E como Jesus disse para o espírito mau que estava
naquele homem na sinagoga:
·
“Cala-te e sai dele.” (Mc 1,25).
Todos nós, cristãos, devemos falar a tudo aquilo que
escraviza e oprime o homem nos nossos dias:
·
“Sai desse homem e deixe-o ter a liberdade dos filhos
de Deus.”
Todos temos o direito de sermos livres como Jesus nos
quer livres; livres dos espíritos maus da fome, da doença, do desemprego, do
desamor que faz com que o homem se volte contra seu irmão e, por consequência,
se afasta do Reino de Deus...
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