SAGRADA FAMÍLIA – JOSÉ, MARIA E
JESUS
“OLHA QUE TEU PAI E EU ESTÁVAMOS,
ANGUSTIADOS, À TUA PROCURA”.
(Lc 2,48)
Diácono
Milton Restivo
·
“A origem de Jesus Cristo foi assim: Maria, sua
mãe, comprometida em casamento com José, antes de coabitarem, achou-se grávida
pelo Espírito Santo.” (Mt 1,18).
Maria era noiva de José. Mas,
quem era José?
Mateus, em seu
Evangelho , 1,16, diz que José era filho de Jacó, enquanto que
Lucas em seus escritos, 3,23, diz que o pai de José se chamava Eli, mas ambos
os Evangelistas são unânimes em afirmar que José era descendente do rei Davi (Lc
3,23-31; Mt 1,20).
Segundo o Evangelista Mateus, José tinha como profissão ser
carpinteiro, quando se referiu a Jesus Cristo:
·
“Não é ele o filho do carpinteiro?” (Mt 13,55).
Marcos também se referencia a Jesus dessa maneira:
·
“Não é este o carpinteiro, o filho de
Maria...?” (Mc 6,3).
Segundo a tradição, a noiva, na época, firmava compromisso com o noivo,
dos doze aos quinze anos de idade, e o jovem varão, dos dezoito aos vinte anos
de idade.
O casamento acontecia quando os jovens se comprometiam e ficavam
noivos, isto é, casavam-se, mas não coabitavam, não iam morar juntos, como
acontece nos nossos dias; o rapaz ia montar a sua casa e depois de ter tudo
pronto, casa, móveis e tudo o mais que fosse necessário para uma vida a dois, é
que o noivo ia na casa dos pais da noiva buscá-la para coabitarem. Justifica-se,
então, a afirmativa do Evangelista Mateus:
·
“... Maria, sua mãe, comprometida em casamento
com José, antes de coabitarem, achou-se grávida do Espírito Santo.” (Mt 1,18).
Está claro, principalmente pelas dúvidas que habitaram a cabeça de José
quando notou Maria grávida, que eles não tiveram contatos íntimos.
Para entendermos melhor os problemas pelos quais passaram José e Maria
por ocasião da visita do Anjo, faz-se necessário que estudemos e meditemos
muito sobre a Anunciação do Anjo em si e sobre a entrega total de Maria nas
mãos de seu Deus e Senhor. Maria aceitou ser a mãe do Filho de Deus:
·
“Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim
segundo a tua palavra.” (Lc 1,37).
Mas, vamos ver se entendemos bem a situação de Maria nessa
oportunidade.
Maria era uma adolescente, jovem, virgem, solteira, entre doze e quinze
anos de idade, comprometida em casamento com um jovem entre dezoito e vinte
anos de idade chamado José, “homem justo”
conforme atesta Mateus, (Mt 1,19), descendente do rei Davi (Lc 3,23-31; Mt 1,2).
Maria tinha uma vida normal de uma moça normal de sua idade na sua
época. Com certeza, diferente apenas na oração e na entrega total nas mãos de
Deus e, como todo o povo, pedia a Yahweh pela vinda do Messias prometido.
O povo esperava o Messias. Todo o povo judeu sabia, pelas Sagradas
Escrituras, que o Messias nasceria de uma virgem, conforme já profetizara o
profeta Isaias:
·
“... uma virgem conceberá e dará à luz um filho e o seu nome será Emanuel.” (Is 7,14).
Bem por isso todas as moças da época sonhavam em ser a escolhida por
Deus para ser a mãe do Messias tão cantado e esperado pelo povo judeu, mas não
sabiam quando e como isso ia acontecer. Nem Maria sabia porque quando o Anjo do
Senhor lhe anunciou essa boa nova, Maria não duvidou, mas não entendeu como
isso poderia acontecer, pois que disse:
·
“Como é que vai ser isso, se eu não conheço
homem algum?” (Lc 1,34).
Maria já estava comprometida em casamento com José, mas ainda não
haviam coabitado, e pela afirmativa de Maria, ela e José não usaram legitimamente de todos os
direitos do matrimônio. E o Anjo lhe respondeu:
·
“O Espírito Santo virá sobre ti e o poder do
Altíssimo vai te cobrir com a sua sombra; por isso o Santo que nascer será
chamado Filho de Deus.” (Lc 1,35).
E para que nenhuma dúvida pairasse no ar, o Anjo continua:
·
“Para
Deus, com efeito, nada é impossível.” (Lc 1,37).
Maria, simplesmente, mesmo sem
entender como isso poderia acontecer, confia plenamente na palavra do Senhor,
entrega-se totalmente em suas mãos e responde ao Anjo:
·
“Eis
aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.” (Lc 1,38).
A partir daquele momento Maria “achou-se grávida pelo Espírito Santo” (Mt
1,18) e começa a trazer dentro de si, no seu ventre, o Filho de Deus, nascido
de mulher, sem a participação de homem algum:
·
“O Verbo se fez carne e habitou entre nós.” (Jo 1,14).
De repente, sem uma explicação razoável aos olhos do povo e ao coração
do jovem noivo José, aquela jovenzinha meiga, pura e casta, aparece grávida.
Poderíamos imaginar a repercussão desse fato numa cidade tão pequena:
as comadres, as fofocas... Uma moça jovem, solteira, de boa reputação, de
família exemplar, bem quista, noiva de um excelente e querido jovem de todos na
cidade, de repente... aparece grávida...
Ainda tem mais uma agravante. Logo depois da visita do Anjo, ao tomar
conhecimento que sua parenta Isabel, mulher de idade avançada, estava no sexto
mês de sua gravidez:
·
“... Maria pôs-se a caminho para a região
montanhosa, dirigindo-se apressadamente a uma cidade de Judá.” (Lc 1,39).
Ao saber das dificuldades que sua parenta Isabel, mulher já de idade avançada
teria, principalmente no final de sua gravidez, Maria não pensou em si e muito
menos no seu estado também de gravidez, e
“se pôs a caminho para a região montanhosa” onde morava Isabel, e segundo as Escrituras, Maria ficou na casa
de Isabel até o nascimento do filho de Isabel, isto é, pelo espaço de três
meses, considerando que o Anjo lhe dissera que:
·
“Isabel, tua parenta, concebeu um filho na
velhice, e este é o sexto mês...” (Lc 1,36).
Após o nascimento do filho de Isabel, João Batista, Maria retornou para
a sua pequena cidade. Maria havia saído
de sua cidade sem nenhum enfoque de gravidez.
Ao retornar para a sua cidade, quatro meses depois, considerando os
três meses que ficara com Isabel e, possivelmente um mês que gastou na viagem,
porque era longa, a gravidez de Maria já se fazia notar. A transformação da
gravidez, com certeza, era patente no seu corpo. José não sabia de nada e, com
certeza, se surpreendeu com aquilo.
O povo da localidade sabia menos ainda.
Maria deixou sua cidade e ficou ausente por aproximadamente quatro
meses e, quando dali saiu, estava no seu estado aparentemente normal, e quando volta,
acusa sinais de gravidez.
O que deve ter passado na cabeça de cada um de seus conhecidos e do
povo em geral daquela curritela? De quem
seria o filho? De José? Mas era público
e notório que José não havia acompanhado Maria enquanto ela esteve por aquele
tempo na casa de Isabel.
Imaginem os mexericos das comadres, das fofoqueiras nos portões, nas
esquinas, por sobre os muros e cercas; como devem ter falado de Maria... Maria
permanecia do mais profundo dos silêncios. Se Deus a colocara naquela situação,
Deus cuidaria dela.
E José? O que teria passado pela cabeça de José? Maria, a sua Maria, a
jovenzinha de seus sonhos a quem ele depositara toda a sua confiança, todo o
seu amor, todo o seu futuro, de repente, sem uma explicação razoável e sem que ela
se explique, aparece grávida.
Ele não tivera participação nisso. Não fora ele. Ele era inocente.
Se tivesse sido ele, com certeza, pelo seu caráter e retidão e temor a
Deus, assumiria o seu gesto e, sem sobra de dúvida, levaria Maria de imediato
para a sua casa, pois eles já estavam comprometidos em matrimônio. Mas
não fora ele!
Maria permanecia no mais profundo dos silêncios...
José era um jovem justo e temente a Deus, e, bem por isso, gostava das
coisas certas.
Maria não disse nada a José. José
não perguntou nada a Maria.
E a lei do povo judeu era severa, extremamente severa e determinava:
·
“Se uma jovem virgem, prometida a um homem, e
um homem a encontra na cidade e se deita com ela, trareis ambos à porta da
cidade e os apedrejareis até que morram; a jovem por não ter gritado por
socorro na cidade, e o homem por ter abusado da mulher do próximo...” (Dt 22,23-24).
Se José denunciasse Maria por, supostamente, havê-lo traído, fatalmente
a lei seria cumprida... José amava por demais Maria para chegar a esse
extremo. Mas também não podia aceitar
aquela situação.
E Maria não se explicava, não dizia nada. Maria permanecia no seu
silêncio.
Maria, simplesmente, poderia sair gritando aos quatro ventos, dizendo
que aquilo que estava acontecendo com ela era obra do Espírito Santo.
Poderia dizer, sem mentir, que:
·
“... o Espírito Santo veio sobre ela e o
poder do Altíssimo a cobriu com sua sombra.” (Lc 1,35),
Pela narrativas acima, Maria engravidara, e o filho que trazia dentro
de si era o Messias esperado, era o Filho de Deus que se fazia homem para que
todos os homens se tornassem filhos de Deus.
Mas, se afirmasse isso, pelo menos três coisas poderiam acontecer: primeira:
- o povo poderia dizer que ela estava louca por afirmar coisas tão absurdas
para tentar justificar a sua gravidez; segunda:- o povo não acreditaria e ela
própria passaria por ré confessa, e a lei de Moisés deveria ser cumprida, e
Maria deveria ser apedrejada na porta da cidade para que o pecado fosse tirado
do meio do povo, e, terceira:- o povo que já estava ansioso pela vinda do
Messias poderia até acreditar em Maria, aceitar que, realmente, ela estaria
dizendo a verdade e tratá-la como uma rainha. Maria não fez nada disso.
Maria manteve-se no seu silêncio.
Foi o silêncio da virgem.
Quantas vezes, no seu silêncio, Maria teria rezado:
·
“Só em Deus, ó minha alma repouse, porque
dele vem a minha esperança. Só ele é minha rocha e salvação, a minha fortaleza:
jamais serei abalada.” (Sl
62,6-7).
Maria não tentou explicar nada a ninguém. Nem mesmo ao seu noivo José.
O que estava acontecendo nela e com ela era obra do Senhor, e, se o
Senhor a colocara naquela situação, o Senhor resolveria todos os problemas que estavam
surgindo e surgiram após.
Maria sofria com as fofocas do povo. Maria sofria com a incompreensão
de José, com o sofrimento de José, mas se mantinha no mais profundo silêncio,
sempre confiando no Senhor.
O que estava acontecendo com Maria era a vontade do Senhor, e Maria
repetia a cada instante:
·
“Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim
segundo a tua palavra.” (Lc 1,38).
Maria era a escrava do Senhor, não competia a ela se defender. O Senhor
seria “a sua rocha, a sua salvação, a sua
fortaleza” (Sl 62,3) o seu
rochedo, o seu advogado e agiria na hora em que ele achasse que fosse mais
certa.
E José estava amargurado. Não entendia o que estava acontecendo e nem
poderia entender. Mas, porque Maria não rompia seu silêncio e explicava tudo
para ele?
Então, no auge das incertezas e sofrimentos, José tomou uma decisão:
·
“José, seu esposo, sendo justo, e não
querendo denunciá-la publicamente, resolveu repudiá-la em segredo.” (Mt 1,19).
José tomou a decisão que julgou a mais acertada: abandonar Maria, ir
embora, sumir da cidade, ir para um lugar distante mesmo levando em suas costas
que o povo o julgasse dizendo-o culpado por ter “aprontado” com Maria e fugido
para não assumir a sua responsabilidade, abandonando a sua noiva grávida. Foi o
que lhe pareceu mais justo e certo.
Assim ele não denunciaria Maria e não a entregaria ao terrível
cumprimento da lei. Assim ele não difamaria sua noiva. Faria isso para não
dizer a todos que Maria o havia traído, traído sua confiança, o seu amor e por
isso mesmo ele não poderia mais assumir a responsabilidade de coabitar com ela,
assumí-la em sua casa.
Mesmo sabendo da intenção de José, Maria, ainda assim, se manteve
calada, no silêncio que só o Senhor ouve, só o Senhor entende. Maria não deixou
de confiar no seu Senhor um minuto sequer, porque:
·
“só em Deus a sua alma repousava, e dele
viria a sua salvação.” (Sl 62,2).
E o Senhor nosso Deus não abandonou Maria.
E o Senhor nosso Deus também não abandonou José que, na sua dor, deve
ter rezado:
·
“Yahweh, ouve a minha prece, que o meu grito
chegue a ti! Na escondas tua face de mim, no dia da minha angústia. Inclina teu
ouvido para mim, e no dia em que eu te invoco, responde-me depressa”. (Sl 102,2-3).
E o Senhor respondeu e, certa noite:
·
“Enquanto (José) decidia, eis que um Anjo do
Senhor manifestou-se a ele em sonho, dizendo: ‘José, filho de Davi, não temas
receber Maria, tua mulher, pois o que nela foi gerado vem do Espírito Santo.
Ela dará à luz um filho e tu o chamarás com o nome de Jesus, pois ele salvará o
povo de seus pecados’. Tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que o Senhor
havia dito pelo Profeta: ‘Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho e o
chamarão com o nome de Emanuel, que significa, ‘Deus conosco’.” (Mt 1,20-23).
A partir dai José se tranquilizou; não foi discutir com Maria dizendo
que ela deveria ter acreditado e ter tido confiança nele e ter-lhe dito tudo
sobre o que estava acontecendo.
Não fez nada disso, respeitando o silêncio da virgem e:
·
“... agiu conforme o Anjo do Senhor lhe
ordenara e recebeu em casa sua mulher.” (Mt 1,24).
A partir daí José tomou sob sua guarda a mãe e o Filho que, pela
revelação do Anjo em seu sonho passou, a saber, que aquela criança que nasceria
de Maria não era outra senão o Messias, o Salvador dos homens.
Maria, por sua vez, também não foi tirar satisfações com José por não
ter acreditado nela apesar de tudo, e por José ter-se trancado dentro de si
próprio.
Maria não tirou satisfações com José por ele ter pensado em abandoná-la
desconhecendo que tudo aquilo que estava acontecendo com ela era obra do
Espírito Santo; não brigou com José por ele ter duvidado de sua integridade
moral.
Maria deixou tudo nas mãos de Deus, nas mãos do seu Senhor. Se fora o
Senhor que a colocara naquela situação, com certeza, o Senhor esclareceria
tudo, como esclareceu, não ao povo, mas, somente a José, e era isso que
realmente interessava. Maria permanecia sempre no seu silêncio, procurando
cumprir aquilo mesmo que ela dissera ao Anjo:
·
“Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim
segundo a tua palavra.” (Lc 1, 38).
E isso não era o fim; era apenas o começo, o começo de muitas dores,
muitas lágrimas, muito sofrimento, muitas incompreensões, muitas perseguições,
muito falatório. A partir da aceitação de Maria sua vida se transformou num
constante caminhar rumo ao Calvário.
O Calvário de Maria começou quando ela disse o seu “SIM” ao Anjo do Senhor...
E, interessante, os Santos Evangelhos não citam nenhuma fala de José,
nenhuma palavra que José tenha pronunciado é citada no Livro Sagrado. Isso não
se fez necessário para atestar a integridade de José. Para se mostrar temente a
Deus vale muito mais atitudes que palavras.
A figura de José aparece somente na infância de Jesus e desaparece
durante a vida oculta.
Nesse período José falecera.
Quando Jesus começa a sua vida pública só Maria o acompanha. José já
havia cumprido a sua parte nos planos de Salvação do Senhor Nosso Deus e
partido para a casa do Pai...
A sua morte deve ter sido a mais santa possível. Imaginemos na
cabeceira de seu leito, José moribundo, tendo, de um lado, Jesus e do outro,
Maria.
Poderá existir morte mais santa que essa?
Por que Deus Pai incluiu José no seu Plano de Salvação?
Porque ele queria para o seu Filho uma família constituída.
Já que o Senhor dispensou o concurso do homem para gerar o seu Filho,
poderia ele mesmo, o Senhor, cuidar de Maria e de Jesus. Mas o Senhor quis, com
isso, valorizar e divinizar a constituição familiar onde a união de pai, mãe e
filhos, união abençoada por Deus, perfeita e cristã, é o caminho mais curto
para se chegar à casa do Pai.
José não foi uma figura descartável nos planos de Deus e muito menos um
anônimo; foi ele quem cuidou de Maria e Jesus até que Jesus amadurecesse como
homem e tivesse condições de cuidar de si e de sua mãe e depois, iniciar a sua
missão.
José foi o chefe da família de Nazaré, o pai da Sagrada Família.
José é o exemplo mais perfeito para ser seguido por todos os pais
cristãos.
José é o exemplo mais perfeito para ser seguido por todos os chefes de
família.
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