XV DOMINGO DO
TEMPO COMUM
“A SEMENTE QUE
CAIU EM BOA TERRA
É AQUELE QUE OUVE A PALAVRA E A COMPREENDE. ESTE PRODUZ FRUTO.” (Mt 13,23)
Diácono
Milton Restivo
O Evangelho de Mateus
mostra, a partir da parábola do semeador, a segunda parte do ministério de
Jesus.
Na primeira
parte Jesus se apresentou ao povo como o Messias e, no sermão da montanha, que
abrange os capítulos de 5 a
7 de Mateus, faz uma comparação da Lei de Moisés com aquilo que o Messias
esperava de seus seguidores, onde Jesus repete por várias vezes, após citar uma
determinação da Lei de Moisés: “Vocês ouviram o que foi dito aos antigos...
eu, porém, lhes digo...” (Mt 5,21.27.33.38.43). Depois Jesus escolhe os doze
apóstolos (Mt 10, 1-5), enviando-os para anunciar a todos os judeus que “O
Reino do Céu está próximo”. (Mt 10,5-15).
No capítulo 13
do Evangelho de Mateus Jesus dá início ao chamado discurso das parábolas do
mistério e, somente neste capítulo Jesus conta sete parábolas, tendo explicado
algumas.
As parábolas
contadas por Jesus neste capítulo são: do semeador (Mt 13,4-23); do trigo e do
joio (Mt 13,24-30); do grão de mostarda (Mt 13,31-32); do fermento (Mt 13,33-35);
do tesouro escondido (Mt 13,44); das pérolas (Mt 13,45-46) e da rede (Mt
13,47-50).
Neste domingo o
Evangelho apresentado é o da parábola do semeador; nos domingos subsequentes
serão apresentadas as demais parábolas constantes deste capítulo.
No discurso do
Sermão da Montanha, constante dos capítulos de 5 a 7 de Mateus, Jesus olhou
para o passado, para a Lei de Moisés e, nesta segunda parte do seu ministério,
começando com as parábolas, Jesus olha para o futuro e define o Reino de Deus que
deve ser vivido por todos aqueles que aderirem à sua mensagem e aos que optarem
a colocar a mão no arado e não olhar para trás (cf Lc 9,62).
Mateus dá inicio
ao capítulo 13 dizendo: “Naquele dia, Jesus saiu de casa, e foi sentar-se às
margens do mar da Galiléia”. (Mt 13,1).
Como entender essa
atitude de Jesus? Até então Jesus havia relutado para fazer com que as
autoridades do povo, os líderes religiosos do judaísmo e o povo em geral,
entendessem a sua missão e assimilassem a sua mensagem, mas não obteve êxito
porque: “Logo depois, os fariseus saíram e fizeram um plano para matar
Jesus.” (Mt 12,14). A seguir Jesus anuncia uma nova geração, um novo povo: “...
todo aquele que faz a vontade do meu Pai que está no céu, esse é meu irmão,
minha irmã e minha mãe.” (Mt 12,50).
O capítulo 13
de Mateus começa com Jesus saindo de casa e indo sentar-se às margens do mar da
Galiléia. Mateus é muito perspicaz, e se for analisado isso com os olhos da fé
e à luz da teologia, pode-se entender que a casa que Jesus saiu seria Israel e
o mar que se descortinava à sua frente, seria toda a humanidade.
A partir daí
Jesus deixa de tratar especifica e diretamente com Israel, mas se volta para
toda a humanidade. E Mateus continua: “Por isso, Jesus entrou numa barca e sentou-se,
enquanto a multidão ficava de pé na praia.” (Mt 13,2).
Por várias
vezes os Evangelhos narram Jesus ensinando de uma barca (Mc 3,9; 4,1; Lc 5,3)
incluindo esta citação de Mateus. Pedro era pescador e, costumeiramente, é dito
que a barca de onde Jesus ensinava era a de Pedro, criando assim a imagem da
Igreja como sendo a barca de Pedro de onde Jesus ensina.
A parábola era
um método muito comum entre os rabinos palestinos, porque era de fácil
compreensão para o povo em
geral. As parábolas têm também algo enigmático, que exige uma
explicação mais detalhada, o que Jesus muitas vezes fazia em particular para
seus discípulos, como foi o caso desta parábola do semeador.
E Jesus começa
a ensinar por parábolas.
Muitas vezes, para se fazer entender quando
transmitia sua mensagem, Jesus lançava mão de ilustrações tiradas da natureza,
como, por exemplo, a parábola do semeador que meditamos hoje e que consta, além
de Mateus, também nos Evangelhos de Marcos 4,1-9 e de Lucas 8,4-15.
Jesus lançava mão dos costumes domésticos e
da vida diária como, por exemplo, a parábola do fermento em Mateus 13,33; a
parábola da lâmpada em Marcos 4,3-9; de acontecimentos contrários que acabavam
trazendo alegria, como as parábolas da ovelha desgarrada e da moeda perdida em
Lucas 15,3-10; eventos da história recente como a parábola do rei que distribuiu
moedas para seus empregados e os cobrou depois para ver que destino haviam dado
a elas, em Lucas 19,11-28; das lições da vida doméstica, como a parábola do
filho pródigo em Lucas 15,11-32; costumes e tradições, como a parábola das dez
virgens em Mateus 25,1-13 e do casamento do filho do rei em Mateus 22,1-14; de
profissões como pastor em João 10,11-14, do agricultor em João 15,1; e até de
jogos infantis, como em Lucas 7,31-32. Muitos mais exemplos poderiam ser aqui
citados.
As parábolas de
Jesus estão sempre fora da compreensão dos fariseus por causa de sua
hostilidade, e do povo, por causa de sua incredulidade.
Os discípulos
perguntaram porque Jesus falava ao povo assim, em parábolas, ao invés de falar
às claras. Jesus respondeu, dizendo que havia duas espécies de ouvintes: os
discípulos a quem foi dado o conhecimento dos mistérios do Reino dos Céus, e o
povo e dos fariseus a quem esse conhecimento foi omitido por causa de sua
hostilidade e incredulidade: “os
discípulos aproximaram-se, e perguntaram a Jesus: ‘Porque usas parábolas para
falar com eles’? Jesus respondeu: ‘Porque a vocês foi dado conhecer os
mistérios do Reino do Céu, mas a eles não. Pois a quem tem será dado ainda
mais, será dado em abundância; mas daquele que não tem, será tirado até o pouco
que tem.” (Mt 13,10-12).
Costumeiramente rotula-se este domingo como
o domingo do Semeador, ou da parábola do Semeador.
A parábola do Semeador contém três elementos
fundamentais: o semeador, a semente e o terreno. O Semeador e a semente são constantes.
O Semeador é habilidoso e espalha a semente por igual qualquer que seja o tipo
de terreno. A semente é, indiscutivelmente, boa; muitos terrenos nem tanto. Mas
o trabalho hábil do semeador e a capacidade de germinação da semente dependem,
para seu sucesso, da natureza do solo, e aqui é focalizada a parábola.
A que se referia Jesus no tocante a esses
três elementos?
O semeador seria o Pai: “Eu sou a
verdadeira videira, e meu Pai é o agricultor.” (Jo 15,1).
A semente é a Palavra, não palavra com inicial
minúscula, mas a Palavra por excelência: “No começo a Palavra já existia: a
Palavra estava voltada para Deus, e a Palavra era Deus. No começo ela estava
voltada para Deus. Tudo foi feito por meio dela, e, de tudo o que existe, nada
foi feito sem ela. Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens.” (Jo
1,1-4).
A semente, portanto, é a Palavra, e Jesus é “a
Palavra que se fez homem e veio habitar entre nós” (Jo 1,14). Claro que o
semeador é elemento fundamental no plantio porque, sem ele, a semente não seria
lançada na terra e não encontraria lugar e espaço para germinar. Mas, mais do
que ater-se na pessoa do semeador, Jesus é repetitivo quando fala da semente e
cuidadoso sobre o terreno onde esta semente se aloja.
Jesus coloca-se a si mesmo como a semente,
considerando que a Semente é a Palavra que o semeador, Deus Pai, espalha sobre
a terra.
Nem todos os textos são fiéis quanto a esses
versículos, pois o certo seria escrever "palavra" com "P"
maiúsculo como foi escrito nos originais da narrativa da parábola do semeador
nos Evangelhos de Mateus e Lucas. E Lucas é taxativo e específico, quando diz: “A parábola quer dizer o seguinte: a semente é
a Palavra de Deus.” (Lc 8,11).
E a Palavra de Deus é Jesus: “a
Palavra que se fez homem e veio habitar entre nós” (Jo 1,14).
Esta semente é comunicada de várias maneiras
através da pregação das Escrituras.
A Palavra traz vida, consolo, alívio e
orientação ao que a recebe.
A Palavra é uma semente com vida, poder e
penetrante em si mesma: “A Palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante
do que qualquer espada de dois gumes; ela penetra até o ponto onde a alma e o
espírito se encontram e até onde as juntas e medulas se tocam; ela sonda os
sentimentos e pensamentos mais íntimos.” (Hb 4,12).
A parábola do semeador realça vivamente, por
um lado, a qualidade daqueles que receberam a Palavra e, por outro lado, as
características que deverá reunir o que semeia a preciosa semente que é a
Palavra.
Conforme disse Isaias na primeira leitura,
essa semente é a Palavra que saiu da boca de Deus e que foi enviada do
céu e “assim como a chuva e a
neve descem do céu e para lá não voltam mais, mas vêm irrigar e fecundar a
terra, e fazê-la germinar e dar semente, para o plantio e para a alimentação,
assim a Palavra que sair de minha boca: não voltará para mim vazia; antes,
realizará tudo que for de minha vontade e produzirá os efeitos que pretendi, ao
enviá-la” (Is 55,10-11).
É importante que se note o papel do semeador.
Sem o semeador a semente não será lançada.
Em primeira instância, como já foi dito, o semeador
é o Pai, “pois Deus (o
semeador) amou de tal forma o mundo, que entregou seu Filho único (a
Palavra – a semente) para que todo o que nele acredita não morra, mas tenha
a vida eterna. De fato, Deus enviou o seu Filho (a Palavra – a semente) ao
mundo (o terreno), não para
condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por meio dele.” (Jo
3,16-17).
Depois de ter recebido a Palavra - a semente -
do semeador que é Deus Pai, cada cristão é convocado, vocacionado por Deus como
instrumento para a propagação do Seu Reino, da sua Palavra. Mas o cristão só
pode ser efetivamente semeador da Palavra quando se rende totalmente à vontade
do Pai.
Todos os cristãos devem ser semeadores das
boas novas de Jesus, da Palavra, que é Jesus.
O Evangelho é a semente que produz vida. A
terra onde estas sementes devem ser plantadas é cada pessoa com a qual o
cristão convive. Isso deve ser feito com fé, pois ao lançar a semente, quem a
lançou perde o controle sobre ela e, finalmente, deve esperar com paciência e
oração até que a semente frutifique no coração das pessoas.
Verifica-se que na parábola Jesus não diz nada
sobre a aparência do semeador, ou de sua capacidade, personalidade, reações ou realizações.
O semeador simplesmente põe a semente em contato com o solo. É o ministério do
cristão: semear com persistência.
A ação do cristão deve ser em todo o tempo e
sem desanimar, conforme diz o livro do Eclesiastes: “Quem fica olhando o
vento nunca semeia; quem fica olhando as nuvens, jamais colherá. Assim como
você ignora o caminho por onde o sopro da vida entra nos ossos dentro do ventre
da mulher grávida, assim também você ignora a obra de Deus, que fez todas as
coisas. De manhã, semeie a sua semente, e de tarde não dê descanso à sua mão,
porque você não sabe qual das sementes irá brotar, se esta ou aquela, ou se as
duas serão boas.” (Ecl 11,4-6).
Jesus também disse que nem sempre o que semeia
colhe, mas “um semeia e o outro colhe” (Jo 4,37) e antecipa “aquele
que semeia, se alegra junto com aquele que colhe.” (Jo 4,36b).
O que semeia tem a promessa de que haverá
frutos, mesmo que outro os colha: “Aquele que colhe, recebe desde já o
salário, e recolhe fruto para a vida eterna.” (Jo 4,36a).
Paulo Apóstolo, como semeador da Palavra,
tinha consciência disso, e afirma: “Eu plantei, Apolo regou, mas era Deus
que fazia crescer. Assim, aquele que planta não é nada, e aquele que rega também
não é nada: só Deus é que conta, pois é ele quem faz crescer. Aquele que planta
e aquele que rega são iguais; e cada um vai receber o seu próprio salário,
segundo a medida do seu trabalho.” (1Cor 3,6-8).
Uma das grandes virtudes do semeador é a
paciência, porque toda plantação requer paciência e perseverança de quem a
executa, conforme diz Tiago na sua carta: “Olhem o agricultor: ele espera
pacientemente o fruto precioso da terra, até receber a chuva do outono e da
primavera. Sejam pacientes vocês também; fortaleçam os corações, pois a vinda
do Senhor está próxima.” (Tg 5,7b-8).
Numa semeadura há a parte humana que lança a
semente e a parte divina que faz a semente germinar e florescer. A parte
humana, quando bem feita, não frustra a parte divina. Quando a parte humana
falha, perde a oportunidade para sempre. Perde-a por negligência, por abuso ou
mau uso. O atleta que não se exercita, perderá a força e o poder dos músculos.
Se os dons de Deus não forem usados, vão perder-se, porque: “Quem sabe fazer
o bem e não o faz, comete pecado.” (Tg 4,17).
Ao terminar a parábola, “os discípulos
aproximaram-se, e perguntaram a Jesus: ‘Porque usas parábolas para falar com
eles’? Jesus respondeu: ‘Porque a vocês foi dado conhecer os mistérios do Reino
do Céu, mas a eles não. Pois a quem tem será dado ainda mais, será dado em
abundância; mas daquele que não tem, será tirado até o pouco que tem.” (Mt
13,10-12).
E Jesus aproveita para explicar com detalhes a
parábola contada.
O Semeador é o Pai; Jesus é a semente, e a
semente é a Palavra: “A parábola quer dizer o seguinte: a semente é a
Palavra de Deus.” (Lc 8,11). E a Palavra de Deus é Jesus: “a Palavra que se fez homem e veio habitar
entre nós” (Jo 1,14).
Na parábola foram colocados quatro tipo de
terrenos: beira do caminho onde todos passam, terreno pedregoso impróprio para
o plantio, meio dos espinhos onde as sementes são sufocadas e terra boa onde a
semente germina e dá bons e abundantes frutos. Qualquer explicação além daquela
que o próprio Jesus deu seria uma repetição daquilo que já se tem conhecimento.
Aquele que não entende porque não quer
compreender, seria o terreno à beira do caminho: “vem o Maligno e rouba o
que foi semeado no coração dele.” (Mt 13,19).
Aquele que gosta da mensagem, mas não a leva
a sério, seria o terreno pedregoso: “é aquele que ouve a Palavra, e logo a
recebe com alegria. Mas ele não tem raiz em si mesmo, é inconstante: quando
chega uma tribulação ou perseguição por causa da Palavra, ele desiste logo.” (Mt
13,21-22).
Aquele que dá maior valor ao mundo, ao ganho
e às riquezas, é o terreno cheio de espinhos: “é aquele que houve a Palavra,
mas a preocupação do mundo e a ilusão da riqueza sufocam a Palavra, e ela fica
sem dar frutos.” (Mt 13,22).
Agora, aquele que entende a mensagem, a
obedece e a vive, é a terra boa: “é aquele que houve a Palavra e a
compreende. Esse, com certeza, produz fruto. Um dá cem, outro sessenta, e outro
trinta por um.” (Mt 13, 23).
E Jesus termina a parábola dizendo: “Quem
tem ouvidos, ouça.” (Mt 13,9).
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