sábado, 17 de novembro de 2012

"O CÉU E A TERRA PASSARÃO, MAS AS MINHAS PALAVRAS NÃO PASSARÃO”.

XXXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM
Ano – B; Cor – Verde; – Leituras: Dn 12,1-3; Sl 15; Hb 10,11-14.18 – Mc 13,24-32.

"O CÉU E A TERRA PASSARÃO, MAS AS MINHAS PALAVRAS NÃO PASSARÃO”.
Mc 13, 24-32
Diácono Milton Restivo
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A primeira leitura de liturgia deste domingo traz o profeta Daniel evocado nas liturgias, de uma maneira especial quando o tema é escatologia, isto é, quando o assunto aborda o destino último do homem ou sobre o destino final do universo. Escatologia é a denominação teológica sob a qual se estudam as versões sobre o final dos tempos. O termo deriva do adjetivo grego (escaton = último, afastado, extremo). Finalmente, escatologia é a ciência das coisas dos últimos tempos.
A escatologia é um elemento importante no messianismo pregado por Jesus.
A liturgia dos dois últimos domingos do tempo comum vai abordar esse tema neste e, no próximo domingo, é focado o apocalipse de Daniel. O livro de Daniel leva a crer que ele, Daniel, nasceu na Judéia em torno do ano 622 aC. Era um jovem quando se tornou prisioneiro e foi deportado, com o povo, para a Babilônia no ano 605/6 aC. Esse era só o começo do cativeiro babilônico e da devastação da nação judaica. Babilônia estava localizada no Rio Eufrates, próxima à cidade atual de Bagdá no Iraque. Segundo a narrativa, Daniel estava entre os primeiros cativos levados de Jerusalém para a Babilônia e continuou lá durante o período de setenta anos, tempo em que os israelitas estiveram em cativeiro:“O país inteiro será entregue à destruição e desolação, e o povo ficará escravo do rei da Babilônia durante setenta anos. Depois de completados os setenta anos, eu castigarei o rei da Babilônia e seu povo...”. (Jr 25,11ss; Dn 1,1-21;10,1).
O rei de Babilônia, Nabucodonosor, atacou Jerusalém por três vezes. A primeira vez em 605 aC, quando aprisionou um seleto grupo de cativos que tinha profissões e conhecimentos especializados e rendosos, onde estavam Daniel e seus três amigos: Sidrac, Misac e Abdênago que, conforme consta em Daniel, capítulo 3, foram condenados a serem jogados na fornalha ardente de onde saíram ilesos e onde entoaram o chamado “canto dos três jovens” (Dn 3,51-90) que, infelizmente, esse canto, como alguns outros livros que constam da Bíblia católica, não faz parte da Bíblia dos nossos irmãos evangélicos e protestantes. Esse canto dos três jovens é costumeiramente recitado na Liturgia das Horas. Houve mais dois ataques de Nabucodonosor na Judéia (597 e 586 aC). Ao final do terceiro ataque, que resultou na invasão de Jerusalém, Nabucodonosor derrubou a cidade e destruiu por completo o Templo. Determinado a fazer com que nunca mais houvesse outra rebelião, destruiu Jerusalém e o Templo completamente.  Neste último ataque todos os habitantes foram levados como escravos para a Babilônia.
Daniel é mostrado como um homem de fé profunda e persistente, e foi abençoado por Deus por causa dessa fé; serviu como estadista, conselheiro e profeta de Deus junto aos reis da Babilônia e mais tarde aos reis dos medos e dos persas. Anunciou destemidamente aos reis ateus que Deus imperava nos reinos dos homens. O livro trata do conflito entre o reino de Deus e os reinos do mundo. Os capítulos de 7 a 12 de Daniel são essencialmente proféticos. Traçam um esboço do surgimento e queda dos grandes impérios mundiais, desde os dias de Daniel até o final da história humana. E, é claro, a ênfase principal é sobre o tempo do fim ou o fim dos tempos.
Daniel, durante o domínio romano, profetizou que haveria uma grande catástrofe: “será uma hora de grandes apertos, tais como jamais houve, desde que as nações começaram a existir, até o tempo atual. [...] Muitos que dormem no pó despertarão; uns para a vida eterna, outros para a vergonha e a infâmia eternas”. (Dn 12,1.2). Jesus confirmou esta profecia quando falou sobre a destruição de Jerusalém: Porque neste dia haverá uma tribulação como nunca houve, desde o início da criação feita por Deus, até agora; e nunca mais haverá outra igual”. (Mc 13,19; Mt 24,21). Jesus ligou a profecia que fizera da destruição de Jerusalém com a profecia de Daniel: “Quando vocês virem a abominação da desolação da qual falou o profeta Daniel, estabelecida no lugar onde não deveria estar...”. (Mt 24,15; Lc 21,20-22). Os muitos profetas do Antigo Testamento profetizaram, cada um a seu modo, a escatologia, e já haviam transmitido ao povo os oráculos de Yahweh a respeito desses acontecimentos: “Acontecerá naquele dia - oráculo de Yahweh - que eu farei o sol declinar em pleno meio-dia e escurecerei a terra em um dia de luz.” (Am 8,9); “Eis o dia de Yahweh, que vem implacável, e com ele o furor ardente da ira, reduzindo a terra à desolação e extirpando dela os pecadores. Com efeito, as estrelas do céu e Orion não darão a sua luz. O sol se escurecerá ao nascer, e a lua não dará a sua claridade.” (Is 13,9-10); “Erguei ao céu os vossos olhos, olhai para a terra cá em baixo, porque os céus se desfarão como a fumaça, e a terra se desgastará como uma veste; os seus habitantes perecerão como mosquitos... (Is 51,6); “Porque eis que vem o dia, que queima como forno. Todos os arrogantes e todos aqueles que praticam a iniquidade serão como palha; o Dia que vem os queimará - disse Yahweh dos Exércitos - de modo que não lhes restará nem raiz nem ramo.” (Ml 3,19).
Em todo o capítulo 13 de Marcos nota-se um sermão de Jesus a respeito do fim. Todo esse capítulo se relaciona com a expectativa do fim. Em Marcos 13,24-27 vê-se um discurso profético e escatológico de Jesus. Em primeiro lugar Jesus fala de uma catástrofe cósmica. Em Marcos 13,30 o Reino se estabelecerá a qualquer momento. E, se voltarmos a Marcos 13,7-10 Jesus afirma que, depois de terríveis coisas que acontecerão, seus discípulos serão levados aos tribunais por causa do seu nome. Mas é necessário que o Evangelho seja pregado a todas as nações, e ai virá o fim.
A escatologia de Jesus se conhece pelo sermão arrolado nos capítulos 24 e 25 do Evangelho de Mateus. Mais resumidamente, o sermão escatológico de Jesus se repete em Marcos 13,1-37 e em Lucas 21,5-38. Nessas passagens Jesus descreve o fim dos tempos sobre um fundo que se parece com a destruição de Jerusalém; ao mesmo tempo se refere ao Messias, sem afirmar ser ele mesmo tal personagem, de sorte a desenrolar-se todo o contexto em linguagem enigmática: "Porque o Filho do Homem virá na glória do seu Pai, com os seus anjos, e então retribuirá a cada um de acordo com a própria conduta. Eu garanto a vocês: alguns daqueles que estão aqui morrerão sem terem visto o Filho do Homem vindo com o seu Reino." (Mt 16,27-28): "Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras diante dessa geração adúltera e pecadora, também o Filho do Homem se envergonhará dele, quando vier na glória de seu Pai com seus santos anjos". (Mc 8,38-39); "Se alguém se envergonhar de mim e de minhas palavras, o Filho do Homem também se envergonhará dele quando vier na sua glória, na glória do Pai e dos santos anjos. Eu garanto a vocês: alguns aqui presentes não morrerão sem ter visto o Reino de Deus". (Lc 9, 26-27). Este discurso de Jesus foi proferido no Monte das Oliveiras, na semana de sua morte. Está registrado nos Evangelhos Sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas): Mateus oferece mais detalhes nos capítulos 24 e 25; Marcos utiliza todo o capítulo 13 e Lucas o apresenta em versículos esparsos: 17,20-37 e 21,5-36.
Os textos nos apresentam diversas dificuldades de interpretação, pois estão saturados com conceitos apocalípticos, referências veladas a possíveis eventos históricos, e referências tiradas de escritos do tempo do Antigo Testamento. Porém, a sua mensagem central fica clara – o triunfo final do Filho do Homem, mandando por Deus para estabelecer o seu Reino.
A descrição da chegada do Filho do Homem, rodeado das nuvens, é tirada do livro de Daniel: “Em imagens noturnas, tive essa visão: entre as nuvens do céu vinha alguém como um filho do homem. Chegou até perto do Ancião e foi levado à sua presença. Foi-lhe dado poder, glória e reino, e todos os povos, nações e línguas o serviram. O seu poder é um poder eterno, que nunca lhe será tirado. E o seu reino é tal que jamais será destruído”. (Dn 7,13-14).
Jesus confirma o seu poder, glória e reino na sua despedida aos apóstolos: “Toda autoridade foi dada a mim no céu e sobre a terra”. (Mt 28,18); “Depois de dizer isso, Jesus foi levado ao céu à vista deles”. (At 1,9); “Ele foi exaltado à direita de Deus, recebeu do Pai o Espírito prometido e o derramou...”. (At 2,33); “Ele a manifestou em Cristo, quando o ressuscitou dos mortos e o fez sentar-se à sua direita no céu, muito acima de qualquer principado, autoridade, poder e soberania, e de qualquer outro nome que se possa nomear, não só no presente, mas também no futuro. De fato, Deus colocou tudo debaixo dos pés de Cristo e o colocou acima de todas as coisas, como Cabeça da Igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que plenifica tudo em todas as coisas”. (Ef 1,20-23). Este governo de Cristo continuará eternamente: “Durante este último reinado, o Deus do céu fará aparecer um reino que nunca será destruído. Será um reino que não passará para as mãos de outro povo, mas ao contrário, humilhará e liquidará todos os outros reinos, enquanto ele mesmo continuará firme para sempre”. (Dn 2,44); “Já que recebemos um reino inabalável, conservemos bem essa graça”. (Hb 12,28). Em todos os tempos chegou-se a predizer o tempo quando aconteceria essa segunda vinda do Senhor, sendo marcado o dia e até mesmo a hora, mas Jesus descarta essa possibilidade: “Quanto a esse dia e a essa hora, ninguém sabe nada, nem os anjos do céu, nem o Filho, somente o Pai é que sabe”. (Mt 24,36). Jesus adverte, apenas, que pode acontecer a qualquer momento: “Eis que eu venho em breve”. (Apo 22,7).
Pedro nos diz que a vinda do Senhor, pela segunda vez, será inesperada como vem o ladrão à noite: “O Dia do Senhor chegará como um ladrão, e então os céus se dissolverão com estrondo, os elementos se derreterão, devorados pelas chamas, e a terra desaparecerá com tudo o que nela se faz”. (2Pd 3,10). “Pois este dia cairá como armadilha, sobre todos aqueles que habitam a face de toda a terra”. (Lc 21,35). Jesus disse que viria “... sem demora, e comigo trago o salário para retribuir a cada um conforme o seu trabalho” (Apo 22,12), e, por isso, orienta que haja vigilância: “O que eu digo a vocês, digo a todos: fiquem vigiando”. (Mc 13,37).
A geração de Jesus realmente viveu esses momentos terríveis e essa experiência danosa quando da destruição do Templo e de Jerusalém no ano 70 pelos romanos, a ruína total da nação judaica, quando milhares de judeus foram massacrados e crucificados e outros tantos feitos prisioneiros e escravos: “Em verdade vos digo, essa geração não passará até que tudo isso aconteça”. (Mc 13,30).  Nessa oportunidade todos os que ficaram vivos e conseguiram fugir, se dispersaram pelo mundo todo, tendo perdido a terra, a nação, o Templo e, por não ter mais templo, deixaram de ter o local para os sacrifícios previstos na Lei de Moisés, perdendo, desta forma, também o sacerdócio. Assim dispersos foram submetidos, por parte do nazismo, à barbarização na Segunda Grande Guerra Mundial ao que hoje é conhecido como “Holocausto”, e à tentativa, do extermínio da face da terra de todos os judeus, matando-os, calculando-se que mais de seis milhões deles foram mortos entre 1.933 e 1.945.
Depois disso, somente no ano de 1.948, ao final dessa Grande Guerra, o Estado de Israel, como nação, começou a existir novamente, mas sem a sua capital, Jerusalém, que se tornou zona internacional e, bem por isso, sem o local onde estava construído o Templo, continuando assim sem os holocaustos oferecidos a Yahweh e, por extensão, sem o sacerdócio.
Na segunda parte do seu discurso escatológico Jesus conta a parábola da figueira. “Aprendam, pois, da figueira esta parábola: quando seus ramos ficam verdes e as folhas começam a brotar, vocês sabem que o verão está perto”. (Mt 13,28). O verão é o prenúncio de uma nova vida. A vida nova anunciada por Jesus é a aceitação de sua mensagem pelos outros povos, os gentios e pagãos, já que os judeus, o povo escolhido por Deus no Antigo Testamento, a rejeitou.
A fecundidade da mensagem de Jesus continuará existindo, mas não mais naquele povo cujas instituições não cumpriram a sua missão e estão destinadas a desaparecer: o Reino de Deus se transferirá para outros povos. O povo judeu não aceitou Jesus como Filho de Deus e, mais tarde, Paulo se vê obrigado a anunciar para os outros povos o que foi rejeitado pelos judeus: Era preciso anunciar a palavra de Deus, em primeiro lugar para vocês, que são judeus. Porém, como vocês a rejeitam, e não se julgam dignos da vida eterna, saibam que nós vamos dedicar-nos aos pagãos. Porque esta é a ordem que o Senhor nos deu: ‘Eu coloquei você como luz para as nações, para que leve a salvação até aos extremos da terra’”.   (At 13,46-47) e “Então o Senhor me disse: Vá! É para longe, é para os pagãos que eu vou enviar você”. (At 22,21).
A parábola da figueira é tomada da agricultura, que o povo judeu conhecia bem. O seguidor de Jesus é quem se torna aprendiz da figueira, antecipando os tempos com a vigilância.
O discípulo de Jesus é, pois, quem vigia e está pronto a qualquer momento.
A segunda parábola é do homem que partiu para o estrangeiro e deixou sua casa aos cuidados dos empregados. A imagem da casa nos faz, portanto, pensar no mundo inteiro como uma casa que Jesus (o dono da casa que foi para o estrangeiro) deixou aos nossos cuidados: “ele deixou a casa, distribuiu a tarefa a cada um dos empregados, e mandou o porteiro ficar vigiando”. (Mc 13,34). Nesta imensa casa, que é o mundo e que tem um dono que viajou e está prestes a voltar, há muitas funções, cada um tem a sua, mas todas elas voltadas para a vida e o funcionamento perfeito da casa em que todos vivem. Apesar das diferentes funções de comando (porteiro) ou não (empregados), todos têm em comum a vigilância: “Vigiem, portanto, porque vocês não sabem quando o dono da casa vai voltar; pode ser à tarde, à meia noite, de madrugada ou pelo amanhecer. Se ele vier de repente, não deve encontrá-los dormindo. O que eu digo a vocês, digo a todos: Fiquem vigiando”. (Mt 13,35-37).

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