TERCEIRO DOMINGO DA QUARESMA
"DESTRUAM
ESSE TEMPLO, E EM TRÊS DIAS O
LEVANTAREI." (Jo 2,19).
Diácono Milton Restivo
Na primeira leitura Moisés recebe de Yahweh o
decálogo, as dez palavras, os dez mandamentos para que o povo israelita
entendesse qual seria o coração da lei mosaica.
A Lei da Antiga Aliança vai manter o seu valor na nova
Aliança. Jesus lembra os mandamentos dados por Yahweh aos israelitas no deserto,
acrescentando a eles o selo da perfeição, os conselhos evangélicos, conforme
consta em Marcos 10,7-21.
Os mandamentos, também chamados de Aliança de Yahweh
com seu povo, determinam os princípios fundamentais da lei hebraica: “Ele (Yahweh)
lhes comunicou então a sua Aliança, para que vocês a cumprissem: as Dez
Palavras, que ele escreveu em duas tábuas de pedra.” (Dt 4,13).
O livro do Êxodo inicia a narrativa do decálogo
dizendo que os dez mandamentos foram transmitidos oralmente por Yahweh a
Moisés: “Então Deus pronunciou todas estas palavras...” (Ex 20,1). Já,
em outras partes desse mesmo livro, diz-se que Yahweh escreveu, com suas
próprias mãos, os dez mandamentos e os entregou a Moisés: “Yahweh disse a
Moisés: ‘Suba até junto de mim na montanha, pois eu estarei ai para lhe dar as
tábuas de pedra com a lei e os mandamentos que escrevi para você os instruir.” (Ex
24,12); “As tábuas eram obras de Deus, e a escritura era feita por Deus,
gravada nas tábuas.” (Ex 32,16); “Yahweh disse a Moisés: [...] e
eu escreverei as mesmas palavras que estavam nas primeiras tábuas que você
quebrou.” (Ex 34,1).
Depois de receber os mandamentos e outras orientações
e descer do monte, e ao ver que o povo havia se afastado de Deus, adorando um
bezerro de ouro (cf Ex 32,1-6), Moisés, num ímpeto de raiva quebrou as tábuas: “Quando
se aproximou do acampamento e viu o bezerro e as danças, Moisés ficou
enfurecido, jogou as tábuas e as quebrou no pé da montanha.” (Ex 32,19).
Yahweh, porém, determinou a Moisés que subisse
novamente à montanha para receber novas tábuas: “Yahweh disse a Moisés:
Corte duas tábuas de pedra, como as primeiras, suba ao meu encontro na
montanha, e eu escreverei as mesmas palavras que estavam nas primeiras tábuas
que você quebrou.” (Ex 34,1). Os dez mandamentos deveriam ser os conceitos
fundamentais da lei mosaica para o povo da Antiga Aliança, aperfeiçoados por
Jesus para o povo da Nova Aliança.
Os mandamentos dados por Yahweh a Moisés estão
repetidos na sua íntegra no livro do Deuteronômio 5,6-21 e são chamados,
também, de “Aliança” (cf Dt 4,13).
O objetivo dos mandamentos dados por Yahweh a Israel
era que esse povo tivesse uma vida de santidade e justiça. No livro do Levítico
19,1-2, “Yahweh falou a Moisés, dizendo:
fala a toda a comunidade dos filhos de Israel e dize-lhes: “Sejam santos,
porque eu, o Senhor de vocês, sou santo”.
Jesus resumiu os mandamentos da Antiga Aliança em
apenas dois mandamentos: amar a Deus acima de tudo, com todo o nosso coração,
alma, fé e entendimento, e ao nosso próximo como a nós mesmo: “Ame ao Senhor
seu Deus com todo o seu coração, com toda a sua alma, e com todo o seu
entendimento. Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a
esse: ame ao seu próximo como a si mesmo. Toda a Lei e os Profetas dependem
desses dois mandamentos.” (Mt 22,36-40).
Jesus resume os mandamentos da Antiga Aliança no
mandamento do amor: “Eu dou a vocês um mandamento novo: amem-se uns aos
outros. Assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros. Se vocês
tiverem amor uns para com os outros, todos reconhecerão que vocês são meus
discípulos.” (Jo 13,34-35). Este é o grande e o único mandamento da nova
Lei: o Amor. Amar em primeira instância a Deus, depois ao próximo.
Quem ama de verdade o próximo não mata, não rouba, não
comete violência, não levanta falsos testemunhos, não deseja nada do que é do
próximo, não comete adultério e não faz nada que possa prejudicar de qualquer
maneira o próximo. No novo mandamento do amor deixado por Jesus estão incluídos
todos os demais mandamentos.
No Salmo 18 Davi agradece a Yahweh por ter ouvido suas
orações e súplicas e manifesta seu amor e adoração a Yahweh: “Eu te amo,
Yahweh. Tu és a minha força.” (Sl 18,3).
Davi fala de sua felicidade e vitória na confiança em
Deus e expressa tudo aquilo que Yahweh representa em sua vida: “Yahweh, meu
rochedo, minha fortaleza, meu libertador; meu Deus, rocha minha, meu refúgio,
meu escudo, força que me salva, meu baluarte! Louvado seja! Eu invoquei Yahweh,
e fui salvo dos meus inimigos!” (Sl 18,3-4).
Neste salmo de adoração pública, o salmista louva a
Deus por livrá-lo de todos os seus inimigos: “Louvado seja! Eu invoquei
Yahweh, e fui salvo dos meus inimigos. [...] Livrou-me de um poderoso
inimigo, de adversários mais fortes do que eu.” (Sl 18,4.18).
Davi considera sua vitória uma recompensa de Deus ao
seu modo justo de viver: “Yahweh me tratou segundo minha justiça, e me
retribuiu conforme a pureza de minhas mãos, porque observei os caminhos de
Yahweh, e não me rebelei contra meu Deus. [...] Yahweh retribuiu a minha
justiça, a pureza de minhas mãos em sua presença.” (Sl 18,21-22.25).
Davi enaltece o caminho de Deus e atesta a veracidade
da Palavra de Yahweh: “O caminho de Deus é perfeito, a palavra de Yahweh é
comprovada, Ele é um escudo para os que nele se abrigam. Quem é Deus além de
Yahweh? E quem é rochedo, fora o nosso Deus? Ele é o Deus que me cinge de força,
e torna perfeito o meu caminho.” (Sl 18,31- 33).
Davi agradece e dá vivas a Yahweh por te-lo atendido
em suas orações: “Viva Yahweh! Bendito seja o meu rochedo! Exaltado seja o
meu Deus e salvador, o Deus que me concedeu as vinganças e submeteu a mim os
povos; que me livrou de inimigos furiosos, me exaltou sobre os meus agressores,
e me salvou do homem cruel. Por isso eu te louvo entre as nações, Yahweh, e toco
em honra de teu nome.” (Sl 18,47-50).
A oração é expressão de
confiança. Somente aqueles que confiam em Deus o invocam.
No Evangelho deste domingo “Estando
próxima a páscoa dos judeus, Jesus subiu a Jerusalém.” (Jo 2,13).
Chegando à cidade de Jerusalém Jesus sentiu
necessidade de recolhimento e oração e dirigiu-se ao Templo, aquele mesmo
majestoso Templo construído pelo rei Salomão e, depois, reconstruído pelo rei
Herodes, e que era o orgulho da nação judaica. Ao adentrar no Templo, que
decepção: Jesus “encontrou os vendedores
de bois, de ovelhas, de pombas e os cambistas sentados.” (Jo, 2, 14).
Jesus, cuidadoso com as coisas do Pai e, como não
poderia deixar de ser e mostrando plena coerência com aquilo que, quando aos
doze anos de idade, havia dito à sua mãe quando por ela foi encontrado no Templo
“... sentado no meio dos doutores,
ouvindo-os e interrogando-os” (Lc 2,46), tendo afirmado: “Porque me procuravam? Não sabia que eu devo estar na casa do meu Pai?”
(Lc, 2,49), ao ver aquela baderna no interior do Templo que mais parecia um
mercado persa ou mercado de peixe, ficou extremamente indignado e, sem pensar
duas vezes, “... fez um chicote de cordas, expulsou todos do Templo, com as
ovelhas e com os bois; lançou ao chão o dinheiro dos cambistas e derrubou as
mesas, e disse aos que vendiam pombas: Tirem tudo isso daqui; não façam da casa
de meu Pai uma casa de comércio.” (Jo 2,15-16).
O sangue de Jesus ferveu nas veias. Ele não podia suportar e permitir tão grande
desrespeito com o Templo, a casa do Senhor. Não titubeou: lançou mão de uma
corda, fazendo-a de chicote como fazem as mães que querem disciplinar seus
filhos por algo que tenham feito de errado, (pelo menos antigamente) e começou
a bater indistintamente em quem vendia ou comprava promovendo aquela baderna no
Templo expulsando-os a todos e, indignado, dizendo, como já havia dito
seiscentos anos antes o profeta Isaias: “A
minha casa será chamada casa de oração, mas vocês fizeram dela um covil de
ladrões.” (Mt 21,13; Is 56,6b).
Em seguida, Jesus compara o Templo de pedra com o seu
próprio corpo, fazendo uma alusão à sua morte e ressurreição ao terceiro dia
depois de os judeus terem-no interpelado sobre com que autoridade Jesus agira
daquela maneira, dizendo: “’Com que sinal
nos mostras tu que tens autoridade para fazer estas coisas?’ Jesus
respondeu-lhes e disse: ‘Destruí este templo e eu o reedificarei em três dias’.” (Jo 2,18-19).
Jesus se referia ao Templo de seu corpo que seria
entregue para a morte e ao terceiro dia seria reedificado pela ressurreição. Mas
os judeus não o entenderam, julgando que ele falava do Templo de pedra que
Herodes levara quarenta e seis anos para reconstruir e como Jesus o
reconstruiria, depois de destruído, em apenas três dias? “Replicaram,
pois, os judeus: ‘Este templo foi edificado em quarenta e seis anos, e tu o
reedificarás em três dias?’ Ora, ele falava do templo de seu corpo. Quando,
pois, ressuscitou dos mortos lembraram-se seus discípulos do que ele dissera e
creram na Escritura e nas palavras que Jesus tinha dito." (Jo 2,
20-22).
O Apóstolo Paulo, mais tarde em suas cartas, corrobora
essa afirmativa de Jesus, dizendo: “Vocês
não sabem que são Templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vocês? Se
algum violar o Templo de Deus, Deus o destruirá. Com efeito, é santo o Templo
de Deus, que são vocês.” (1Cor 3,16-17).
Jesus fica indignado com o desrespeito promovido
contra a casa do Senhor, o Templo de pedra construído por mãos humanas, mas
deixa claro que, mais importante que o Templo de pedra é o Templo de carne e
osso que somos nós, que é o nosso próprio corpo, conforme afirmativa de Paulo,
Apóstolo: “Porventura vocês não sabem que
os seus membros são Templo do Espírito Santo que habita em vocês, que foi dado
a vocês por Deus, e que não vocês não pertencem a si mesmos? Porque vocês foram
comprados por um grande preço. Glorifiquem e tragam Deus no seu corpo.”
(1Cor 6,19-20). Jesus teve tanto zelo com o Templo de pedra, quanto mais os
cristãos deveriam ter zelo com o seu próprio corpo que é a casa de Deus, o templo
do Espírito Santo.
Ao expulsar os vendilhões do templo Jesus diz
indignado: “... minha casa será chamada
casa de oração. Vocês, porém, fazem dela um covil de ladrões.” (Mt 21,13).
Quantas vezes transformamos o nosso corpo em “covil de
ladrões", permitindo que pensamentos escusos, ações indignas, gestos
agressivos, atitudes anticristãs, desrespeito ao próximo, mentiras, falsos
testemunhos, infidelidades se apoderem do nosso corpo, maculando, assim, o
templo do Espírito Santo.
Quantas vezes permitimos que o nosso corpo se
transforme num “covil de ladrões”, um esconderijo de más intenções e de
atitudes dúbias e escusas que magoam o coração de Jesus, e ele, zeloso como é
com as coisas de Deus, não tem outra alternativa senão empunhar uma corda,
dobrá-la em duas, fazer dela um chicote e nos chicotear através de uma chamada
de atenção, de uma doença, de uma infelicidade, de um contratempo, de um mau
negócio para nos dizer que alguma coisa está errada em nossas atitudes, em
nossas vidas.
Como profanamos o nosso corpo; como o desrespeitamos
sem medirmos consequências. Todos os
excessos que praticamos são prejudiciais à saúde e um ultraje ao nosso corpo,
em suma, uma profanação ao Templo do Espírito Santo.
O cigarro fumado indiscriminadamente e em qualquer
lugar envenena os pulmões, contamina o sangue, atingindo com a sua fumaça e
nicotina a todos os que circundam o fumante, poluindo o ambiente. A bebida
alcoólica que é ingerida contamina o sangue, diminui a capacidade de ação e raciocínio
do cérebro, tira a sobriedade e a seriedade da vida normal, fazendo quem ingere
tais bebidas ser agressivo ou passar por chacotas. Os remédios em excesso que é
ingerido provocam distúrbios de toda espécie. Drogas violentam a natureza
humana e a saúde. A prostituição degrada ao nível dos animais irracionais, e
quantas coisas mais que são feitas que profanam o corpo humano que é a casa de
Deus, o Templo do Espírito Santo.
Tudo o que é feito e que coloca em risco a saúde, o
bem estar, a integridade física, males tanto materiais como espirituais, está
profanando o Templo de Deus, que é o corpo: “Vocês
não sabem que os seus membros são templo do Espírito Santo que habita em vocês,
que foi dado a vocês por Deus, e que vocês não pertencem a si mesmos?...
Glorifiquem e tragam a Deus no vosso corpo.” (1Cor 6,19-20).
Assim como Jesus expulsou do templo os vendilhões que
profanavam a casa do Senhor, usando até de violência, nós também devemos ter a
dignidade e coragem de expulsar do corpo, que é o Templo de Deus, tudo aquilo
que o macula, o deturpa, o diminui, o degrada.
Assim como Jesus Cristo, ao expulsar os que
desrespeitavam a casa de Deus, derrubou mesas, bancas e animais que estavam à
venda, deve-se também derrubar preconceitos, violências, discriminações e
expulsar do corpo pecados, ações pouco dignas e atitudes que contradizem os ensinamentos
do Senhor. Jesus fez uma operação limpeza no Templo de Jerusalém e nos chama a
atenção para também fazermos uma operação limpeza no nosso corpo, que é a
primeira morada de Deus no nosso meio.
Jesus Cristo apanhou um chicote para expulsar do Templo
de pedra de Jerusalém todos aqueles que o profanavam. A exemplo de Jesus veríamos,
nem que seja a poder de violência, expulsar
do nosso corpo tudo aquilo que profana a morada de Deus, o Templo do
Espírito Santo.
E muitos pecados só conseguimos expulsar do nosso
corpo praticando violência contra nós mesmos...
O nosso corpo é a morada de Deus, o Templo do Espírito Santo. Não
podemos profaná-lo e nem permitir que seja profanado.
O cuidado que Jesus teve com o Templo de pedra de
Jerusalém é o mesmo e muito mais que precisamos ter com o nosso corpo. Nós somos o Templo de Deus e a morada do
Espírito Santo.
Não vamos provocar a ira de Jesus para que não haja
necessidade de ele empunhar o chicote e nos ferir a fim de nos chamar a atenção
de que algo em nossa vida ou em nossas atitudes não esteja de conformidade com os
seus ensinamentos e, para que isso aconteça, estejamos sempre alertas para
recepcioná-lo, cuidando para que o nosso corpo, que é a casa de Deus e o Templo
do Espírito Santo, esteja sempre limpo e bem arrumado.
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