sábado, 19 de outubro de 2013

PARÁBOLA DA VIÚVA POBRE E DO JUIZ INJUSTO

XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM
Ano C; Cor Verde; Leituras: Ex 17,1-13; Sl 120 (121); 2Tm  3,14 – 4,2; Lc 18,1-8.

“O MEU SOCORRO VEM DE YAHWEH, QUE FEZ O CÉU E A TERRA”. (Sl 120 (121),2).

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Diácono Milton Restivo

A liturgia de hoje nos chama à realidade da oração.
A oração é uma estrada de mão dupla através da qual o cristão, com as suas súplicas, queixas e louvores, chega à presença de Deus, e Deus vem ao seu encontro, com as respostas: “Chame por mim que eu responderei, anunciando coisas grandiosas e sublimes, que você não conhece” (Jr 33,3). “Fiquem sempre alegres no Senhor! Repito: fiquem alegres. [...] Não se inquietem com nada. Apresentem a Deus todas as necessidades de vocês através da oração e da súplica, em ação de graças.” (Fl 4,4a.6). “Aproximemos-nos do trono da graça com plena confiança, a fim de alcançarmos misericórdia, encontrarmos graça e sermos ajudados no momento oportuno” (Hb 4,16). As leituras desta liturgia evocam a oração, a confiança, a entrega nas mãos de Deus, a expectativa de os pedidos serem atendidos e a certeza de que, embora tenhamos urgência em sermos ouvidos, Deus determina a hora em que isso aconteça.
           Na primeira leitura o povo israelita, ainda no deserto, estava sendo atacado por um povo inimigo que tentava obstruir a sua passagem por aquele lugar. Enquanto o exército israelita lutava contra o inimigo, Moisés, em oração, “conservava a mão levantada” e, enquanto ele assim permanecia “Israel vencia”. Mas, “quando abaixava a mão”, o inimigo vencia. Houve a necessidade de que dois homens, “um de cada lado” sustentassem “as mãos de Moisés” (cf Ex 17,11-12). E assim, com a valentia do exército israelita e com o apoio da oração de Moisés, ajudado no seu sacrifício por dois homens, os israelitas venceram o inimigo e continuaram a sua jornada pelo deserto, rumo à Terra Prometida.
Assim também acontece na nossa vida. Às vezes, na nossa jornada, defrontamos com inimigos que querem impedir o nosso progresso na vida de justiça e solidariedade. Ai há a necessidade da oração e sacrifícios para vencer a investida de quem quer nos prejudicar. Muitas vezes temos necessidade de que alguém nos sustente, nos ajude e permaneça conosco na oração como os dois homens ajudaram a Moisés a manter as mãos levantadas e voltadas para o céu.
Jesus incentiva a oração comunitária: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles”. (Mt 18,20). Quando nos reunimos em dois ou mais para orar, já não somos dois, passamos a ser três, porque Jesus se coloca em oração conosco.
Com orações e atitudes de vida autêntica, sempre vencemos e nos colocamos novamente a caminho e no caminho de uma vida em conformidade com os mandamentos de Jesus e a vontade do Pai. O Salmo responsorial confirma isso: “O meu socorro vem de Yahweh, que fez o céu e a terra. [...] Yahweh guarda você de todo o mal, ele guarda a sua vida”. (Sl 120 (121), 2.7).
Na segunda leitura Paulo continua orientando Timóteo a respeito da Palavra: “Quanto a você, permaneça firme naquilo que aprendeu e aceitou como certo; você sabe de quem o aprendeu. Desde a infância você conhece as Sagradas Escrituras; elas têm o poder de lhe comunicar a sabedoria que conduz à salvação pela fé em Jesus Cristo”. (2Tm 3,14-15).
Todas as nossas dúvidas e as respostas aos nossos questionamentos podem ser encontradas na Palavra de Deus e na oração. A fé recebida pela Palavra é depois submetida a um processo de aprendizagem que leva à convicção pessoal: “permaneça firme naquilo que aprendeu e aceitou como certo; você sabe de quem o aprendeu”.
Os santos existem por causa da Palavra, porque foram amantes da Palavra e se entregaram inteiramente a ela, que é fonte de vida e santidade: “Bem-aventurados são aqueles que ouvem a Palavra de Deus e a põe em prática”. (Lc 11,28). Esse é o segredo da santidade: a acolhida e obediência à Palavra. Não seguimos uma ideologia, mas sim, uma Pessoa, a qual está viva na Palavra, a Palavra está nela e ela é a Palavra: Jesus Cristo.
O Evangelho coloca-nos diante de uma parábola que nos ensina a respeito da oração paciente, persistente e perseverante: “Jesus contou aos discípulos uma parábola para mostrar-lhes a necessidade de rezar sempre, sem nunca desistir”. (Lc l8,1).
O propósito dessa parábola é de ensinar a perseverança na oração. Devemos “rezar sempre, sem nunca desistir”. Orar sempre, continuamente.
É fundamental que estejamos presentes na oração. Às vezes, corremos o risco de, quando rezamos, agirmos como crianças levadas que tocam a campainha da casa e depois saem correndo; elas se afastam antes que a porta seja atendida. Não devemos apenas bater, mas insistir, sem esmorecer: “Peçam, e lhes será dado! Procurem, e encontrarão! Batam, e abrirão a porta para vocês! Pois, todo aquele que pede, recebe; quem procura, acha; e a quem bate, a porta será aberta”. (Lc 11,9-10; Mt 7,7-8).
Nesta parábola o juiz é apresentado como um homem de coração duro e insensível, sem princípios, que não temia a Deus e não tinha consideração para com os homens; não era religioso e nem mesmo humanitário e era descaradamente corrupto. Uma viúva que se sentia injustiçada por alguém, veio a esse juiz pedir justiça: “Faça-me justiça contra o meu adversário!’ (Lc 18,3b), mas foi ignorada por muito tempo pelo juiz. Era a arrogância extrema contra a total impotência.
Porque Jesus coloca uma viúva como a injustiçada? Porque a viúva tem um lugar de destaque ao inverso nos escritos sagrados, que não é de privilégios, mas de abandono total. A viúva, tanto no Antigo como no Novo Testamento, era uma pessoa discriminada, porque a sua situação era de total insegurança e desconforto social. As viúvas, assim como os órfãos e os estrangeiros, pertenciam àquela categoria de pessoas que sempre necessitava da proteção especial dos profetas: “busquem o direito, socorram o oprimido, façam justiça ao órfão, defendam a causa da viúva” (Is 1,76); “se não oprimirem o estrangeiro, o órfão e a viúva [...] então eu continuarei morando com vocês, neste lugar, nesta terra que eu dei aos seus antepassados...” (Jr 7,6.7). Também necessitavam do amparo e da defesa da Lei que fez um apelo de misericórdia para elas: “Não maltrate a viúva nem o órfão, porque se você os maltratar e eles clamarem a mim, eu escutarei o clamor deles” (Ex 22,21); “Não distorça o direito do estrangeiro e do órfão, nem tome como penhor a roupa da viúva”. (Dt 24,17).
Também na igreja primitiva as viúvas eram discriminadas e, para serem ajudadas, o comportamento das viúvas devia respeitar alguns requisitos, a saber: exercer a piedade; estar desamparadas; que esperavam em Deus; que fossem espirituais, dedicando-se à oração; que tivessem mais de sessenta anos – as de menos de sessenta anos continuavam na rua da amargura -; que tivessem sido mulheres de um só marido – se tivessem sido casadas mais uma vez, perderiam o direito -; que tivessem criado os filhos com dedicação; que exerciam a hospitalidade aos santos; que socorriam os aflitos; que praticassem toda espécie de boa obra. As viúvas mais jovens, taxadas de preguiçosas, mexeriqueiras – discriminação - e que viviam batendo perna na rua, pertenceriam ao segundo grupo: “Rejeite às viúvas mais jovens; pois quando seus desejos se afastam de Cristo, elas querem se casar, tornando-se censuráveis por terem rompido o seu primeiro compromisso. Além disso, elas aprendem a viver ociosas, correndo de casa em casa; elas não são apenas desocupadas, mas também fofoqueiras, indiscretas, falando o que não devem.” (1Tm 5,11-13).
Jesus toma a figura da viúva como a injustiçada na parábola, e isso ele o fez de propósito: a viúva era uma mulher que, após perder o seu marido, não tinha amparo nem de sua família, nem da família do marido, nem da sociedade e nem da religião. Seu único recurso era apelar pela ajuda e misericórdia alheia e, de uma maneira geral, para uma autoridade.
Jesus usa um personagem que não tinha voz e nem vez; alguém que só dependia da misericórdia de uma possível autoridade, assim como cada um de nós depende da misericórdia e do amor do Pai, porque “Deus é Amor [...] Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele quem nos amou e enviou-nos o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados” (1Jo 4,8.10.16). A viúva, embora sabendo que o juiz – autoridade - era corrupto e injusto, homem que não temia a Deus e nem respeitava os homens, “juiz que não temia a Deus e não respeitava homem algum” (Lc 18,2), não desanimou, pelo contrário, persistiu em sua súplica até ver atendida a sua súplica, a sua pretensão. A fé inquebrantável e o espírito de perseverança que animavam a viúva, deram êxito à sua causa.
Uma das características da oração é a persistência. A persistência é a prova da nossa fidelidade a Deus, da nossa dependência e confiança.
Jesus já havia contado a parábola do amigo importuno (Lc 11,5-98).
Nesta parábola a viúva insistiu, e o juiz lhe atendeu. Se o homem sendo mau, deu atenção à causa da viúva, quanto mais não fará por nós o Senhor nosso Deus? Estamos diante de uma parábola que nos ensina sobre a oração.
O que é oração? “Oração é a comunicação com Deus. É um diálogo entre duas pessoas que se amam mutuamente: Deus e o homem”. Deus está interessado em tudo o que o homem faz e, assim sendo, ele tem prazer na oração dos seus filhos: “Yahweh detesta o sacrifício dos injustos, mas aprecia a súplica dos homens retos”. (Pr 15,8).
Comunicar-se com Deus é um dos grandes privilégios dos filhos de Deus, assim como a Palavra de Deus. A oração é um dos elementos básicos da vida cristã.
Oração é um estilo de vida. É um relacionamento com Deus. Através da oração conversamos com Deus e Deus conversa conosco. Pedimos, agradecemos e adoramos ao Senhor nosso Deus.
Oração é o respiro da alma, do espírito. Sem respiração não existe vida. Quem não ora não tem vida em Deus e com Deus.
A oração é o estabelecimento de um diálogo do cristão com Deus. Jesus é o grande mestre da oração. A oração acompanha todos os fatos importantes da sua vida terrestre. Jesus reza ao receber o batismo de João (Lc 3,21); reza no monte das Oliveiras antes de sua prisão (Lc 22,41.44), e reza na cruz. A última palavra do Senhor antes de morrer, foi uma oração (Lc 23,46). Jesus rezava pela manhã (Mc 1,35) e a tarde (Mt 14,23) e passava a noite inteira em comunhão com o Pai (Lc 6,12).
Jesus retirou-se para uma montanha e passou a noite em oração para, na manhã seguinte, escolher os seus apóstolos (Lc 6,12-13). Antes de fazer a pergunta aos discípulos sobre o significado da sua pessoa para eles, Jesus esteve em oração (Lc 9,18).
No momento da sua transfiguração, Jesus estava em oração (Lc 9,28-29). No Jardim das Oliveiras, passou o tempo em oração e pediu aos discípulos para orarem, a fim de não entrarem em tentação (Lc 22,39-46). Na cruz, orou pelos seus algozes (Lc 23,34).
Orar é estar em contínua comunhão e sintonia com o Pai; é viver a vida da Trindade: “Se vocês ficarem unidos a mim e minhas palavras permanecerem em vocês, peçam o que quiserem e será concedido a vocês.” (Jo 15,7).
A oração exige perseverança: “Peçam, e lhes será dado! Procurem, e encontrarão! Batam, e abrirão a porta para vocês! Pois, todo aquele que pede, recebe; quem procura, acha; e a quem bate, a porta será aberta” (Mt 7,7-8); “Sejam constantes na oração; que ela os mantenha vigilantes, dando graças a Deus” (Cl 4,2); “Rezem sem cessar” (1Ts 5,17b); “Rezem incessantemente no Espírito, com orações e súplicas de todo tipo, e façam vigílias, intercedendo  sem cansaço, por todos os cristãos” (Ef 6,18).
A oração é um espaço privilegiado para compreendermos as propostas do amor. “Como uma criança de Deus, a oração é como ligar para casa todos os dias”.
A viúva da parábola insistiu no seu pedido ao juiz injusto até que ele, de tanto ser importunado, não teve outro recurso senão atender ao pedido da viúva para se ver livre dela: “Eu não temo a Deus e nem respeito homem algum. Mas essa viúva já me está aborrecendo. Vou fazer-lhe justiça, para que ela não fique me incomodando”. (Lc 18,4b-5).
Esse é o exemplo da perseverança na oração. Deus sabe do que precisamos antes que peçamos, mas ele quer ouvir de nossa boca os nossos pedidos, pois só pede quem confia e só espera ser atendido quem ama. E Jesus termina, dizendo: “E Deus não faria justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar? Eu lhes declaro que Deus fará justiça por eles e bem depressa”. (Lc 18,7-8a).
Jesus já havia ensinado como deve ser a insistência na oração e como o Pai atende quem é perseverante na oração: “Peçam, e lhes será dado! Procurem, e encontrarão! Batam, e abrirão a porta para vocês! Pois, todo aquele que pede, recebe; quem procura, acha; e a quem bate, a porta será aberta. Quem de vocês dá ao filho uma pedra, quando ele pede um pão? Ou lhe dá uma cobra, quando ele pede um peixe? Se vocês, que são maus, sabem dar coisas boas aos seus filhos, quanto mais o Pai de vocês que está no céu dará coisas boas aos que lhe pedirem”. (Mt 7,7-11);
No livro do Eclesiástico encontramos o cuidado que Deus tem pelos seus pobres e carentes que a ele recorre fazendo súplicas e desafogando suas queixas: “O Senhor é juiz e não faz diferença entre as pessoas. Ele não dá preferência a ninguém contra o pobre. Pelo contrário, atende a súplica do oprimido. Ele não despreza a súplica do órfão, nem a viúva que desafoga as suas queixas. Será que as lágrimas da viúva não lhe descem pela face, e o grito dela não se levanta contra quem a faz chorar? Quem serve ao Senhor será recebido com benevolência, e sua súplica chegará até as nuvens. A súplica do pobre penetra as nuvens, e ele não sossega, enquanto ela não chegar até lá. Ele não desiste, até que o Altíssimo intervenha para fazer justiça aos justos e realize o julgamento. O Senhor não tardará...”. (Eclo 35,12-19a).

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