Ano – A; Cor –
Branco; Leituras: At 8,5-8.14-17; Sl 65; 1Pd 3,15-18; Jo 14,15-21.
“SE VOCÊS ME
AMAM, OBEDECERÃO AOS MEUS MANDAMENTOS” (Jo 14,15).
Diácono Milton Restivo.
A prisão e morte
do diácono Estevão narradas no livro dos Atos dos Apóstolos 6,8 – 7,60, deram
início à primeira grande perseguição sofrida pela Igreja de Jesus Cristo: “Naquele
dia, desencadeou-se uma grande perseguição contra a igreja de Jerusalém. [...]
Saulo, porém, devastava a Igreja: entrava nas casas e arrastava para fora
homens e mulheres, para colocá-los na prisão. E aqueles que se dispersaram iam
de um lugar para outro, anunciando a Palavra.” (At 8,1b.3-4). Com a morte do
diácono Estevão a Igreja passa por um período de sofrimento e perseguição. Com
o martírio de Estevão as autoridades judaicas tentaram, de uma vez por todas,
acabar com os seguidores do Ressuscitado, caçando, predendo e matando a todos,
tanto mulheres como homens, que acreditavam em Jesus Cristo. “O
sangue dos mártires é a semente da Igreja”, diria mais tarde Tertuliano
(155-222).
Fato inédito e
grande paradoxo: ao invés de a perseguição calar os seguidores do Ressuscitado
e abafar o Evangelho, como tentaram as autoridades judias e o império romano, acabou
fazendo com que o Evangelho saísse de Jerusalém e se espalhasse por outras
regiões onde se refugiavam os discípulos e se difundisse cada vez mais e com
mais ardor. É o Espírito Santo que assim força a Igreja a
sair de seu estreito círculo original, a fim de anunciar o Evangelho “... em toda Judéia
e Samaria, e até os extremos da terra.” (At 1,8b).
A primeira
leitura desta liturgia narra exatamente os efeitos dessa perseguição quando
Filipe, não o Apóstolo, mas aquele que fora escolhido entre os sete diáconos
pelos Apóstolos (cf At 6,1-6), fugindo da perseguição religiosa e refugiando-se
na Samaria, levou para lá o Evangelho de Jesus Cristo e, através da Palavra,
realizando grandes maravilhas.
Se não houvesse a
perseguição o Evangelho permaneceria estancado em Jerusalém e a Igreja não se
espalharia além das fronteiras da Palestina. Os discípulos do Ressuscitado iam por
toda a parte, anunciando a Palavra, obedecendo aquilo que o Mestre lhes
ordenara: “Quando perseguirem vocês numa cidade, fujam para outra.” (Mt
10,23).
Filipe, um dos
sete diáconos a quem os Apóstolos “oraram e impuseram as mãos sobre eles” (At
6,6b), refugiando-se da perseguição na região de Samaria, cumpria a
determinação que Jesus deixara a todos os seus apóstolos e discípulos quando de
sua volta para o Pai, elegendo-os missionários da sua mensagem de salvação: “...
vocês serão minhas testemunhas em Jerusalém, em toda Judéia e Samaria,
e até os extremos da terra.” (At 1,8b).
Quando uma
comunidade é evangelizada, é Jesus quem chega em primeiríssimo lugar através da
Palavra que é levada e proclamada pelos seus missionários, no caso de Samaria,
pelo diácono Filipe. Jesus Cristo está presente realmente na Palavra, não
somente presente, porque ele é a Palavra, porque “a Palavra se fez carne e habitou entre nós. E nós contemplamos a sua
glória, glória que ela tem do Filho único do Pai, cheio de graça e verdade” (Jo
1,14). Jesus está presente na Eucaristia; sua presença é tão real na Palavra
como é real na Eucaristia.
A Constituição
dogmática “Dei Verbum” atesta: “A Igreja sempre venerou a Sagrada Escritura
da mesma forma como o próprio Corpo do Senhor; sobretudo na Sagrada Liturgia
nunca deixou de receber o Pão da vida tanto na mesa da Palavra de Deus como da
mesa do corpo de Cristo par oferecê-lo aos fieis”. (DV 21). Como vemos,
esta constituição diz e proclama que a Palavra de Deus é tão venerável quanto o
Corpo Eucarístico de Cristo. Não pode alimentar-se da Eucaristia quem antes não
se alimentou da Palavra.
Como temos
negligenciado a Palavra. Seria necessário novamente vir até nós o diácono
Filipe para nos trazer o Cristo na Palavra ou a Palavra de Cristo, assim como
ele fez em Samaria? E o que aconteceu em Samaria após receber o Cristo através
da Palavra? “E a cidade se encheu de alegria.” (At 8,8). A Palavra
prepara os cristãos tanto para a Eucaristia como para a vinda do Espírito
Santo: “Então Pedro e João impuseram as mãos sobre os samaritanos, e eles
receberam o Espírito Santo.” (At 8,17). Levando a Palavra aos samaritanos o
diácono Filipe realizou a mais nobre missão de um diácono: proclamar a Palavra.
A Instrução Geral
sobre o Missal Romano, no seu número 33 diz: “... o próprio Cristo, por sua
Palavra, se acha presente no meio dos fieis” e no número 60, diz: “Entre
os ministros, ocupa o primeiro lugar o diácono, cuja ordem foi tida em grande
honra desde o início da Igreja. O diácono tem na Missa funções que lhe são
próprias: anunciar o Evangelho, pregar às vezes a Palavra de Deus...” Então
vemos que Filipe, na Samaria, estava realizando a mais nobre missão do diácono:
proclamar a Palavra.
Na homilia de
ordenação de vinte e nove diáconos, no dia 27 de abril de 2.008, o Papa Bento
XVI, assim se pronunciou a respeito do ministério diaconal: “Nessa cidade de
Samaria, no meio de uma população tradicionalmente desprezada e como que excomungada
pelos judeus, ressoou o anúncio de Cristo que abriu à alegria o coração de
quantos O acolheram com confiança. Eis por que motivo, por conseguinte salienta
São Lucas naquela cidade "houve uma grande alegria". Estimados
amigos, esta é também a vossa missão: anunciar o Evangelho a todos, para que
todos experimentem a alegria de Cristo e haja alegria em cada cidade. O que
pode ser mais belo do que isto? O que pode ser maior e mais entusiasmante do
que cooperar para propagar no mundo a Palavra de vida, do que comunicar a água
viva do Espírito Santo? Anunciar e testemunhar a alegria: este é o núcleo
central da vossa missão, queridos diáconos”.
Depois de o
diácono Filipe haver evangelizado e batizado os samaritanos, havia a
necessidade de integrá-los de vez na Igreja de Jesus Cristo e, “Os apóstolos
que estavam em Jerusalém souberam que a Samaria acolhera a palavra de Deus e
enviaram para lá Pedro e João. Chegando ali, oraram pelos habitantes da
Samaria, para que recebessem o Espírito Santo.” (At 8,14-15).
Estava
confirmada a primeira unção do Crisma, fato que continua se repetindo hoje na
Igreja: depois dos fieis serem evangelizados e batizados pelos diáconos e
presbíteros, o Bispo, sucessor, representante e continuador da obra dos
Apóstolos na Igreja, confere-lhes a unção do Espírito Santo pelo sacramento do
Crisma. Pelo Espírito Santo o cristão recebe nova vida, conforme diz Pedro na
segunda leitura: “Jesus sofreu a morte na sua existência humana, mas recebeu
nova vida pelo Espírito.” (1Pd 3,18b).
Celebrando o VI
Domingo da Páscoa, ficamos a uma semana da solenidade da Ascensão de Jesus aos
céus, e a Igreja começa a nos preparar para o dia de Pentecostes, a vinda do
Espírito Santo prometido por Jesus aos seus discípulos e Apóstolos.
A leitura do
Evangelho deste domingo é a continuação da liturgia do domingo
passado; é a segunda parte do primeiro discurso de despedida de Jesus e tem
como ponto central o amor dos discípulos a Jesus, expresso através da
observância dos seus mandamentos.
Continuando o
discurso durante a sua última ceia com os apóstolos, Jesus promete o Espírito
Santo para aqueles que o amam e obedecem aos seus ensinamentos: “Se vocês me
amam, obedecerão aos meus mandamentos. Então eu pedirei ao Pai, e ele dará a
vocês outro Advogado, para que permaneça com vocês para sempre. Ele é o
Espírito da Verdade, que o mundo não pode acolher, porque não o vê nem o
conhece.” (Jo 14,15-17a).
Jesus está se despedindo
dos seus discípulos, mas promete que não os deixará a sós: enviará a eles outro
Advogado. Por que “outro Advogado”? Porque o primeiro advogado é o
próprio Jesus que veio a este mundo para advogar junto ao Pai e se colocar no
nosso lugar e no lugar de cada um de nós, assumindo sobre si toda nossa
enfermidade, conforme anteviu o profeta Isaias: “Todavia, eram as nossas
doenças que ele carregava, eram as nossas dores que ele levava em suas costas.
E nós achávamos que ele era um homem castigado, um homem ferido por Deus,
humilhado. Mas ele estava sendo traspassado por causa de nossas revoltas, esmagado
por nossos crimes. Caiu sobre ele o castigo que nos deixaria quites; e por suas
feridas é que veio a cura para nós.” (Is 53,4-5).
Com a sua volta
ao Pai, depois de haver cumprido a missão para o qual o Pai lhe enviara, Jesus
garante que o Espírito Santo deixará bem vivo no coração de cada seguidor seu
tudo o que ele ensinou, e tudo o que ele ensinou ele recebeu do Pai: “E a
palavra que vocês ouvem não é minha, mas é a palavra do Pai que me enviou.
Essas são as coisas que eu tinha para dizer estando com vocês. Mas o Advogado,
o Espírito Santo, que o Pai vai enviar em meu nome, ele ensinará a vocês todas as
coisas e fará vocês lembrarem tudo o que eu lhes disse.” (Jo 14,24b-26).
Conforme a
Bíblia Pastoral explica no rodapé desse texto “Advogado é alguém que defende
uma causa. Jesus envia o Espírito Santo como advogado da comunidade cristã. O
Espírito é a memória de Jesus que continua sempre viva e presente na
comunidade. Ele ajuda a comunidade a manter e a interpretar a ação de Jesus em
qualquer tempo e lugar. O Espírito também leva a comunidade a discernir os
acontecimentos para continuar o processo de libertação, distinguindo o que é
vida e o que é morte, e realizando novos atos de Jesus na história.”
Sabendo que ia
se ausentar fisicamente Jesus promete o Espírito Santo que protegeria e
defenderia seus discípulos no mundo conforme ele mesmo já havia dito: “Quando
entregarem vocês, não fiquem preocupados como ou com aquilo que vocês vão
falar, porque nessa hora será sugerido a vocês o que vocês devem dizer. Com
efeito, não serão vocês que irão falar, e sim o Espírito do Pai de vocês é quem
falará através de vocês.” (Mt 10,19-20).
É o Espírito
Santo que Jesus promete que vai enviar que opera a verdadeira fé e a estreita
comunhão com o Pai em
Jesus Cristo. É o Espírito Santo que consola, dá esperança,
coragem, alegria, paciência e sabedoria. Jesus promete enviar o Espírito Santo,
como Advogado e Defensor, que dará palavras e comportamentos acertados e
adequados nos momentos de maior necessidade por que passar um discípulo seu.
Por isso Jesus já dissera: “Não fique perturbado o coração de vocês.
Acreditem em Deus e acreditem também em mim.” (Jo 14,1).
“Eu não
deixarei vocês órfãos” (Jo 14,18a). Nas Sagradas Escrituras os termos
órfãos, viúvas, pobres e estrangeiros eram objetos de proteção especial por
parte da Lei. Eram a classe desprovida e carente até do mínimo necessário para
a sobrevivência. Foi por esse motivo que, na igreja primitiva, foram designados
homens para suprir essa deficiência dentro da própria igreja: “Os de origem
grega diziam que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário.” (At
6,1b).
Se as viúvas
passavam necessidades, imagine seus filhos órfãos. Jesus usa essa metáfora para
deixar claro que jamais os seus discípulos seriam esquecidos no conforto e
abastecimento espiritual que eles necessitavam para exercer o seu ministério, e
complemente: “... mas voltarei para vocês.” (Jo 14,18b), e isso ele vai
confirmar na sua despedida final ao voltar para o Pai: “Eis que eu estarei
com vocês todos os dias, até o fim do mundo.” (Mt 28,20b).
Ao dizer que
não os deixaria órfãos, Jesus pressentiu o sentimento de seus discípulos que se
sentiriam abandonados tanto depois de sua morte como de sua ida para o Pai.
Depois da morte ele ressuscitaria. Depois de sua ida para a casa do Pai, além
de enviar o Espírito Santo, Jesus permaneceria com os seus discípulos “todos
os dias, até o fim do mundo.” (Mt 28,20b).
Dentro do
contexto deste discurso, e voltando atrás nesse momento de despedida, Jesus demonstra
uma sensibilidade extrema chamando os discípulos de “filhinhos” (Jo
13,33) e prova o amor que somente Deus poderia ter para com os seus amados. Num
determinado momento, “Jesus ficou profundamente comovido” (Jo 13,21),
demonstrando que a expressão de fé nele é o amor, e não poderia ter acontecido
momento melhor do que esse para que Jesus deixasse aos seus discípulos o novo
mandamento que ele viera trazer: “Eu dou a vocês um mandamento novo: amem-se
uns aos outros. Assim como eu amei vocês, vocês devem se amar uns aos outros.
Se vocês tiverem amor uns pelos outros, todos reconhecerão que vocês são meus
discípulos.” (Jo 13,34-35).
O mandamento do
amor supera a todos os demais mandamentos, porque quem ama, ama a Deus sobre
todas as coisas, ama o próximo como a si mesmo e, amando o próximo, jamais lhe
fará mal, jamais cometerá contra o próximo qualquer tipo de violência, não
roubará, não matará, não desejara nada do que é do próximo.
O amor tornou
Deus humano na pessoa de Jesus e faz o humano se elevar até Deus, porque
somente amando-nos uns aos outros é que provamos amar Deus.
E para provar o
amor que se deve ter uns pelos outros e todos para Deus, Jesus mostra que o
termômetro do amor é a aceitação e a obediência aos seus mandamentos: quem
obedece aos seus mandamentos dá provas que o ama de verdade: “Quem aceita os
meus mandamentos e a eles obedece, esse é que me ama. E quem me ama, será amado
por meu Pai. Eu também o amarei e me manifestarei a ele. [...] Se alguém
me ama, guarda a minha palavra, e meu Pai o amará. Eu e meu Pai viremos e
faremos nele a nossa morada. Quem não me ama, não guarda as minhas palavras. E
a palavra que vocês ouvem não é minha, mas é a palavra do Pai que me enviou.” (Jo
14,21.23-24).
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