sábado, 26 de março de 2016

SÁBADO SANTO – JESUS NO SEPULCRO

SÁBADO SANTO – JESUS NO SEPULCRO

“NÓS ESPERÁVAMOS QUE ELE FOSSE O LIBERTADOR DE ISRAEL, NAS HOJE JÁ O TERCEIRO DIA...” (Lc 24,21).


Diácono Milton Restivo

Silêncio. A Igreja está de luto. A natureza está de luto. Tudo é silêncio, tudo é sofrimento, tudo é dor. Aquele em que depositávamos as nossas esperanças já não existe mais no meio dos mortais. Neste momento está depositado no sepulcro que lhe foi emprestado, no silêncio total, no descanso eterno. Aquele que ressuscitara tantas pessoas, que fizera voltar à vida Lázaro, o filho da viúva de Naim, a filha de Jairo, e que dissera: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida”, (Jo 14,6), e que viera trazer a vida em abundância: "Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância" (Jo 10, 10), e queria que todos vivêssemos essa vida, agora está sem vida, está morto e sepultado. “Vocês todos que passam pelo caminho, olhem e prestem atenção: haverá dor semelhante à minha dor?” (Lm 1,12).
O velho Simeão, quando Maria e José apresentaram Jesus no Templo quando ainda bebê, dissera a Maria: “Eis que esse menino vai ser causa de queda e elevação de muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição. Quanto a você, uma espada há de atravessar-lhe a alma”. (Lc 2,34-35). O velho Simeão falou de uma espada de dor; quantas espadas traspassaram o coração de Maria? Maria sabia quem era Jesus; o mundo não quis saber... 
      O velho Simeão falou que ele seria “sinal de contradição”; a primeira contradição foi que o Rei dos Reis nasceu num curral de animais e a última foi que sua coroa não foi de ouro e pedras preciosas e sim de espinhos, e o seu trono não foi ricamente ornamentado, mas foi o madeiro cruel e duro de uma cruz...
O mundo está atordoado. O madeiro da cruz, no alto do Calvário, está vazio, silencioso, num silêncio gritante que fala mais alto do que qualquer grito que busca justiça, que reflete dor e injustiça. Apenas filetes de sangue seco escorridos no madeiro inerte da cruz mostram que o condenado que ali esteve sofreu as mais angustiantes dores.
Ali estivera, até a pouco tempo, pendurado, preso apenas por cravos que lhe perfuraram as mãos e os pés prendendo-o no madeiro da cruz, aquele que dissera:  “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim”. (Jo 14,6).
Das suas palavras não restam senão o eco surdo nos corações apavorados e sem esperanças daqueles que depositaram nele toda a sua esperança e a realização de dias melhores e que acreditaram nele.
“Nós esperávamos que ele fosse o libertador de Israel, mas apesar de tudo isso, já faz três dias que isso aconteceu”. (Lc 24,21); esse foi o lamento dolorido de um dos discípulos que caminhava para Emaús. Uma queixa dolorida e amarga que retrata fielmente a desilusão de quem acreditava e esperava em dias melhores, e vê que tudo termina no alto, mas no alto do madeiro de uma cruz.
Carlos Mesters, no seu livro: “Deus, onde estás?” escreve: “Com a morte de Jesus, morreu algo na vida dos apóstolos, alguma coisa de fundamental importância. A vida para eles já não tinha mais sentido... A morte de Jesus matou alguma coisa no íntimo dos apóstolos, como a morte do marido mata algo na esposa que fica; a morte do amigo mata algo no íntimo do amigo que fica. Matando o Cristo, mataram o futuro do coração dos apóstolos. Estancou-se a fonte, a água acabou. Destruíram a turbina, a luz apagou”.
Agora Jesus está morto, recolhido num sepulcro. Nesta oportunidade está se realizando a profecia do velho Simeão. O coração de Maria está traspassado, não de uma, mas de centenas de espadas. O coração de Maria está esfacelado, está sangrando, está inconsolável, e poderíamos colocar em sua boa as palavras do profeta: “Vocês todos que passam pelo caminho, olhem e prestem atenção: haverá dor semelhante à minha dor?” (Lm 1,12).
Não, não existe dor semelhante... Não pode existir... Somente a dor de seu Filho foi maior que a sua. Não tanto dor física que Jesus passou e que nenhum homem normal teria tanta resistência para passar; não a dor da flagelação, não a dor da coroação de espinhos e da permanência interminável da coroa em sua cabeça, não a dor da crucificação, mas a dor maior: a dor da ingratidão dos homens que não entenderam o grande gesto de amor de “um Deus que se fez homem para que todos os homens se tornassem filhos de Deus”. Um Deus que tomou nossas misérias, tomou sobre si o peso de nossos pecados...
Alguém já escreveu: “O local onde ele nascera, era emprestado. O jumento que ele montara para sua entrada triunfal em Jerusalém, era emprestado. Os pães e os peixes que ele multiplicara, eram emprestados. A sala onde ele celebrara a última ceia com seus apóstolos e instituiu a Eucaristia, era emprestada. O barco onde viajara, era emprestado. O túmulo onde está depositado é emprestado. Só a cruz, somente a cruz era dele”.
E essa mesma cruz, que agora está vazia e abandonada no alto do Calvário, continua sendo dele, porque ele a usou como instrumento para a redenção do gênero humano.
Ele mesmo, parafraseando o profeta Zacarias 13,7, dissera um dia: “Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho se dispersarão." (Mt 26,31). Os apóstolos estão todos apavorados.
Também são dele essas as palavras: “As raposas têm tocas e os pássaros do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça”. (Lc 9,58). 
O Filho do Homem não tinha uma pedra para reclinar a cabeça...
O Filho do Homem não tinha uma mesa onde pudesse reclinar para fazer suas refeições; elas aconteciam na casa dos que eram considerados pecadores pelos que se julgavam santos.
O Filho do Homem não teve sequer um túmulo onde pudesse ser colocado seus restos mortais; o túmulo em que ele se encontra é emprestado.
Ele dissera certo dia: “Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele fica só. Mas, se morre, produz muito fruto.” (J0 12, 24).  E ele se faz o grão de trigo, é jogado ao chão, é enterrado.
Espera-se apenas o momento do grão de trigo brotar da terra para que possa frutificar.
Todo trigo, para se transformar em pão saudável, deve ser triturado, esmagado, transformado em farinha, passar pelas moendas e pelo fogo. Depois desse processo está pronto para ser comido e transformar tudo em vida. A cruz continua solitária e abandonada no alto do Calvário.
O crucificado é como o trigo lançado no chão. Aguarda-se o momento que, aos olhos dos homens, parece impossível. Ele prometera que ao terceiro dia ele ressuscitaria: “Destruam este Templo, e em três dias eu o levantarei.” (Jo 2,18).
Mas, se fosse realmente para ressuscitar e voltar à vida, porque deveria ter se submetido a todo esse processo, julgamento iníquo e todos os sofrimentos por que passou?
Ele encorajara seus discípulos: “Vem a hora, e já chegou, em que vocês se espalharão cada um para o seu lado, e me deixarão sozinho. Mas eu não estou sozinho, pois o Pai está comigo. Eu disse essas coisas para que vocês tenham a minha paz. Neste mundo vocês terão aflições, mas tenham coragem, eu venci o mundo.” (Jo 16,32-33). Mas, que vitória teria sido essa se o espírito das trevas havia vencido todas as batalhas, e ele jazia no sepulcro?
Jesus, o Cristo, está no sepulcro. Entre todos aqueles que o seguiam não existe ninguém, um sequer, nesse momento, que tenha confiança que ele ressuscitará, que ele voltará à vida.
Espere, não sejamos apressados e nem fatalistas; existe sim, existe uma pessoa que acredita incondicionalmente que ele cumprirá o que prometera: sua mãe, Maria.
Maria é a Igreja, e como Igreja, Maria se coloca em vigília, aguardando esse momento supremo em que a luz vencerá as trevas, em que a vida vencerá a morte.
E hoje, neste Sábado Santo, a Igreja, com Maria, se coloca nessa expectativa, na certeza de que, a qualquer momento, algo extraordinário acontecerá.  Continuemos em silêncio.
Continuemos em meditação
Continuemos vivendo esse respeito, velando ao lado do sepulcro.
Ele prometeu... Ele cumpre...

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