SÁBADO SANTO – JESUS NO SEPULCRO
“NÓS ESPERÁVAMOS QUE ELE FOSSE O
LIBERTADOR DE ISRAEL, NAS HOJE JÁ O TERCEIRO DIA...” (Lc 24,21).
Diácono
Milton Restivo
Silêncio. A
Igreja está de luto. A natureza está de luto. Tudo é silêncio, tudo é
sofrimento, tudo é dor. Aquele em que depositávamos as nossas esperanças já não
existe mais no meio dos mortais. Neste momento está depositado no sepulcro que
lhe foi emprestado, no silêncio total, no descanso eterno. Aquele que
ressuscitara tantas pessoas, que fizera voltar à vida Lázaro, o filho da viúva
de Naim, a filha de Jairo, e que dissera: “Eu
sou o Caminho, a Verdade e a Vida”, (Jo 14,6), e que viera trazer a vida em
abundância: "Eu vim para que todos
tenham vida e a tenham em abundância" (Jo 10, 10), e queria que todos
vivêssemos essa vida, agora está sem vida, está morto e sepultado. “Vocês todos que passam pelo caminho, olhem
e prestem atenção: haverá dor semelhante à minha dor?” (Lm 1,12).
O velho
Simeão, quando Maria e José apresentaram Jesus no Templo quando ainda bebê,
dissera a Maria: “Eis que esse menino vai
ser causa de queda e elevação de muitos em Israel. Ele será um
sinal de contradição. Quanto a você, uma espada há de atravessar-lhe a alma”. (Lc
2,34-35). O velho Simeão falou de uma espada de dor; quantas espadas
traspassaram o coração de Maria? Maria sabia quem era Jesus; o mundo não quis
saber...
O velho Simeão
falou que ele seria “sinal de
contradição”; a primeira contradição foi que o Rei dos Reis nasceu num
curral de animais e a última foi que sua coroa não foi de ouro e pedras
preciosas e sim de espinhos, e o seu trono não foi ricamente ornamentado, mas
foi o madeiro cruel e duro de uma cruz...
O mundo está
atordoado. O madeiro da cruz, no alto do Calvário, está vazio, silencioso, num
silêncio gritante que fala mais alto do que qualquer grito que busca justiça,
que reflete dor e injustiça. Apenas filetes de sangue seco escorridos no madeiro
inerte da cruz mostram que o condenado que ali esteve sofreu as mais
angustiantes dores.
Ali estivera,
até a pouco tempo, pendurado, preso apenas por cravos que lhe perfuraram as
mãos e os pés prendendo-o no madeiro da cruz, aquele que dissera: “Eu sou
o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim”. (Jo
14,6).
Das suas
palavras não restam senão o eco surdo nos corações apavorados e sem esperanças
daqueles que depositaram nele toda a sua esperança e a realização de dias
melhores e que acreditaram nele.
“Nós esperávamos que ele fosse o libertador
de Israel, mas apesar de tudo isso, já faz três dias que isso aconteceu”. (Lc
24,21); esse foi o lamento dolorido de um dos discípulos que caminhava para
Emaús. Uma queixa dolorida e amarga que retrata fielmente a desilusão de quem
acreditava e esperava em dias melhores, e vê que tudo termina no alto, mas no
alto do madeiro de uma cruz.
Carlos
Mesters, no seu livro: “Deus, onde estás?” escreve: “Com a morte de Jesus, morreu algo na vida dos apóstolos, alguma coisa
de fundamental importância. A vida para eles já não tinha mais sentido... A
morte de Jesus matou alguma coisa no íntimo dos apóstolos, como a morte do
marido mata algo na esposa que fica; a morte do amigo mata algo no íntimo do
amigo que fica. Matando o Cristo, mataram o futuro do coração dos apóstolos. Estancou-se
a fonte, a água acabou. Destruíram a turbina, a luz apagou”.
Agora Jesus
está morto, recolhido num sepulcro. Nesta oportunidade está se realizando a
profecia do velho Simeão. O coração de Maria está traspassado, não de uma, mas
de centenas de espadas. O coração de Maria está esfacelado, está sangrando,
está inconsolável, e poderíamos colocar em sua boa as palavras do profeta: “Vocês todos que passam pelo caminho, olhem
e prestem atenção: haverá dor semelhante à minha dor?” (Lm 1,12).
Não, não
existe dor semelhante... Não pode existir... Somente a dor de seu Filho foi
maior que a sua. Não tanto dor física que Jesus passou e que nenhum homem
normal teria tanta resistência para passar; não a dor da flagelação, não a dor
da coroação de espinhos e da permanência interminável da coroa em sua cabeça,
não a dor da crucificação, mas a dor maior: a dor da ingratidão dos homens que
não entenderam o grande gesto de amor de “um
Deus que se fez homem para que todos os homens se tornassem filhos de Deus”. Um
Deus que tomou nossas misérias, tomou sobre si o peso de nossos pecados...
Alguém já
escreveu: “O local onde ele nascera, era
emprestado. O jumento que ele montara para sua entrada triunfal em Jerusalém,
era emprestado. Os pães e os peixes que ele multiplicara, eram emprestados. A
sala onde ele celebrara a última ceia com seus apóstolos e instituiu a
Eucaristia, era emprestada. O barco onde viajara, era emprestado. O túmulo onde
está depositado é emprestado. Só a cruz, somente a cruz era dele”.
E essa mesma
cruz, que agora está vazia e abandonada no alto do Calvário, continua sendo
dele, porque ele a usou como instrumento para a redenção do gênero humano.
Ele mesmo,
parafraseando o profeta Zacarias 13,7, dissera um dia: “Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho se dispersarão."
(Mt 26,31). Os apóstolos estão todos apavorados.
Também são
dele essas as palavras: “As raposas têm
tocas e os pássaros do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde
reclinar a cabeça”. (Lc 9,58).
O Filho do
Homem não tinha uma pedra para reclinar a cabeça...
O Filho do
Homem não tinha uma mesa onde pudesse reclinar para fazer suas refeições; elas
aconteciam na casa dos que eram considerados pecadores pelos que se julgavam
santos.
O Filho do
Homem não teve sequer um túmulo onde pudesse ser colocado seus restos mortais; o
túmulo em que ele se encontra é emprestado.
Ele dissera
certo dia: “Se o grão de trigo que cai na
terra não morre, ele fica só. Mas, se morre, produz muito fruto.” (J0 12,
24). E ele se faz o grão de trigo, é
jogado ao chão, é enterrado.
Espera-se
apenas o momento do grão de trigo brotar da terra para que possa frutificar.
Todo trigo,
para se transformar em pão saudável, deve ser triturado, esmagado, transformado
em farinha, passar pelas moendas e pelo fogo. Depois desse processo está pronto
para ser comido e transformar tudo em vida. A cruz continua solitária e abandonada no
alto do Calvário.
O crucificado
é como o trigo lançado no chão. Aguarda-se o momento que, aos olhos dos homens,
parece impossível. Ele prometera que ao terceiro dia ele ressuscitaria: “Destruam este Templo, e em três dias eu o
levantarei.” (Jo 2,18).
Mas, se fosse
realmente para ressuscitar e voltar à vida, porque deveria ter se submetido a
todo esse processo, julgamento iníquo e todos os sofrimentos por que passou?
Ele encorajara
seus discípulos: “Vem a hora, e já
chegou, em que vocês se espalharão cada um para o seu lado, e me deixarão
sozinho. Mas eu não estou sozinho, pois o Pai está comigo. Eu disse essas
coisas para que vocês tenham a minha paz. Neste mundo vocês terão aflições, mas
tenham coragem, eu venci o mundo.” (Jo 16,32-33). Mas, que vitória teria
sido essa se o espírito das trevas havia vencido todas as batalhas, e ele jazia
no sepulcro?
Jesus, o
Cristo, está no sepulcro. Entre todos aqueles que o seguiam não existe ninguém,
um sequer, nesse momento, que tenha confiança que ele ressuscitará, que ele
voltará à vida.
Espere, não
sejamos apressados e nem fatalistas; existe sim, existe uma pessoa que acredita
incondicionalmente que ele cumprirá o que prometera: sua mãe, Maria.
Maria é a
Igreja, e como Igreja, Maria se coloca em vigília, aguardando esse momento
supremo em que a luz vencerá as trevas, em que a vida vencerá a morte.
E hoje, neste
Sábado Santo, a Igreja, com Maria, se coloca nessa expectativa, na certeza de
que, a qualquer momento, algo extraordinário acontecerá. Continuemos em silêncio.
Continuemos em
meditação
Continuemos
vivendo esse respeito, velando ao lado do sepulcro.
Ele
prometeu... Ele cumpre...
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