DIÁCONO PERMANENTE
– QUAL A SUA MISSÃO NA IGREJA.
Diácono Milton Restivo
Hoje, 24 de maio de 2016, dia de Nossa
Senhora Auxiliadora, faz nove anos que recebi o Sacramento da Ordem no grau do
Diaconato Permanente da nossa Igreja.
Foi o Cardeal D. Orani João Tempesta, na
época bispo da Diocese de São José do Rio Preto, atendendo ao apelo e à
necessidade da Igreja, quem introduziu o Diaconato Permanente na nossa Diocese.
O Bispo que ordenou a mim e ao Diácono
Amâncio, os dois primeiros Diáconos Permanentes ordenados na Diocese de São
José do Rio Preto/SP, foi o nosso bispo da época, D. Paulo Mendes Peixoto, hoje
Arcebispo de Uberaba/MG. Nessa mesma data fui provisionado na Paróquia São
Pedro e São Paulo, no Jardim Vitória Régia, São José do Rio Preto/SP, onde
permaneço até a presente data.
Mas, o que é ser Diácono na e da Igreja?
Comecemos pela sua instituição administrativa contida no livro dos Atos dos
Apóstolos: “o número dos discípulos tinha aumentado, e os fiéis de origem
grega começaram a queixar-se dos fiéis de origem hebraica. Os de origem grega
diziam que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário”
(At 6,1).
Vemos que, em
Jerusalém, não eram somente judeus que haviam se convertido para a Igreja do
Caminho, mas, também, fiéis de origem grega aderiram aos ensinamentos do Divino
Mestre.
As pessoas
carentes por parte dos judeus tinham atendimento preferencial por parte da
comunidade, enquanto que os necessitados de origem grega e ou estrangeiros eram
negligenciados e, por isso, reclamaram. Para serem encarregados dessa tarefa
foram escolhidos sete homens, todos de origem grega, “de boa fama, repletos
do Espírito e de sabedoria” (At 6,3).
Jamais
poderíamos dizer com segurança que, ao serem encarregados esses sete homens
para esse serviço, estava instituído na Igreja o ministério diaconal porque, em
primeira instância, Jesus foi o primeiro diácono e o diácono por excelência: “quem
de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês; e quem de
vocês quiser ser o primeiro, deverá tornar-se servo de vocês. Pois, o Filho do
Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e dar a sua vida como
resgate em favor de muitos” (Mt
20,26-28). Jesus é o diácono por excelência.
Ninguém criou nada se já Jesus não tivesse sido ou
dado o exemplo.
O fato de os Apóstolos escolherem sete homens “de
boa fama, repletos do Espírito e de sabedoria” no meio da comunidade é consequência daquilo que Jesus já fizera e dera
o exemplo na última ceia quando lavou os pés dos seus discípulos e disse: “Vocês
compreenderam o que eu acabei de fazer? Vocês dizem que eu sou o Mestre, o
Senhor. E vocês têm razão; eu sou mesmo. Pois bem: eu que sou o Mestre e o
Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo: vocês devem
fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior que o
seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês
compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”. (Jo 13,12-17).
Os Apóstolos, ao designarem esses sete homens, apenas
acordaram para a realidade de que a Igreja de Jesus Cristo é diaconal por
excelência, nasceu diaconal e deixa de ser Igreja se não for diaconal.
Ao designar esses homens para esse serviço, os
Apóstolos estavam delegando a eles um serviço, que em primeiríssimo lugar, era
deles próprios, os Apóstolos, hoje os Bispos que são sucessores diretos dos
Apóstolos, conforme disse o teólogo Collins que, fazendo isso, os Apóstolos
poderiam continuar com o seu ministério apostólico no Templo, entre os judeus,
ministério esse que era uma diaconia, a de proclamar ali a Palavra.
Isso deixa claro e é biblicamente correto que o
ministério diaconal na Igreja foi instituído antes mesmo do ministério
presbiteral.
O presbítero que não tenha sido diácono, que não
tenha vivido a sua diaconia intensamente e que não continue com seu ministério
diaconal por toda a sua vida, não está exercendo o ministério a que fora
chamado, mas se converteu em um profissional do altar, e como temos
profissionais do altar na nossa Igreja.
A Igreja é, por excelência, diaconal, servidora, a
exemplo de Cristo, que disse: “o Filho do Homem não veio para ser servido.
Ele veio para servir e dar a sua vida como resgate em favor de muitos” (Mt 20,28).
Os sete homens escolhidos eram de origem grega e,
portanto, eles deveriam desempenhar a sua diaconia entre os cristãos de origem
grega, e isso quer dizer que, não somente suprir as necessidades materiais
desse seguimento, mas de proclamar também a Palavra para eles.
Para ficar claro isso, nada melhor que buscar a
opinião de um mestre em Teologia, Júlio César Bendineli, constante do seu livro
“Diaconia da Palavra”, página 68: “É por isso que os Atos dos Apóstolos
apresentam, na sequência, Estevão pregando em Jerusalém e, pouco depois,
Filipe, como sendo o responsável pelo progresso da Palavra na Samaria (At
8,4ss), isto é, para além de Jerusalém e da Judéia. Mais adiante, o mesmo
Filipe voltará à cena, quando será chamado, não por acaso de Evangelista (At
21,8). Sua missão o levaria até a Cesaréia, um porto usado para se viajar a
Roma (At 8,4-14.26-40), objetivo final da trajetória da Palavra nos relatos
lucanos”.
E continua Júlio César Bendineli no mesmo livro,
página 69: “Os diáconos, assim como os Apóstolos, eram enviados com a função,
principalmente, de anúncio do Evangelho, e mais tarde, na era patrística,
sempre apareciam associados aos bispos e aos presbíteros no ministério da
Palavra, especialmente no contexto catequético [...] Em resumo, a essência do ministério dos antigos diáconos
era a mediação, o ofício de ser ponte ente a Igreja e o mundo, operado pela
mensagem/palavra que transmitiam na condição de representantes de uma
autoridade (bispo) em nome da qual exerciam funções caritativas ou de cuidado
com o próximo, sempre conectadas com a pregação do Evangelho”.
O livro dos Atos dos Apóstolos se preocupa em colocar
em relevo os dois dentre esses sete homens escolhidos pelos apóstolos que se
distinguiram pela pregação da Palavra, aos quais, nesse livro, foi dado
destaque especial: Estevão e Filipe.
Estevão que, inclusive, foi martirizado a pedradas
por proclamar e testemunhar a Palavra, conforme é narrado no livro dos Atos dos
Apóstolos, capítulo 7; foi
justamente pelo zelo da proclamação da Palavra que Estevão atraiu contra si
feroz oposição por parte dos judeus.
Uma de suas mensagens sobre o Reino de Deus
acendeu a fúria dos ouvintes que confrontados no seu pecado resolveram matá-lo.
Em seu martírio, Estevão teve uma visão do céu aberto e Jesus de pé ao lado do
Pai.
O diácono Estevão morreu pedindo que Deus
perdoasse os seus algozes, entre os quais estava Saulo de Tarso, que mais tarde
se tornaria o mais célebre dos apóstolos.
O outro desses sete homens que se destacou pela
proclamação da Palavra, foi Filipe (não o apóstolo). Felipe, não que não tenha se limitado às
tarefas do dia-dia da igreja e do seu ministério, mas, homem consagrado a Deus,
foi orientado pelo Espírito Santo a seguir pelo caminho que ligava Jerusalém a
Gaza.
Na estrada, aproximou-se correndo da caravana
de um alto oficial etíope, eunuco, administrador dos bens de sua rainha. O oficial
lia um trecho do livro do profeta Isaías, sobre Jesus.
O etíope convidou Filipe a subir na
carruagem e Felipe usando a palavra do profeta, pregou o Evangelho com tamanha
unção que o oficial creu e quis ser batizado ali mesmo, à beira do caminho.
Após batizar o oficial, Filipe foi arrebatado pelo espírito do Senhor, deixando
o etíope maravilhado com o poder de Deus, conforme é narrado nos Atos dos
Apóstolos, 8,26-40.
Jesus, que veio ao mundo “para servir e não
ser servido” deu o exemplo da diaconia
na última ceia quando, “se levantou da mesa, tirou o manto, pegou uma
toalha e amarrou-a na cintura. Colocou água na bacia e começou a lavar os pés
dos discípulos, enxugando com a toalha que tinha na cintura. [...] Depois de lavar os pés dos discípulos, Jesus
vestiu o manto, sentou-se de novo, e perguntou: ‘Vocês compreenderam o que eu
acabei de fazer? Vocês dizem que eu sou o Mestre, o Senhor. E vocês têm razão;
eu sou mesmo. Pois bem: eu que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por
isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo: vocês
devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior
que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês
compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”. (Jo 13,4-5.12-17).
Isso é diaconia. Isso é ser diácono, imitando o
exemplo do Mestre. Não se é papa, nem bispo e nem padre se não for diácono,
tanto é que o primeiro degrau para o ministério ordenado é a ordenação à
diaconia; mas esse período entre a diaconia e o presbiterato é tão curto que
muitos presbíteros se esquecem que, antes de serem presbíteros, são diáconos e
que deveriam continuar sendo, não importando o grau de ordenação que tenham
recebido.
Todos os que recebem a ordenação através do
Sacramento da Ordem, Diáconos, Presbíteros e Epíscopos são inseridos e
integrados no Clero, portanto, são clérigos os diáconos presbíteros e epíscopos.
Prova disso está quando o Papa Francisco em uma
Quinta-feira Santa, quando da cerimônia do Lava-pés, não colocou uma estola com
insígnias papais, mas colocou a sua estola na transversal, como a usa os
diáconos, da direita para a esquerda, e lavou os pés dos seus fiéis, voltando
às origens do Sacramento da Ordem onde o primeiro apelo de Cristo para os
vocacionados à vida religiosa sacramental da Ordem devem sempre voltar ao
primeiro degrau desse Sacramento, o de jamais de esquecer que, antes de serem presbíteros
ou epíscopos não devem renegar a ordem diaconal a que foram clamados em
primeira instância.
A estola é o símbolo da dignidade e do compromisso do
ministro ordenado, e a estola do diácono é na transversal, e isso lembra a
toalha cingida na cintura por Jesus para lavar os pés dos seus discípulos.
Pena que a memória da última ceia, quando Jesus lava
os pés dos discípulos para dar o exemplo da diaconia a todos, acontece, na
nossa Igreja, somente na cerimônia da Quinta-feira Santa que, em muitos
lugares, é mais transformado em teatro do que em liturgia e memória.
Seria esse o objetivo de Jesus ao dizer: “Eu
lhes dei o exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a
vocês: o servo não é maior que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que
aquele que o enviou. Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em
prática”. (Jo 13,15-17)?
Acredito que não. O “lavar os pés” uns dos outros não
tem dia e nem horário marcado; a diaconia do povo de Deus deve acontecer quando
o amor fala mais alto e nos arremete a entender a necessidade do próximo, e
para isso não existe dia específico e nem precisamos procurar: ela vem ao nosso
encontro.
Os diáconos, como os bispos e presbíteros, são
pastores, apascentadores, são aqueles que cuidam, protegem e
instruem o rebanho de Deus, tendo como modelo, o Senhor Jesus Cristo, o Sumo e
Divino Pastor.
A função do
diácono, assim como a do bispo e a do presbítero, é o de ensinar a sã doutrina,
refutar a heresia, ensinar a Palavra de Deus e dirigir a igreja local de acordo
com os preceitos bíblicos, morais e espirituais contidos na Palavra de Deus.
No Sacramento
da Ordem não há grau superior ou inferior, porque todos os graus são Sacramento
da Ordem, havendo apenas a destinação para cada grau: diaconato, presbiterato e
episcopado.
Por
desinformação catequética e litúrgica, os fiéis leigos veem nos diáconos meros
auxiliares dos presbíteros, o que não condiz com a realidade.
Tanto o
presbítero como o diácono tem o compromisso de obediência ao seu Bispo e ambos
trabalham juntos e de comum acordo para que seja levado à sério o juramento de
obediência para que, através do Bispo, sucessor na linha direta dos Apóstolos,
o povo de Deus seja alimentado pela Palavra e pela Eucaristia.
O Diácono não é
coroinha especial ou acólito de luxo do presbítero. O diácono, assim como o presbítero e o Bispo,
pelo Sacramento da Ordem, é ministro ordinário da Palavra, ministro ordinário
da Eucaristia, ministro ordinário da Caridade e servidor do povo de Deus.
Sobre a
recomendação de Paulo a Timóteo, contida na primeira carta a Timóteo, não
devemos entendê-la como sendo dirigida apenas e somente aos diáconos, como
muita gente entendida em teologia quer impor, mas essa recomendação foi,
indistintamente, a todos os que “aspira cargo de direção” na Igreja,
isto é, diáconos, presbíteros e epíscopos, a todos os que têm ministério
ordenado dentro daquilo que lhe é próprio e no grau da ordem que lhes são
conferido: “Seja irrepreensível, esposo de uma única mulher, ajuizado,
equilibrado, educado, hospitaleiro, capaz de ensinar, não dado a bebida, nem
briguento, mas indulgente, pacífico e sem interesse por dinheiro. Ele deve ser
homem que saiba dirigir bem a própria casa, e cujos filhos lhe obedeçam e
respeitem. Pois se alguém não sabe dirigir a própria casa, como poderá dirigir
bem a Igreja de Deus?” (1Tm 2,2-5).
Não pode
dirigir a Igreja de Deus quem não sabe dirigir a própria casa. São os diáconos
sozinhos que dirigem a Igreja de Deus?
Não. São o
papa, os bispos, os presbíteros e os diáconos, cada qual com suas
responsabilidades específicas. Então a recomendação de Paulo foi para todos.
Isso foi dito
assim porque quando foi escrita essa recomendação não estava implantado ainda o
celibato na Igreja: epíscopos e presbíteros, assim como os diáconos, eram todos
casados ou, pelo menos podiam casar-se. Até o papa, como era o caso de Pedro,
era casado.
A proclamação
do Evangelho nas liturgias da Palavra e da Eucaristia por parte do diácono é um
costume antiguíssimo da Igreja, uma vez que, dentre os seus serviços, a
proclamação da Palavra, principalmente pelo anúncio, é atribuição inerente do
seu ministério ordenado.
Como uma pessoa
eclesial, o diácono tem de permanecer próximo da Palavra.
Os documentos
de "Santo Domingo" nos dizem que o diácono permanente é o único a
viver a dupla sacramentalidade, que nem o bispo e nem o presbítero vivem: - o
sacramento da ordem e o sacramento do matrimônio -. Um não elimina o outro. Tanto
a vida do ministro ordenado como a de quem recebeu o sacramento do matrimonio
é, portanto vivida em sua plenitude na pessoa do diácono permanente. O diácono
permanente é o único membro da Igreja de Jesus Cristo que pode receber todos os
sacramentos.
Em artigo
difundido no portal da arquidiocese do Rio de Janeiro, o Cardeal Dom Orani
considera que a retomada do ministério diaconal, “como uma vocação própria,
é uma grande riqueza para nós. Tive a oportunidade de poder vivenciar várias
experiências ligadas ao diaconato permanente, seja em minha paróquia, seja
iniciando a escola diaconal em minha primeira diocese (São José do Rio
Preto/SP) ou então continuando uma caminhada das mais antigas do Brasil, na
arquidiocese anterior a que servi”, conta Dom Orani.
O Cardeal
afirma que percebeu “a importância e o valor do diaconato permanente, tanto
no campo social como na presença evangelizadora da Igreja nos diversos âmbitos
e também nas comunidades. Posso testemunhar, por minhas experiências, a riqueza
da vida, da missão e do trabalho diaconal o bem que se faz à Igreja”.
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