XXXI DOMINGO DO TEMPO COMUM
"ELE PROCURAVA VER QUEM ERA
JESUS..." - (Lc 19, 3).
Diácono Milton
Restivo
No Evangelho segundo Lucas Jesus continua sua
caminhada rumo a Jerusalém.
A cidade de Jericó fica no caminho de quem vem do
norte, da Galiléia, para o sul, Jerusalém.
Estavam com Jesus aqueles que o seguiam por onde quer
que fosse; homens e mulheres, discípulos seus, que eram companhia permanente,
mas tinha, também, os curiosos ocasionais que se aproximavam apenas para se
inteirarem das novidades.
Quando chegava nos vilarejos e nas cidades, o povo
desses lugares, ao tomar conhecimento que Jesus se aproximava, saia ao seu
encontro, uns por curiosidade, outros querendo ver milagres ou buscando a
recuperação da saúde e outros ainda desejosos de beber da sabedoria do Mestre.
Ao chegar às portas de Jericó, um desses “que procurava ver quem era Jesus” era “um homem chamado Zaqueu”.
Zaqueu era um personagem famoso e famigerado na cidade,
bem conhecido por todos, mas odiado por muitos porque era “chefe dos cobradores de impostos e muito rico”. Rico demais, daqueles
para os quais a porta do Reino dos céus parece por demais estreita.
Já falamos quem eram os cobradores de impostos no
tempo de Jesus na meditação do domingo passado, na parábola do fariseu e do
publicano (Lc 18,9-14). Os publicanos eram aqueles que tinham enriquecido
ilicitamente, explorando o povo e recebendo os impostos para os romanos.
O cobrador de impostos nunca foi amado e muito menos
popular em nenhum país do mundo: ainda mais o publicano judeu, que representava
uma dupla blasfêmia: judeus que pediam dinheiro de outros judeus para dá-lo ao
odiado império romano.
Enfim, os publicanos eram o que de pior, de menos
moral se podia encontrar entre os judeus.
E Zaqueu era um desses, e não somente isso, era o
chefe de alguns desses: “era chefe dos
cobradores de impostos e muito rico”.
Lucas descreve Zaqueu como de pequena estatura: “era muito baixo”.
Zaqueu era um homem de baixa
estatura, pequenino, e ficou sabendo que Jesus, na sua caminhada para
Jerusalém, passaria por sua cidade Jericó.
Teve um desejo ardente de
ver o Divino Mestre, ou, pelo menos, observá-lo passar pelas ruas; isso já o
satisfaria.
A multidão o rodeia facilmente e ninguém faz o favor
de lhe abrir espaço.
Zaqueu tinha uma só virtude: uma inexplicável
curiosidade. Morria de vontade de ver Jesus, e talvez nem soubesse o porque. Mas, a multidão que
acompanhava Jesus era imensa e Zaqueu, no meio do povo, como era de baixa
estatura, muito pequeno, todos ficavam à sua frente e, por isso, ele não
conseguia ver Jesus.
Zaqueu não desistiu; foi
perseverante, foi persistente e não se acomodou enquanto não encontrou um meio
de ver Jesus. Correu na frente de todos, alguns quarteirões, onde imaginou que
Jesus fosse passar e, ciente de sua pouca estatura, não hesitou em se humilhar tomando
uma atitude de criança, tornando-se criança e, deixando de lado a sua posição
social, o seu alto cargo administrativo, a sua autoridade, o conceito que
julgava ter diante do povo, subiu em uma árvore, uma figueira, não se
importando com aquilo que, possivelmente, o povo diria dele que, sem dúvida,
riria dessa sua atitude infantil. Não se importou com nada disso e subiu na
figueira aguardando ansiosamente o momento em que Jesus deveria passar
por ali.
Não demora muito, Jesus
passa... Zaqueu estava em um lugar privilegiado, acima de todos, de onde
poderia ver perfeitamente Jesus, contemplar a sua majestade, o seu porte digno
e a sua candura irrepreensível.
Zaqueu tinha alcançado o seu
objetivo: ver Jesus. Satisfez o seu desejo e, para isso, teve que ser
perseverante, não se preocupou com o trabalho que teria para alcançar o seu
objetivo e, finalmente, se humilhou, subindo em uma árvore, não se importando
com a opinião dos outros, mas conseguiu o seu intento. Tinha que ver Jesus a qualquer custo, mesmo passando
por ridículo.
Quando lemos e meditamos os
santos Evangelhos é que vemos maravilhas e vamos, gradativamente, descobrindo
as melhores maneiras de nos encontrarmos com Jesus que, constantemente, passa
em nossa vida.
Para o encontro com o Divino
Mestre há a necessidade de, primeiro, ter o desejo ardente de encontrá-lo,
depois de aceitá-lo como Salvador; em seguida ser persistente e perseverante e
não descansar enquanto não alcançar o objetivo; dando continuidade, não se
preocupar com o trabalho e sacrifícios que vai ter para esse encontro
maravilhoso e, finalmente, ser humilde para que, através do gesto de humildade,
Jesus possa dirigir o seu olhar, a sua misericórdia e a sua palavra da verdade
e convidar quem o busca para fazer parte de sua mesa.
Zaqueu, homem poderoso, rico
e prepotente, porém pequeno, de baixa estatura, dá a todos a maior lição de
humildade, e é recompensado com esse encontro com o Divino Mestre.
Existem muitas passagens na
vida de Jesus que parecem confusas, e que dão muito o que pensar. Coisas que
acontecem de repente e, esse repente, muda completamente a vida de quem não
vivia de conformidade com os preceitos evangélicos.
Com Zaqueu aconteceu assim:
a sua curiosidade, a sua persistência, a sua perseverança em simplesmente ver o
Divino Mestre, mudou totalmente a sua vida:
“Ele procurava ver quem era Jesus, mas não o conseguia por causa da multidão,
pois era de baixa estatura. Correu então à frente e subiu num sicômoro para ver
Jesus que iria passar por ali. Quando Jesus chegou ao lugar, levantou os olhos
e disse: ‘Zaqueu, desce depressa, pois hoje devo ficar em tua casa.’ Ele desceu
imediatamente e recebeu-o com alegria. À vista do acontecido, todos murmuravam,
dizendo: ‘Foi hospedar-se na casa de um pecador’!” (Lc 19,1-7).
Que belo exemplo Zaqueu dá. Quem
quiser encontrar realmente Jesus, precisa seguir o exemplo de Zaqueu. E Zaqueu
foi recompensado. Quando Jesus chegou debaixo da figueira onde se encontrava
empoleirado Zaqueu, o Mestre olha para cima, possivelmente sorri, e lhe diz: “Zaqueu, desce depressa, pois hoje devo
ficar em tua casa.” (Lc 19,5).
E o interessante de tudo
isso é que Zaqueu não conhecia Jesus, e humanamente falando, Jesus também não
conhecia Zaqueu; os dois jamais haviam se encontrado, se visto, se cruzado nas
estradas da vida, e Jesus chama Zaqueu pelo nome; Jesus sabia o nome de Zaqueu
como sabe o nome de cada um de nós, e está sempre nos convidando para descermos
do arbusto do nosso orgulho, da nossa vaidade, do nosso comodismo, da nossa
ociosidade, da nossa preguiça, para que ele “possa
ficar em nossa casa”, possa ficar conosco.
E Jesus manda Zaqueu descer
da árvore e hospeda-se em sua casa, levando para aquele lar a salvação. E a
língua maldizente do povo não perde a oportunidade e critica a atitude de
Jesus, dizendo: “Foi hospedar-se na casa
de um pecador.” (Lc 19,7), e, para os que assim pensam e julgam, Jesus tem
uma resposta: “Com efeito, eu não vim
para chamar justos, mas pecadores.” (Mt 9,13). E Jesus foi hospedar-se na
casa de Zaqueu sem medo de contaminar-se com os seus pecados ou com que, os que
se julgavam santos, pensavam ou falavam.
O evangelista não narra, mas,
possivelmente, Zaqueu ofereceu um almoço ou jantar para Jesus e sua comitiva. O
evangelista continua a sua narrativa dizendo que “Zaqueu ficou de pé e disse a Jesus...” (Lc 19,8a). Para dirigir-se a Jesus, Zaqueu tomou uma
atitude de respeito: “ficou de pé”:
tudo leva a crer que estava sentado à mesa com Jesus.
A conversa que eles tiveram
enquanto ceiavam, com certeza, tocou fundo o coração de Zaqueu. Ele reconheceu
ser um pecador, um explorador do povo, um defraudador dos pobres, e a mensagem
de Jesus atingiu o seu coração. Numa atitude de contrição e de tentar ressarcir
a quem ele tinha extorquido, disse a Jesus: “Senhor,
eu dou a metade dos meus bens aos pobres e, se defraudei alguém, vou devolver
quatro vezes mais”. (Lc 19,8b).
Sendo ele chefe dos
cobradores de impostos, com certeza, naquela cidade não havia alguém que Zaqueu
não tivesse extorquido qualquer valor monetário.
Jesus entendeu que Zaqueu
estava falando a verdade e que, a partir daquele momento ele mudaria de vida e
mentalidade, e afirmou: “Hoje a salvação
entrou nesta casa, porque também este homem é um filho de Abraão. Com efeito, o
Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido”. (Lc 19, 9-10).
Jesus sentiu-se satisfeito,
não tanto pela refeição que lhe foi oferecida por Zaqueu, mas por ter realizado
a vontade do Pai: “O meu alimento é fazer
a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra.” (Jo 4,34). No céu
também houve festa, porque: “Haverá no
céu mais alegria por um só pecador que se converte, do que por noventa e nove
justos que não precisam de conversão. [...] Os anjos de Deus sentem a mesma alegria por
um pecador que se converte. [...] Mas era
preciso festejar e nos alegrar, porque esse seu irmão estava morto, e tornou a
viver; estava perdido, e foi encontrado”. (Lc 15,7.10.32).
A vida de Zaqueu transformou-se
radicalmente depois da conversa que teve com Jesus.
Esse encontro com Jesus
mudou a vida desse homem que explorava e roubava o povo protegido pela lei dos
opressores.
Zaqueu mudou de vida e de
mentalidade. Porque isso não acontece na nossa vida?
Todas as vezes que pegamos
as Escrituras para meditar subimos na árvore da busca do amor de Deus para ver
Jesus, e Jesus manda-nos descer da nossa prepotência, do nosso orgulho, da
nossa vaidade, do nosso desamor e tudo o mais que nos distancia do irmão e de
Deus. E porque, como Zaqueu, não mudamos de vida e de mentalidade?
Cada vez que meditamos as
Escrituras alguma coisa tem que mudar na nossa vida, senão estamos perdendo tempo...
Nesse encontro de Zaqueu com
Jesus existe um outro personagem que passa despercebido nessa passagem
evangélica que chama a atenção e, na meditação que fazemos, nos faz chegar à
conclusão que também nos dá lições de disponibilidade: é a árvore que Zaqueu
procurou para subir para ver melhor e mais de perto Jesus quando ele por ali
passasse.
A árvore que serviu de
escada, de pedestal para que Zaqueu, o homem pequenino, o homem de baixa
estatura, pudesse ficar um pouco mais alto, acima da multidão, para poder
melhor ver e olhar para Jesus, encarar Jesus e dar a oportunidade para que o
Divino Mestre olhasse para bem dentro de seus olhos e o convidasse a descer
depressa da árvore porque precisava conversar com ele e, em consequência disso,
Jesus “se convida” para ficar em sua casa para ali se hospedar: “... hoje devo ficar em tua casa.” (Lc
19,5).
Aquela árvore é o exemplo
autêntico do cristão verdadeiro.
Todos os cristãos deveriam
ser árvore onde aqueles que não conhecem a Jesus e gostariam de conhecê-lo, de
vê-lo mais de perto, pudessem subir e contemplar, mais do alto a maravilha
divina que é Jesus.
Todos deveríamos ser árvores
à beira do caminho onde Jesus deve passar para servirmos de apoio, de conforto,
de sombra, de fornecedores de frutos e de escada para que todos pudessem subir
e pudessem superar a sua pequena estatura na vivência cristã e na vida de fé, e
pudessem se desapegar um pouco do chão das iniquidades para se elevarem até
Jesus, como fez Zaqueu.
E esses que buscam a Jesus,
depois de estarem sobre a árvore, pudessem ser convidados pelo próprio Jesus
para mudarem de vida e de mentalidade, arrependerem-se e acreditarem no
Evangelho: “Arrependei-vos e crede no
Evangelho.” (Mc 1,15): “Arrependei-vos,
porque está próximo o Reino dos Céus.” (Mt 4,17).
Nessa passagem evangélica é
exatamente a árvore onde Zaqueu subiu o personagem que passa mais despercebido,
e foi com a ajuda dessa árvore que Zaqueu superou a sua pequena estatura, tanto
física como da fé, se desapegou do chão, se elevou e chegou até Jesus.
Todos nós, cristãos, deveríamos
ser árvores. Mas árvores frutíferas.
Árvores frondosas, com
galhos fortes que pudessem suportar o peso de todos os irmãos que precisam de
nós para se achegarem a Jesus.
Árvores frondosas e
frutíferas que acolhessem a todos em sua sombra para repousarem e renovarem as
suas energias; sombra que seria a nossa palavra amiga, o nosso conforto, a
nossa presença e o nosso apoio a todos aqueles que precisam de um amigo sincero
que os conduza para o verdadeiro caminho que leva à verdade e que dá a vida que
não se acaba mais...
Depois que Zaqueu viu Jesus
e Jesus a Zaqueu, Jesus manda Zaqueu descer da árvore para que outros possam
subir quando Jesus novamente passar por aquele caminho; e Zaqueu, por causa da
árvore, que é o exemplo autêntico do cristão verdadeiro, essa árvore que o elevou
do chão e o colocou frente-a-frente com o Divino Mestre, teve a felicidade
extrema de receber Jesus em sua casa, de receber a Salvação em seu lar,
conforme disse o próprio Senhor Jesus: “Hoje
a salvação entrou nesta casa...” (Lc 19,9).
Precisamos ser árvores,
apoio para todos aqueles que desejam ver e conhecer mais e melhor e de perto a
Salvação que vem de Deus Pai.
Nenhum comentário:
Postar um comentário