quinta-feira, 24 de maio de 2018

O QUE É UM DIÁCONO NA IGREJA?

O QUE É UM DIÁCONO NA IGREJA?

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Diácono Milton Restivo

Hoje, 24 de maio, faz onze anos que recebi o Sacramento da Ordem no grau do Diaconato Permanente da nossa Igreja. Foi o Cardeal D. Orani João Tempesta, na época bispo da Diocese de São José do Rio Preto, atendendo ao apelo e à necessidade da Igreja, quem introduziu o Diaconato Permanente na nossa Diocese. Quem ordenou a mim e ao Diácono Amâncio, hoje de saudosa memória, os dois primeiros Diáconos Permanentes ordenados na e da Diocese de São José do Rio Preto/SP, foi o nosso bispo da época, D. Paulo Mendes Peixoto, hoje Arcebispo de Uberaba/MG.
Nessa mesma data fui provisionado na Paróquia São Pedro e São Paulo, no Jardim Vitória Régia, São José do Rio Preto/SP, onde permaneço provisionado até a presente data.
O Diácono Permanente é o único cristão que recebe todos os sacramentos da Igreja porque, além do Sacramento da Ordem, como os Presbíteros e Bispos, recebe também o Sacramento do Matrimônio, Sacramento este que os Presbíteros e Bispos da Igreja não recebem.
Mas, o que é ser Diácono na e da Igreja?
Comecemos pela sua instituição administrativa contida no livro dos Atos dos Apóstolos: “o número dos discípulos tinha aumentado, e os fiéis de origem grega começaram a queixar-se dos fiéis de origem hebraica. Os de origem grega diziam que suas viúvas eram deixadas de lado no atendimento diário” (At 6,1).

Vemos que, em Jerusalém, não eram somente judeus que haviam se convertido para a Igreja do Caminho mas, também, fiéis de origem grega aderiram aos ensinamentos do Divino Mestre.
As pessoas carentes por parte dos judeus tinham atendimento preferencial por parte da comunidade, enquanto que os necessitados de origem grega e ou estrangeiros eram negligenciados e, por isso, reclamaram. Para serem encarregados dessa tarefa foram escolhidos sete homens, todos de origem grega, “de boa fama, repletos do Espírito e de sabedoria” (At 6,3).
Jamais poderíamos dizer com segurança que, ao serem encarregados esses sete homens para esse mistér, estava instituído na Igreja o ministério diaconal porque, em primeira instância, Jesus foi o primeiro diácono e o diácono por excelência: “quem de vocês quiser ser grande, deve tornar-se o servidor de vocês; e quem de vocês quiser ser o primeiro, deverá tornar-se servo de vocês. Pois, o Filho do Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e dar a sua vida como resgate em favor de muitos” (Mt 20,26-28).
Ninguém criou nada se já Jesus não tivesse sido ou dado o exemplo. O fato de os Apóstolos escolherem sete homens “de boa fama, repletos do Espírito e de sabedoria” no meio da comunidade é consequência daquilo que Jesus já fizera e dera o exemplo na última ceia quando lavou os pés dos seus discípulos e disse: “Vocês compreenderam o que eu acabei de fazer? Vocês dizem que eu sou o Mestre, o Senhor. E vocês têm razão; eu sou mesmo. Pois bem: eu que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”. (Jo 13,12-17).
Os Apóstolos, ao designarem esses sete homens, apenas acordaram para a realidade de que a Igreja de Jesus Cristo é diaconal por excelência, nasceu diaconal e deixa de ser Igreja se não for diaconal. Ao designar esses homens para esse serviço, os Apóstolos estavam delegando a eles um serviço, que em primeiríssimo lugar, era deles próprios, os Apóstolos, conforme disse o teólogo Collins que, fazendo isso, os Apóstolos poderiam continuar com o seu ministério apostólico no Templo, entre os judeus, ministério esse que era uma diaconia, a de proclamar ali a Palavra. Isso deixa claro e é biblicamente correto que o ministério diaconal na Igreja foi instituído antes mesmo do ministério presbiteral. O presbítero que não tenha sido diácono, que não tenha vivido a sua diaconia intensamente e que não continue com seu ministério diaconal por toda a sua vida, não está exercendo o ministério a que fora chamado, mas se converteu em um profissional do altar, e como temos profissionais do altar.
A Igreja é, por excelência, diaconal, servidora, a exemplo de Cristo, que disse: “o Filho do Homem não veio para ser servido. Ele veio para servir e dar a sua vida como resgate em favor de muitos” (Mt 20,28). Os sete homens escolhidos eram de origem grega e, portanto, eles deveriam desempenhar a sua diaconia entre os cristãos de origem grega, e isso quer dizer que, não somente suprir as necessidades materiais desse seguimento, mas de proclamar também a Palavra para eles.
Para ficar claro isso, nada melhor que buscar a opinião de um mestre em Teologia, Júlio César Bendineli, constante do seu livro “Diaconia da Palavra”, página 68: “É por isso que os Atos dos Apóstolos apresentam, na sequência, Estevão pregando em Jerusalém e, pouco depois, Filipe, como sendo o responsável pelo progresso da Palavra na Samaria (At 8,4ss), isto é, para além de Jerusalém e da Judéia. Mais adiante, o mesmo Filipe voltará à cena, quando será chamado, não por acaso de Evangelista (At 21,8). Sua missão o levaria até a Cesaréia, um porto usado para se viajar a Roma (At 8,4-14.26-40), objetivo final da trajetória da Palavra nos relatos lucanos”.
E continua Júlio César Bendineli no mesmo livro, página 69: “Os diáconos, assim como os Apóstolos, eram enviados com a função, principalmente, de anúncio do Evangelho, e mais tarde, na era patrística, sempre apareciam associados aos bispos e aos presbíteros no ministério da Palavra, especialmente no contexto catequético [...] Em resumo, a essência do ministério dos antigos diáconos era a mediação, o ofício de ser ponte ente a Igreja e o mundo, operado pela mensagem/palavra que transmitiam na condição de representantes de uma autoridade (bispo) em nome da qual exerciam funções caritativas ou de cuidado com o próximo, sempre conectadas com a pregação do Evangelho”.
O livro dos Atos dos Apóstolos se preocupa em colocar em relevo os dois dentre esses sete homens escolhidos pelos apóstolos que se distinguiram pela pregação da Palavra, aos quais, nesse livro, foi dado destaque especial: Estevão e Filipe. Estevão que, inclusive, foi martirizado a pedradas por proclamar e testemunhar a Palavra, conforme é narrado no livro dos Atos dos Apóstolos, capítulo 7. Foi justamente pelo zelo da proclamação da Palavra que Estevão atraiu contra si feroz oposição por parte dos judeus. Uma de suas mensagens sobre o Reino de Deus acendeu a fúria dos ouvintes que confrontados no seu pecado resolveram matá-lo.
Em seu martírio, Estevão teve uma visão do céu aberto e Jesus de pé ao lado do Pai. O diácono morreu pedindo que Deus perdoasse os seus algozes, entre os quais estava Saulo de Tarso, que mais tarde se tornaria o mais célebre dos apóstolos.
O outro desses sete homens que se destacou pela proclamação da Palavra, foi Filipe (não o apóstolo). Felipe, não que não tenha se limitado às tarefas do dia-dia da igreja e do seu ministério, mas, homem consagrado a Deus, foi orientado pelo Espírito Santo a seguir pelo caminho que ligava Jerusalém a Gaza. Na estrada, aproximou-se correndo da caravana de um alto oficial etíope, eunuco, administrador dos bens de sua rainha. O oficial lia um trecho do livro do profeta Isaías, sobre Jesus. O etíope convidou Filipe a subir no carro e Felipe usando a palavra do profeta, pregou o Evangelho com tamanha unção que o oficial creu e quis ser batizado ali mesmo, à beira do caminho. Após batizar o oficial, Filipe foi arrebatado pelo espírito do Senhor, deixando o etíope maravilhado com o poder de Deus, conforme é narrado nos Atos dos Apóstolos, 8,26-40.
Jesus, que veio ao mundo “para servir e não ser servido”, deu o exemplo da diaconia na última ceia quando, “se levantou da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Colocou água na bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando com a toalha que tinha na cintura. [...] Depois de lavar os pés dos discípulos, Jesus vestiu o manto, sentou-se de novo, e perguntou: ‘Vocês compreenderam o que eu acabei de fazer? Vocês dizem que eu sou o Mestre, o Senhor. E vocês têm razão; eu sou mesmo. Pois bem: eu que sou o Mestre e o Senhor, lavei os seus pés; por isso vocês devem lavar os pés uns dos outros. Eu lhes dei o exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”. (Jo 13,4-5.12-17).
Isso é diaconia. Isso é ser diácono, imitando o exemplo do Mestre. Não se é papa, nem bispo e nem padre se não for diácono, tanto é que o primeiro degrau para o ministério ordenado é a ordenação à diaconia; mas esse período entre a diaconia e o presbiterato é tão curto que muitos presbíteros se esquecem que, antes de serem presbíteros, são diáconos e que deveriam continuar sendo, não importando o grau de ordenação que tenham recebido. Prova disso está quando o Papa Francisco em uma Quinta-feira Santa, quando da cerimônia do Lava-pés, colocou a sua estola na transversal, como a usa os diáconos, da direita para a esquerda, e lavou os pés dos seus fiéis.
A estola é o símbolo da dignidade e do compromisso do ministro ordenado, e a estola do diácono é na transversal, e isso lembra a toalha cingida na cintura por Jesus para lavar os pés dos seus discípulos. Pena que a memória da última ceia, quando Jesus lava os pés dos discípulos para dar o exemplo da diaconia a todos, acontece, na nossa Igreja, somente na cerimônia da Quinta-feira Santa que, em muitos lugares, é mais transformado em teatro do que em liturgia e memória.
Seria esse o objetivo de Jesus ao dizer: “Eu lhes dei o exemplo: vocês devem fazer a mesma coisa que eu fiz. Eu garanto a vocês: o servo não é maior que o seu senhor, nem o mensageiro é maior do que aquele que o enviou. Se vocês compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática”. (Jo 13,15-17)? Acredito que não.
O “lavar os pés” uns dos outros não tem dia e nem horário marcado; a diaconia do povo de Deus deve acontecer quando o amor fala mais alto e nos arremete a entender e a atender a necessidade do próximo, e para isso não existe dia específico e nem precisamos procurar: ela vem ao nosso encontro.
Os diáconos, como os bispos e presbíteros, são pastores, apascentadores, são aqueles que cuidam, protegem e instruem o rebanho de Deus, tendo como modelo, o Senhor Jesus Cristo, o Sumo e Divino Pastor.
A função do diácono, assim como a do bispo e a do presbítero, é o de ensinar a sã doutrina, refutar a heresia, ensinar a Palavra de Deus e dirigir a igreja local de acordo com os preceitos bíblicos, morais e espirituais contidos na Palavra de Deus.
A recomendação de Paulo a Timóteo, contida na primeira carta a Timóteo, não devemos entendê-la dirigida apenas e somente aos diáconos, como muita gente entendida em teologia quer impor, mas essa recomendação foi, indistintamente, a todos os que “aspira cargo de direção” na Igreja, isto é, diáconos, presbíteros e epíscopos, a todos os que têm ministério ordenado dentro daquilo que lhe é próprio e no grau da ordem que lhes são conferido: “Seja irrepreensível, esposo de uma única mulher, ajuizado, equilibrado, educado, hospitaleiro, capaz de ensinar, não dado a bebida, nem briguento, mas indulgente, pacífico e sem interesse por dinheiro. Ele deve ser homem que saiba dirigir bem a própria casa, e cujos filhos lhe obedeçam e respeitem. Pois se alguém não sabe dirigir a própria casa, como poderá dirigir bem a Igreja de Deus?” (1Tm 2,2-5).
Não pode dirigir a Igreja de Deus quem não sabe dirigir a própria casa.
São os diáconos sozinhos que dirigem a Igreja de Deus? Não. São o papa, os bispos, os presbíteros e os diáconos, cada qual com suas responsabilidades específicas. Então a recomendação de Paulo foi para todos. Isso foi dito assim porque quando foi escrita essa recomendação não estava implantado ainda o celibato na Igreja: epíscopos e presbíteros, assim como os diáconos, eram todos casados ou, pelo menos podiam casar-se. Até o papa, como era o caso de Pedro, era casado.
A proclamação do Evangelho nas liturgias da Palavra e da Eucaristia por parte do diácono é um costume antiguíssimo da Igreja, uma vez que, dentre os seus serviços, a proclamação da Palavra, principalmente pelo anúncio, é atribuição inerente do seu ministério ordenado.
Como uma pessoa eclesial, o diácono tem de permanecer próximo da Palavra.
Os documentos de "Santo Domingo" nos dizem que o diácono permanente é o único a viver a dupla sacramentalidade, que nem o bispo e nem o presbítero vivem: - o sacramento da ordem e o sacramento do matrimônio -. Um não elimina o outro.
Tanto a vida do ministro ordenado como a de quem recebeu o sacramento do matrimonio é, portanto vivida em sua plenitude na pessoa do diácono permanente.
Em artigo difundido no portal da arquidiocese do Rio de Janeiro, o Cardeal Dom Orani considera que a retomada do ministério diaconal, “como uma vocação própria, é uma grande riqueza para nós. Tive a oportunidade de poder vivenciar várias experiências ligadas ao diaconato permanente, seja em minha paróquia, seja iniciando a escola diaconal em minha primeira diocese (São José do Rio Preto/SP) ou então continuando uma caminhada das mais antigas do Brasil, na arquidiocese anterior a que servi”, conta Dom Orani.
O arcebispo afirma que percebeu “a importância e o valor do diaconato permanente, tanto no campo social como na presença evangelizadora da Igreja nos diversos âmbitos e também nas comunidades. Posso testemunhar, por minhas experiências, a riqueza da vida, da missão e do trabalho diaconal o bem que se faz à Igreja”.

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