XXXII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO “C”
Cor – verde; Leituras: 2Mc 7,1-2.9-14; Sl 16; 2Ts
2,16.3,1-5; Lc 20,27-38.
“OS SADUCEUS AFIRMAM QUE NÃO EXISTE RESSURREIÇÃO” (Lc 20,27).
Diácono Milton Restivo
A primeira leitura desta liturgia é tirada do
Segundo livro dos Macabeus. Os dois livros dos Macabeus são considerados livros
deuterocanônicos e não se encontram nas Bíblias protestantes.
No Século XVI
os reformadores protestantes removeram parte do Antigo Testamento que eles
julgaram que não seriam compatíveis com a sua teologia.
Os livros
deuterocanônicos são os sete livros que constam na Bíblia Católica e que não
existem nas Bíblias judaica e protestante.
Além disso,
partes de outros dois livros também são considerados deuterocanônicos. Essa é a
maior e a principal diferença entre a Bíblia Católica e a Bíblia Protestante.
Todos esses
livros estão incluídos no Antigo Testamento.
São chamados de
deuterocanônicos os livros: Tobias, Judite, I Macabeus, II Macabeus, Sabedoria,
Eclesiástico e Baruc. Além desses livros, existem trechos de outros dois livros
que são considerados deuterocanônicos: Ester
10,4-16 e Daniel 3,24-90 e ainda os capítulos 13 e 14.
Também, no início do protestantismo, os protestantes
relutaram em aceitar alguns livros do Novo Testamento, que foram qualificados
como não inspirados, mas que foram aceitos depois por eles. Estes livros do
Novo Testamento são: a carta aos Hebreus, a carta de Tiago, a carta de Judas, a
segunda carta de Pedro, a segunda carta de João, a terceira carta de João e Apocalipse.
Também no início não aceitavam o final do Evangelho de Marcos, capítulo
16,9-20, que foi incorporado depois.
O Segundo Livro dos Macabeus não é, como
facilmente se poderia supor, a continuação do primeiro, nem tem o mesmo autor.
De comum entre os dois existe apenas o clima de perseguição à fé, orquestrada
igualmente pelos Selêucidas (sírios), embora narrada de um modo menos histórico
e mais edificante.
O Segundo livro dos Macabeus é importante pelas
afirmações que contém sobre o culto aos mortos (2Mc 12,43-46) e a ressurreição dos
mortos (2Mc 7,9; 14,46), as sanções de além-túmulo (Mc 6,26), o mérito dos
mártires (2Mc 6,18-31; 7,14), a intercessão dos santos (2Mc 15,12-16) e a prece
pelos defuntos (2Mc 12,45). Estes ensinamentos, referentes a pontos que os
outros escritos do Antigo Testamento deixavam incertos, explicam sua aceitação
pela Igreja Católica.
A igreja protestante juntamente com o judaísmo
consideram tais doutrinas apresentadas no livro como heréticas, mas concordam
que o livro tem notável valor histórico (porém consideram o primeiro livro como
de maior valor).
Isso posto, voltemos à primeira leitura deste
domingo. Narra a história do martírio de uma mãe e seus sete filhos: “Aconteceu
também que sete irmãos foram presos juntamente com a sua mãe. Espancando-os com
relhos e chicotes, o rei pretendia obrigá-los a comer carne de porco, que era
proibida.” (2Mc 7,1). De acordo com a lei de Moisés, a carne de porco e de
alguns outros animais era impura e os judeus estavam, por lei, proibidos de
consumi-las: “Dentre os animais que ruminam ou têm casco fendido, vocês não
poderão comer as seguintes espécies: o camelo, pois, embora seja ruminante, não
tem o casco fendido; ele deve ser considerado impuro. Considerem impuro o
coelho, pois embora seja ruminante, não tem o casco fendido. Considerem impura
a lebre, pois embora seja ruminante, não tem o casco fendido. Considerem impuro
o porco, pois apesar de ter o casco fendido, partido em duas unhas, não rumina.
Não comam a carne desses animais, nem toquem o cadáver deles, porque são
impuros.” (Lv 11,4-8; Dt 14,3-21). Os que comiam a carne desses animais, automaticamente
estavam excluídos da religião judaica.
Mais tarde viria Jesus e diria: “Escutem todos
e compreendam: o que vem de fora e entra numa pessoa, não a torna impura; as
coisas que saem de dentro da pessoa é que a tornam impura. Quem tem ouvidos
para ouvir, ouça. [...] É o que sai da pessoa que a torna impura. Pois é
de dentro do coração das pessoas que saem as más intenções, como a imoralidade,
roubos, crimes, adultérios, ambições sem limites, maldades, malícia,
devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo. Todas essas coisas saem
de dentro da pessoa e a tornam impura.” (Mc 7,14-16.20-23).
Jesus explicou porque disse isso: “Será que nem
vocês entendem? Vocês não compreendem que nada do que vem de fora e entra numa pessoa pode torná-la impura,
porque não entra no seu coração, mas em seu estômago, e vai para a privada?
Assim Jesus declarava que todos os alimentos eram puros.” (Mc 7,18-19).
Mas, o que importa na nossa meditação, é que a mãe
e os sete irmãos judeus não sabiam disso e nem conheciam Jesus e nem a sua
mensagem, porque Jesus viria cerca de cento e cincoenta anos depois, e eles,
fieis que eram, deviam obedecer, à risca, a lei de Moisés, ainda que isso lhes
custasse a vida, o que aconteceu realmente. E essa leitura vem de encontro com
a discussão que Jesus teve com os saduceus, que não acreditavam na
ressurreição.
Antes do segundo irmão morrer de forma violenta
para defender a sua fé, ele disse ao rei que assistia aos seus tormentos: “Você,
bandido, nos tira desta vida presente, mas o rei do mundo nos fará ressuscitar
para uma ressurreição eterna de vida, a nós que agora morremos pelas leis
dele.” (2Mc 7,9). O terceiro irmão, antes do último suspiro, dá o seus
testemunho na ressurreição: “Vale a pena morrer pelas mãos dos homens,
quando se espera que o próprio Deus nos ressuscite. Para você, porém, não
haverá ressurreição para a vida.” (2Mc 7,14).
Um a um os irmãos foram mortos pela sua fé,
acreditando na ressurreição. Por último foi a vez da mãe, que presenciou com
valentia, a morte de todos os seus sete filhos. E é a respeito da ressurreição
dos mortos, que os saduceus não acreditavam, que aborda o Evangelho desta
liturgia.
Mas, quem eram os saduceus? Os saduceus
geralmente eram ricos, latifundiários e da elite judaica, e ocupavam cargos de
prestígio em Israel, como o de sumo sacerdote. Eram também a maioria no
Sinédrio (conselho que julgava assuntos da lei judaica e da justiça criminal
entre os judeus). Eram adeptos dos romanos e tinham uma grande preocupação em
acatar as decisões de Roma (que dominava Israel no período em questão), porque
Roma protegia os seus bens, dando, muitas vezes, mais importância à política do
que à religião. Vale destacar que os saduceus não eram bem vistos pelo povo, já
que faziam parte da elite e apoiavam os romanos.
Esse grupo
deixou de existir após a destruição do Templo de Jerusalém, em 70 dC, já que
tinha uma forte tendência política. Os saduceus eram
extremamente auto-suficientes, ao ponto de negar o envolvimento de Deus na vida
quotidiana. Eles não acreditavam e negavam qualquer ressurreição dos mortos (Mt
22,23; Mc 12,18-27; Lc 20,27; At 23,8). Eles negavam qualquer vida depois da
morte, defendendo a crença de que a alma perecia com a morte; eles acreditavam
que não há qualquer penalidade ou recompensa depois da vida terrena. Eles negavam
a existência de um mundo espiritual, ou seja, anjos e demônios (At 23,8).
Os saduceus, a
princípio, não se importaram muito com a pregação de Jesus até sentir que os
ensinamentos de Jesus poderiam colocar em risco a tranquilidade da dominação
romana na Judéia, e isso poderia ir ao encontro de seus interesses financeiros
e do estar bem com os romanos.
Desta feita são
eles que se aproximam para tentar Jesus e perguntar sobre uma coisa que eles
não acreditavam, e para tanto, lançaram mão da lei do levirato, imposta por
Moisés para os judeus.
Levirato é o costume, observado entre alguns
povos, que obriga um homem a casar-se com a viúva de seu irmão quando este não
deixa descendência masculina, sendo que o filho deste casamento é considerado
descendente do morto que levará o nome do falecido para continuar a
linha sucessória e a descendência familiar. Este costume é mencionado no Antigo Testamento como uma das leis de
Moisés. O vocábulo deriva da palavra "levir", que em latim significa
“cunhado” ou “irmão do marido”. Assim determina a lei de Moisés: “Quando irmãos morarem juntos, e um deles morrer, e
não tiver filho, então a mulher do falecido não se casará com homem estranho,
de fora; seu cunhado estará com ela, e a receberá por mulher, e fará a
obrigação de cunhado para com ela. E o primogênito que ela lhe der será
sucessor do nome do seu irmão falecido, para
que o seu nome não se apague em Israel.” (Dt 25,5-6).
E os saduceus, baseando-se na lei mosaica, narram
uma história fantástica de uma mulher que se casou com um irmão, vindo este a
falecer sem deixar descendência masculina e, para cumprir a lei, casou-se assim
com o outro que morreu da mesma forma, casando-se com sete irmãos e todos
morreram e nenhum deixou descendência masculina.
E, no final da estória, eles concluem: “Por fim
morreu também a mulher e agora? Na ressurreição, de quem a mulher vai ser
esposa? Todos os sete se casaram com ela,” (Lc 20,32-33). E eles que
pareciam ser homens cultos e inteligentes.
Interessante que, para tentarem Jesus, eles
buscaram os escritos da lei mosaica, mas, para entenderem sobre a ressurreição
eles ignoraram o conteúdo do segundo livro dos Macabeus, onde os jovens
martirizados falam e morrem na esperança da ressurreição.
Esta passagem também é narrada por Mateus 22,23-33
e Marcos 12,18-27.
E Jesus, pacientemente, responde aos saduceus como
se estivesse numa sala de primeiro ano de catequese porque eles, primeiro,
desconheciam totalmente o que as Escrituras falavam sobre ressurreição e,
segundo, não tinham o menor interesse em conhecer porque eram ricos, gozavam a
vida e, para eles não existia tipo de vida melhor do que eles viviam. Mudou
alguma coisa hoje? Por que pensar na eternidade se a vida que se vive satisfaz
totalmente? Por isso Lucas diz que “Os saduceus afirmam que não existe
ressurreição” (Lc 20,27). Se observarmos nos nossos dias, os que negam a
ressurreição e pregam a reencarnação são como os saduceus, que têm uma vida
cômoda, pertencem à classe média e média alta e estão satisfeitos com a vida
que vivem. Por isso, acham que, se não alcançarem a vida eterna nesta vida,
terão outras chances de vidas futuras e assim vão vivendo a vida que querem. Ressurreição
é doutrina cristã; reencarnação é doutrina espírita. São caminhos que não se
cruzam.
Exemplos na
Bíblia Sagrada contradizem a doutrina da reencarnação. O que dizer do ladrão
crucificado no Calvário ao lado de Jesus que se arrependeu? Jesus diz a ele: “Em
verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23,43). Esse ladrão
tinha motivos de sobra para reencarnar mais de mil vezes por causa de seus
crimes até se tornar perfeito, como pregam os reencarcionistas. Jesus perdoou
pecados do ladrão e lhe garantiu a vida eterna. Moisés e Elias apareceram na
transfiguração de Jesus. Nada indica que tenham retornado à vida corpórea para
serem purificados. Foram reconhecidos pela fisionomia original.
Quem espera
novas vidas para se purificar, seria bom ler a parábola contada por Jesus no
Evangelho de Lucas 16,19-31, onde o rico, que viveu uma vida confortável, de
festa e de dinheiro fácil não teve a oportunidade defendida de voltar a uma
nova vida para apagar seus pecados e se purificar. E Jesus é categórico quando
diz: “Não fiquem admirados com isso, porque vai chegar a hora em que todos
os mortos que estão nos túmulos ouvirão a voz do Filho, e sairão dos túmulos:
aqueles que fizeram o bem, vão ressuscitar para a vida; os que praticaram o
mal, vão ressuscitar para a condenação.” (Jo 5,28-29).
Na cena de
consternação da morte de Lázaro, narrada por João 11,1-44, Jesus diz à Marta,
irmã de Lázaro: “Seu irmão vai ressuscitar’ Marta disse: ‘Eu sei que ele vai
ressuscitar na ressurreição, no último dia’. Jesus disse: ‘Eu sou a
ressurreição e a vida. Quem acredita em mim, mesmo que morra, viverá. E todo
aquele que vive e acredita em mim, não morrerá para sempre. Você acredita
nisso?’ Ela respondeu: ‘Sim, Senhor. Eu acredito que tu és o Messias, que
deveria vir a este mundo’.” (Jo 11-23b-27). O que pode ser acrescentado a
isso para não colocar em dúvida a ressurreição?
O Apóstolo
Paulo atesta a ressurreição de Jesus: “Eu vos transmiti principalmente o que
eu mesmo recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras;
que foi sepultado, e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. [...] Ora,
se nós pregamos que Cristo ressuscitou dos mortos, como é que alguns de vocês
dizem que não há ressurreição dos mortos? Se não há ressurreição dos mortos,
então Cristo também não ressuscitou; e se Cristo não ressuscitou, a nossa
pregação é vazia e também é vazia a fé que vocês têm. Se os mortos não
ressuscitam, então somos testemunhas falsas de Deus, pois estamos testemunhando
contra Deus, ao dizermos que Deus ressuscitou Cristo. Pois, se os mortos não
ressuscitam, Cristão também não ressuscitou. E se Cristo não ressuscitou, a fé
que vocês têm é ilusória, e vocês ainda estão nos seus pecados. E desse modo,
aqueles que morreram em Cristo estão perdidos. Se a nossa esperança é somente
para esta vida, nós somos os mais infelizes de todos os homens.” (1Cor
15,3.12-19).
E agora?
Acreditamos em Jesus Cristo ou em Alan Kardec e seus seguidores?
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