III DOMINGO DO ADVENTO
Ano – A; Cor – roxo;
Leituras: Is 35,1-6.10; Sl 145 (146); Tg 5,7-10; Mt 11,2-11.
“É VOCÊ QUE DEVE VIR OU
DEVEMOS ESPERAR POR OUTRO?” (Mt 11,3).
Diácono Milton Restivo
A liturgia deste terceiro domingo do Advento nos
traz, novamente, o profeta Isaias, que é uma figura constante neste tempo do
Advento.
Isaías foi o profeta do Antigo Testamento que mais
vaticínios fez a respeito do Messias, e todas confirmadas nos Evangelhos e Atos
dos Apóstolos.
Assim como o tempo do Advento prepara os fiéis
para a vinda de Jesus, Isaias, nesta leitura, conforta o povo israelita que
estava exilado e escravizado em terras estrangeiras e vislumbra dias melhores
para o povo, dizendo que Yahweh vem para salvá-los, antevendo a era messiânica
que o profeta ansiava: “Fortaleçam a mão
cansada, firmem os joelhos cambaleantes; digam aos corações desanimados: ‘Sejam
fortes! Não tenham medo! Vejam o Deus de vocês: ele vem para vingar, ele traz
um prêmio divino, ele vem para salvar vocês” (Is 35,3-4).
Isaías procura elevar a moral e a auto estima do
povo escravizado dando-lhe injeções de ânimo, esperança e otimismo: “Alegrem-se o deserto e a terra seca, o
campo floresça de alegria; como o narciso, cubra-se de flores transbordando de
contentamento e alegria, pois lhe será dado o esplendor do Líbano, a beleza do
Carmelo e do Sarão” (Is 35,1-2a).
Isaías convoca a todos para contemplar as
maravilhas de Yahweh: “Todos verão a
glória de Yahweh, a beleza do nosso Deus” (Is 35,2b), e descreve as
maravilhas que Yahweh irá realizar no meio do povo e para a reabilitação do seu
povo: “Então, os olhos dos cegos vão se
abrir, e se abrirão também os ouvidos dos surdos; os aleijados saltarão com
cervo, e a língua do mudo cantará...” (Is 35,5-6a). E não somente isso,
porque Yahweh vai devolver ao povo a terra que perdera pela sua infidelidade: “... jorrarão águas no deserto e rios na
terra seca. A terra seca se mudará em vargens e o chão seco se encherá de
fontes. E onde viviam os lobos, a erva se transformará em taboa e junco” (Is
35,6b-7).
Mas Yahweh quer que seu povo volte à santidade e
preparará uma estrada por onde somente deverão passar os fiéis a Yahweh: “Haverá ai uma estrada, um caminho, que
chamarão de caminho santo. Impuro nenhum passará por ele, e os bobos não vão
errar o caminho. Ai não haverá leão, nenhum animal selvagem poderá alcançar
esse caminho. Por ele só andarão os que foram redimidos e os que foram
resgatados por Yahweh” (Is 35,8-10a).
No final Isaías transcreve a alegria que o povo irá
viver depois de ter sido libertado da escravidão e voltado para a sua terra de
origem: “Cantando irão voltar e chegar
até Sião: carregarão uma alegria sem fim e serão acompanhados de prazer e
alegria; a tristeza e o pranto fugirão” (Is 35,10b).
Isaías não se contenta em somente antever e
transmitir segurança, alegria e otimismo ao povo, mas profetiza que Yahweh fará
realizar tudo isso e afirma, que, com o Messias, estará em plenitude o “Espírito do Senhor Yahweh”, colocando
isso na boca do Prometido que haveria de vir:
“O Espírito de Yahweh está sobre mim, porque Yahweh me ungiu. Ele me enviou
para dar a boa notícia aos pobres, para curar os corações feridos, para
proclamar a libertação dos escravos e pôr em liberdade os prisioneiros, para
promulgar o ano da graça de Yahweh, o dia da vingança do nosso Deus, e para
consolar todos os aflitos, os aflitos de Sião, para transformar sua cinza em
coroa, seu luto em perfume de festa, seu abatimento em roupa de gala” (Is
61,1-3a).
Yahweh confirma tudo isso através do próprio
Isaias: “Eu sou Yahweh. No tempo certo,
farei isso prontamente” (Is 60,22b).
Yahweh cumpriu suas promessas na pessoa de Jesus
Cristo, como fora dito por Isaias: “Vejam
o meu servo, a quem eu sustento: ele é o meu escolhido, nele tenho todo o meu
agrado. Eu coloquei sobre ele o meu espírito, para que promova o direito entre
as nações” (Is 42,2; Mt 12,18). Esse Messias, anunciado por Isaías, nos foi
apresentado pelo próprio Yahweh por ocasião do batismo de Jesus por João
Batista nas margens do rio Jordão: “Este
é o meu Filho amado, que muito me agrada” (Mt 3,17) e ainda, por ocasião da
transfiguração de Jesus no monte: “Este é
meu Filho amado que muito me agrada. Escutem o que ele diz” (Mt 17,5).
O Salmo desta liturgia corrobora as profecias de
Isaías sobre a missão do Messias quase que com as mesmas palavras e acrescenta
mais algumas coisas: “Ele mantém a sua
fidelidade para sempre, fazendo justiça aos oprimidos, e dando pão aos
famintos. Yahweh liberta os prisioneiros. Yahweh abre os olhos dos cegos, Yahweh endireita os encurvados. Yahweh ama os
justos. Yahweh protege os estrangeiros, sustenta o órfão e a viúva, mas
transtorna o caminho dos injustos” (Sl 146 (145),6b-9). Este Salmo é uma
oração de louvor e adoração: “Louve a
Yahweh ó minha alma. Vou louvar Yahweh enquanto eu viver. Vou tocar ao meu Deus
enquanto existir. [...] Feliz quem se apoia no Deus de Jacó, quem
coloca sua esperança em Yahweh seu Deus” (Sl 146 (145),1-2.5).
Fica-nos a incerteza se este Salmo foi escrito
antes ou depois de Isaias, mas conforta-nos em ver a sintonia das afirmativas,
espectativas e esperança na vinda do Messias, as maravilhas que ele operaria, e
o que ele faria para conduzir o povo de Deus ao seu verdadeiro destino.
A segunda leitura é tirada da Carta de Tiago. O
nome “Tiago” é uma forma aportuguesada de “Jacó”, nome comum entre os
israelitas. São citados três personagens no Novo Testamento com esse nome, dois
deles como Tiago “Maior” e Tiago “Menor”: “Entre
elas estavam Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o menor...” (Mc 15,40); e o terceiro apenas Tiago, o “irmão” de Jesus.
Os apelidos “Maior” e “Menor” dado aos dois primeiros foi para diferenciá-los
por terem o mesmo nome, possivelmente seja porque o primeiro era mais alto ou
mais velho; é uma explicação razoável. Tiago Maior era filho de Zebedeu e Salomé
(Mt 27,56; cf Mc 15,40) e irmão do
apóstolo João, junto com o qual foi chamado ao apostolado (Mt 4,21; Jo 1,35-39).
Tiago Maior foi o primeiro apóstolo a ser
martirizado: decapitado sob as ordens de Herodes Agripa I no ano 44 dC (At
12,2). Tiago Menor era filho de Alfeu (Mt 10,3; Mc 3,18; At 1,13), também um
dos doze apóstolos, e o terceiro é Tiago, chamado de “o irmão” de Jesus (Mt
13,55; Mc 6,3), filho de Cleofas e Maria (cf Mc 15,40; Jo 19,25), e não de José
e Maria, pais de Jesus, portanto, não irmão de sangue de Jesus.
Este último Tiago foi chamado “irmão” de Jesus,
possivelmente por ser primo de Jesus ou pertencer à família, como era costume
entre os judeus, e não pertenceu ao colegiado apóstólico, isto é, não foi
chamado a ser apóstolo de Jesus, mas teve papel preponderante na Igreja
primitiva de Jerusalém; depois da fuga de Pedro (At 12,17) ficou sendo o
primeiro bispo da comunidade cristã de Jerusalém (Gl 1,19; 2,9.12) e, com Pedro
e João, foi chamado por Paulo de coluna da Igreja nascente (Gl 2,9).
É a esse Tiago que é atribuída esta Carta de
Tiago. Esta carta não tem um destinatário único ou individual, mas é dirigida “às doze tribos espalhadas pelo mundo” (Tg
1,1).
A Carta de
Tiago foi escrita a todos os cristãos do seu tempo espalhados pelo mundo
inteiro e trata de assuntos práticos da vida cristã. O autor fala de pobreza e
riqueza, tentação, preconceito, maneira de viver, de falar, de agir, de como
não criticar; fala sobre o orgulho, a humildade, a paciência, a oração e a fé.
Tiago destaca a
necessidade de não somente crer, mas, acima de tudo, agir. Não adianta nada
alguém dizer que tem fé se não provar, por meio das suas ações, que a sua fé é
viva e verdadeira: “Do mesmo modo que o
corpo sem espírito é cadáver, assim também a fé: sem as obras ela é cadáver”
(Tg 2,26). A verdadeira fé cristã manifesta-se em atitudes e obras cristãs.
Se lermos a carta na sua totalidade vamos ver que
ela frisa que a fé deve ser demonstrada pelas obras: “Meus irmãos, se alguém diz que tem fé, mas não tem obras, que adianta
isso? Por acaso a fé poderá salvá-lo? [...] Alguém poderia dizer ainda: ‘Você tem a fé, e eu tenho as obras. Pois
bem! Mostre-me a sua fé sem as obras, e eu, com as minhas obras, lhe mostrarei
a minha fé’. Você acredita que existe um só Deus? Muito bem! Só que os demônios
tambem acreditam e tremem!” (Tg 2,14.18-19).
Tiago, na sua carta, também chama a atenção para
os males que a língua humana proporciona e deixa claro qual é a verdadeira
religião: “Se alguém pensa que é
religioso mas não sabe controlar a língua, está enganando a si mesmo, e sua
religião não vale nada. Religião pura e sem mancha diante de Deus, nosso Pai, é
esta: socorrer os órfãos e as viúvas em aflição, e manter-se livre da corrupção
do mundo” (Tg 1,26-27). Sobre a força e perigo da língua seria interessante
ler a Carta de Tiago, 3,1-12. Também é na Carta de Tiago que encontramos a
origem do sacramento da Unção dos Enfermos: Alguém
de vocês está sofrendo? Reze. Está alegre? Cante. Alguém de vocês está doente?
Mande chamar os presbíteros da Igreja para que rezem por ele, ungindo-o com
óleo em nome do Senhor. A oração feita com fé salvará o doente: o Senhor o
levantará e, se tiver pecados, será perdoado” (Tg 5,13-15).
Tiago aconselha a confissão e é insistente no
ensinamento da oração persistente: “Confessem
mutuamente os próprios pecados e rezem uns pelos outros para serem curados. A
oração do justo, feita com insistência, tem muita força” (Tg 5,16).
A leitura de
Tiago desta liturgia chama a atenção sobre a perseverança e a paciência cristã.
Possivelmente,
por sentir a impaciência dos cristãos sobre a vinda de Jesus, que ainda não
estava bem definida, considerando que muitos pregadores entusiasmados e
imediatistas pregavam que Jesus estava prestes para vir imediatamente, e isso
causava ansiedade aos cristãos, Tiago aconselha paciência e dá como exemplo a
ação do agricultor: o grão, depois de sepultado na terra, por um longo período
não dá sinal de vida. O tempo passa, a chuva cai e o agricultor sabe que no
tempo certo surgirá a planta e depois o fruto. Tiago ensina que a atitude do
cristão deve ser a mesma do agricultor: confiante, perseverante, na certeza de
que, quando menos se esperar, o Senhor há de vir, conforme o mesmo Senhor havia
dito: “Quanto a esse dia e a essa hora,
ninguém sabe nada, nem os anjos do céu, nem o Filho. Somente o Pai é que sabe.
Prestem atenção! Não fiquem dormindo, porque vocês não sabem quando vai ser o
momento” (Mc13,32-33).
A vinda do
Senhor está próxima, sim. Mas o que é “próximo” para Deus? Moisés nos dá a
resposta no Salmo 90 (89): “Mil anos são
aos teus olhos como o dia de ontem que passou, uma vigília dentro da noite”. (Sl
90 (89),4). Na sua carta Pedro deixa mais claro o que é o tempo para Deus: “Há, porém, uma coisa que vocês, amados, não
deveriam esquecer: para o Senhor um dia é como mil anos e mil anos são como um
dia” (2Pd 3,8). Deu para entender o que o Senhor quer dizer quando diz: “a qualquer momento”? Será daqui um dia
ou daqui a mil anos? O importante é estar atento porque, pode ser hoje... Ou
daqui a mil anos... Nem os anjos do céu sabem...
Através do
profeta Isaias Deus deixa claro que o seu modo de pensar é diferente do modo de
pensar do ser humano: “Com efeito, os
meus pensamentos não são os vossos pensamentos, e os vossos caminhos não são os
meus caminhos, oráculo de Yahweh. Quanto os céus estão acima da terra, tanto os
meus caminhos estão acima dos vossos caminhos, e os meus pensamentos acima dos
vossos pensamentos”. (Is 55,8-9).
No Evangelho de
hoje “João estava na prisão” (Mt
11,2). João Batista fora encarcerado por Herodes
Antipas na prisão do castelo de Maqueronte, hoje Makaur, situado num rochedo a
leste do mar Morto. Ao tomar conhecimento da prisão de João e para se
resguardar e também não se expor ao perigo de ter o mesmo destino, Jesus voltou
para a Galiléia: “Ao saber que João tinha
sido preso, Jesus voltou para a Galiléia” (Mt 4,12). A partir de então
Jesus iniciou a sua pregação com as mesmas palavras de João. João Batista
pregava, dizendo: “Convertam-se, porque o
Reino do Céu está próximo” (Mt 3,2), e Jesus começou sua pregação, dizendo:
“Convertam-se, porque o Reino de Deus
está próximo” (Mt 4,17).
João, pela sua
vida austera e pelos seus ensinamentos de penitência e conversão, angariou
muitos seguidores, teve muitos discípulos, dois dos quais foram os primeiros
discípulos, depois apóstolos de Jesus: os irmãos João e Tiago (cf Mt 4,21 e Jo
1,35-39). Possivelmente, por Jesus dar início à sua pregação com as mesmas
palavras de João Batista, os discípulos de João enciumaram e devem ter ido
reclamar a João na prisão. Os discípulos de João
Batista duvidavam de que Jesus fosse o Messias, por ciúme e porque Jesus se
apresentava de maneira muito diferente do poderoso Messias que todos esperavam
que viesse como libertador político e militar do povo judeu da dominação
romana. Agora João proporciona aos seus discípulos a oportunidade de superarem
as idéias correntes acerca do Messias, vendo as coisas com os próprios olhos.
João sabia quem
era Jesus, mas, pela situação em que vivia, não estava fácil para ele
transmitir isso aos seus discípulos, que eram muitos. Nada melhor, então, do
que enviá-los até Jesus para que o próprio Jesus testemunhasse isso para eles.
E, pedagogicamente, foi o que João fez, e mandou que seus discípulos
perguntassem a Jesus: “És tu aquele que
há de vir, ou devemos esperar por outro?” (Mt 11,3). Jesus, possivelmente,
havia acabado de fazer muitas de suas maravilhas realizando curas, conforme
havia prenunciado o profeta Isaias: “Então, os olhos dos cegos vão se abrir, e
se abrirão também os ouvidos dos surdos; os aleijados saltarão com cervo, e a
língua do mudo cantará...”. (Is 35,5-6a) e Jesus, voltando-se para os discípulos de João, disse-lhes,
repetindo o que profetizara do Messias o profeta Isaias: “Voltem e contem a João o que vocês estão vendo e ouvindo: os cegos
recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são purificados, os surdos
ouvem, os mortos ressuscitam e aos pobres é anunciada a Boa Notícia”. (Mt
11,4-5; Is 29,18).
Estas são as obras que, segundo Isaías, deveriam
inaugurar a era messiânica. E Jesus complementa: “E feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim”. (Mt 11,6).
Feliz daquele que não perde a confiança em Jesus
nem tenha a sua fé abalada pela humildade e pobreza de Jesus ao invés da
grandeza e poder político e militar que se esperava que o Messias tivesse e que
Jesus não apresentou. Feliz daquele que não se envergonha da condenação e da
morte desonrosa que Jesus teria ao invés da grandeza, da glória e do poder de
dominação que deveria ter o Messias, como esperavam os judeus.
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