PRIMEIRO DOMINGO DO ADVENTO
Ano – B; Cor – roxo; Leituras: Is 63,16-17.19; 64,2-7; Sl 79 (80); 1Cor 1,3-9; Mc 13,33-37.
“O QUE EU DIGO A VOCÊS, DIGO A TODOS: FIQUEM VIGIANDO”. (Mc 13,37).
Diácono Milton Restivo
“O povo que andava em trevas viu uma grande luz, e aos que habitavam na região da sombra da morte, resplandeceu-lhes a luz.” (Is 9,2). Não poderia existir citação melhor do que essa do profeta Isaias para darmos início a um novo Ano Litúrgico e entrada ao período do Advento que antecede e prepara o povo de Deus para o Natal de Jesus Cristo. Isaias ainda diria: “O sol não será mais a luz do seu dia, e de noite não será a lua a iluminá-la; o próprio Yahweh será para você uma luz permanente, e o seu Deus será o seu esplendor. O sol dela jamais vai se por, e a sua lua não terá mais minguante, pois o próprio Yahweh será para você uma luz permanente.” (Is 60,19-20). Setecentos anos mais tarde Jesus diria: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue não andará nas trevas, mas possuirá a luz da vida.” (Jo 812); “Eu vim ao mudo como luz, para que todo aquele que acredita em mim não fique nas trevas.” (Jo 12,46). Estamos na expectativa de comemorar novamente a vinda dessa luz que virá até nós, como na primeira vinda do Salvador, quando já nos preparamos para a sua segunda vinda.
Este domingo, a que denominamos “primeiro domingo do Advento”, é também o primeiro dia e o primeiro domingo do novo Ano Litúrgico. O ano Litúrgico não acompanha o início e fim do ano civil ou comercial que começa no dia primeiro de janeiro e termina trinta e um de dezembro de cada ano. O Ano Litúrgico da nossa Igreja começa quatro domingos antes do Natal de Jesus Cristo e a esse período dá-se o nome de “Tempo do Advento”. A palavra "advento" significa literalmente "vinda, chegada", que é um tempo de vigilância e oração, de expectativa da primeira vinda de Jesus, o Salvador dos homens, a luz do mundo.
Durante todo o Ano Litúrgico a Igreja celebra todos os principais eventos da vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Advento é um tempo não tanto de penitência, mas de expectativa e preparação para a vinda do Senhor no Natal. Pela cor do Advento ser roxa, muitos associam o Advento com o tempo da Quaresma, que é tempo de jejum e penitência, enquanto que o Advento é tempo de expectativa, vigilância e oração. A cor roxa do Advento não tem o mesmo significado da cor roxa da Quaresma. O Advento é um tempo de alegre esperança da chegada do Senhor. Jesus vem e isso é motivo de muita alegria, onde os fiéis, vigilantes e orantes, esperam o nascimento de Jesus Cristo, o Emanuel – Deus conosco – (cf Is 7,14; Mt 1,23), vivem o arrependimento e promovem a fraternidade e a paz. Advento é o tempo de expectativa da vinda do Senhor.
Jesus foi o maior acontecimento da história da humanidade, conforme disse Agostinho, bispo de Hipona: “Um Deus que se fez homem para que os homens se tornassem filhos de Deus” e João, no seu Evangelho, afirma: “E a Palavra se fez homem e veio habitar entre nós. E nós contemplamos a sua glória: glória do Filho único do Pai, cheio de amor e fidelidade.” (Jo 1,14). Jesus é a Palavra do Pai. Se quisemos conhecer o som da voz do Pai, ouçamos Jesus.
Os personagens apresentados nas leituras do tempo do Advento são de pessoas fortes e decididas e que tiveram papeis preponderantes na preparação e na vinda do Messias: Isaias, o precursor João Batista, José e Maria.
As primeiras leituras dos três primeiros domingos do tempo do Advento são do profeta Isaias onde as principais passagens do seu livro são proclamadas durante o tempo do Advento num anúncio perene de esperança para os homens de boa vontade de todos os tempos (cf Lc 2,14). Isaias foi o profeta mais messiânico de todos os profetas e que, durante os tempos difíceis do exílio do povo eleito nas terras da Babilônia, levou a consolação e a esperança.
Na segunda parte do seu livro, dos capítulos 40 a 55, chamado de “o Livro da Consolação”, Isaias anuncia a libertação, fala de um novo e glorioso êxodo e da criação de uma nova Jerusalém, reanimando assim, os exilados que não perdem a esperança de voltarem para a terra natal.
Nas leituras dos Evangelhos do segundo e terceiro domingo do Advento aparece com destaque a figura de João Batista, que foi o último dos profetas e segundo o que o próprio Jesus falou para as multidões: “O que vocês foram ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? O que vocês foram ver? Um homem vestido com roupas finas? Ora, os que se vestem com roupas preciosas e vivem no luxo estão nos palácios dos reis. Então, o que vocês foram ver? Um profeta? Eu garanto que sim: alguém que é mais que um profeta. É de João que a Escritura afirma: ‘ Eis que eu envio o meu mensageiro à tua frente: ele vai preparar o teu caminho diante de ti’. Eu digo a vocês: entre os nascidos de mulher ninguém é maior que João.” (Lc 7,24b-28a).
João Batista pregou aos povos a conversão pelo conhecimento da salvação e perdão dos pecados, conforme profetizou seu próprio pai: “E a você, menino, chamarão de profeta do Altíssimo, porque irá à frente do Senhor, para preparar-lhe os caminhos, anunciando ao seu povo a salvação, o perdão dos pecados.” (Lc 1,76).
A figura de João Batista, ao ser o precursor do Senhor e apontá-lo como presença já estabelecida no meio do povo, encarna todo o espírito do Advento. Por isso João Batista ocupa um grande espaço na liturgia desse tempo, em especial nos evangelhos do segundo e no terceiro domingo. João Batista é o modelo dos que são consagrados a Deus e que, no mundo de hoje, são chamados a também ser profetas do Reino, vozes no deserto e caminho que sinaliza para o Senhor, permitindo, na própria vida, o crescimento de Jesus e a diminuição de si mesmo: “É preciso que ele cresça e eu diminua” (Jo 3,30), levando, por sua vez os homens a despertar do torpor do pecado.
Ainda que a figura de José, esposo de Maria, não apareça com destaque nas leituras dos evangelhos deste Ano B e apenas no quarto domingo do Advento, onde se lê: “... a uma virgem, prometida em casamento a um homem chamado José”, (Mc 1,27), José se destaca como esposo de Maria, o homem justo e humilde que aceita a missão de ser o pai adotivo de Jesus.
Ao ser da descendência de Davi e pai putativo de Jesus, José tem um lugar especial na encarnação, permitindo que se cumpra em Jesus o título messiânico de “Filho de Davi”. José, no Evangelho de Mateus, é chamado “homem justo” (cf Mt 1,19). José é justo por causa de sua fé, modelo de fé dos que querem entrar em diálogo e comunhão com Deus.
A figura de Maria é primordial no desfecho do envio da Salvação para todos os povos. Não haveria melhor maneira de viver o Advento do que unindo-se a Maria como mãe, grávida de Jesus, esperando o nascimento do seu filho. Assim como Deus precisou do sim de Maria, hoje, Deus também precisa do nosso sim para poder nascer e se manifestar no mundo; assim como Maria se "preparou" para o nascimento de Jesus, a começar pele renúncia e mudança de seus planos pessoais para sua vida inteira, nós precisamos nos preparar para vivenciar o seu nascimento em nós mesmos e no mundo, também numa disposição de “Faça-se em mim segundo a sua Palavra” (Lc 1, 38), permitindo uma conversão do nosso modo de pensar, da nossa mentalidade, do nosso modo de viver e agir. Em Maria encontramos, realizando-se, a expectativa messiânica de todo o Antigo Testamento. A Salvação, antes de chegar até nós, passou primeiro por Maria, que foi chamada “cheia de graça” pelo anjo e que afirmou a presença do Senhor nela antes que ele viesse até nós na pessoa de Jesus: “O Senhor está com você” (Lc 1,28).
Isabel ratificou a presença do Senhor em Maria ao afirmar: “Você é bendita entre as mulheres, e é bendito o fruto do seu ventre [...] Bem-aventurada aquela que acreditou, porque vai acontecer o que o Senhor lhe prometeu” (Lc 142.45).
Também na liturgia do tempo do Advento temos a que chamamos “coroa do Advento”, ou seja, um círculo, sem princípio nem fim, simbolizando a eternidade, com quatro velas que indicam as quatro semanas do Tempo do Advento, as quatro fases da História da Salvação preparando a vinda do Salvador, os quatro pontos cardeais, as quatro arestas da Cruz de Cristo, a Luz do mundo, o Sol da salvação, que ilumina o mundo envolto em trevas.
O ato de acender a cada domingo uma das velas significa a progressiva aproximação do nascimento de Jesus, a progressiva vitória da luz sobre as trevas, repetindo o que dissera o profeta Isaias: “O povo que andava em trevas viu uma grande luz, e aos que habitavam na região da sombra da morte, resplandeceu-lhes a luz.” (Is 9,2).
Os ramos verdes, que devem enfeitar a coroa do Advento, simbolizam a vida e a esperança. As velas representam os séculos de escuridão, cada uma aumentando a luz até o Natal, quando comemoramos o nascimento de Jesus, a Luz eterna. Sabendo que as quatro velas representam os principais personagens lembrados no Advento – Isaias, João Batista, Maria, Jesus -. Apesar do número de velas na coroa do Advento ser quatro, cada comunidade se sente à vontade para colocar em cada uma a cor que mais vai de encontro com a solenidade que celebra: muitas comunidades colocam três velas roxas e uma branca, outras roxa, verde, vermelha ou rosa e branca.
As velas simbolizam a luz do Cristo ressuscitado, como vida nova e luz para o mundo. A vela roxa acessa no primeiro domingo do Advento, simboliza o profeta Isaías, que profetiza um mundo novo, que surgirá quando soubermos acolher, viver e praticar a boa nova. A vela verde acessa no segundo domingo do Advento, simboliza João Batista, que convida todos a conversão, para permitir que o Messias se manifeste, e que o mundo novo possa surgir. A vela vermelha ou rosa acessa no terceiro domingo do Advento, simboliza Jesus Cristo, que diz: “É feliz aquele que escuta a voz de alguém como João Batista, que aponta para o caminho, a verdade e a vida”.
No terceiro domingo do Advento a liturgia pode revestir-se de rosa, considerando que é um domingo de alegria, chamado “Gaudete”, simbolizando a alegria em meio à expectativa da chegada de Jesus. E a vela branca, acessa no quarto domingo do Advento, simboliza Maria, a Mãe de Deus. Nessa oportunidade a Igreja pensa em Maria, a Estrela da Manhã, que anuncia a vinda do Sol da justiça. Maria é a obra prima do Pai, pois tudo nela é obra do onipotente. É chamada cheia de graça (cf Lc 1,28), e é esta mesma graça que Deus quer dar em plenitude a todos nós. Neste primeiro domingo do Advento o profeta Isaias lamenta a situação em que se encontra o povo israelita longe de Yahweh e clama a ele: “Não fiques insensível, porque tu és o nosso pai, pois Abraão não nos reconhece mais e Israel não se lembra de nós. Yahweh tu és o nosso pai. Teu nome é desde sempre. Nosso Redentor. Yahweh, por que nos deixas desviar de teus caminhos? Porque fazes nosso coração endurecer e, assim, perdermos o teu temor?” (Is 63,15b-17a), e eleva a Yahweh um reconhecimento do seu poder e do grande amor que Yahweh tem pelo seu povo: “Diante de ti tremiam os povos, quando realizavas coisas terríveis que não esperávamos, coisas de que nunca se ouviu falar desde os tempos antigos. O ouvido jamais ouviu e o olho jamais viu que um Deus além de ti tenha feito tanto por aqueles que nele confiam.” (Is 64,2b-3), e reconhece a fragilidade do homem diante do Deus onipotente e criador: “Mas agora, Yahweh, tu és o nosso pai; nós somos o barro, e tu és o nosso oleiro; todos nós somos obras de tuas mãos.” (Is 64,7).
O Salmo é uma oração onde o salmista expõe o sofrimento que o povo passa no exílio em terras estrangeiras: “Yahweh Deus dos Exércitos, até quando ficarás irado enquanto teu povo suplica? [...] Porque lhe derrubaste as cercas (da sua vinha) para que os viandantes a saqueiem, e os javalis da floresta a devastem, e as feras do campo a devorem?” Sl 80 (79), e eleva uma súplica à Yahweh pedindo que a sua luz se volte para seu povo: “Desperta o teu poder e vem socorrer-nos. Restaura-nos, ó Deus! Faze brilhar a tua face, e seremos salvos”. (Sl 80 (79) 3b-4). Na segunda leitura o Apóstolo Paulo escreve aos coríntios incentivando-os a manterem-se fieis na perseverança e vigilância porque “na verdade, o testemunho de Cristo tornou-se firme em vocês, a tal ponto que não lhes falta nenhum dom, que esperam a Revelação de nosso Senhor Jesus Cristo. É ele que também os fortalecerá até o fim, para que vocês não sejam acusados no Dia de nosso Senhor Jesus Cristo. O Deus que chamou vocês para a comunhão com seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor, ele é fiel.” (1Cor 1,6-9).
No Evangelho e para que não aconteça novamente o que havia acontecido com o povo do Antigo Testamento, Jesus adverte sobre a perseverança, a vigilância e a oração: “Prestem atenção! Não fiquem dormindo, porque vocês não sabem quando vai ser o momento. [...] Vigiem, portanto, porque vocês não sabem quando o dono da casa vai voltar; pode ser à tarde, à meia noite, de madrugada ou pelo amanhecer. Se ele vier de repente, não deve encontrá-los dormindo. O que eu digo a vocês, digo a todos: fiquem vigiando.” (Mc 13,33.35-37).
Vigilância, perseverança e oração é o tema principal do tempo do Advento, como diria mais tarde Jesus enquanto rezava no Getsêmani: “Vigiem e rezem para não cair em tentação! Porque o espírito está pronto para resistir, mas a carne é fraca.” (Mc 14,38; Mt 26,41). A vigilância e perseverança sem a oração é inútil e até prejudicial. Paulo Apóstolo chamava a atenção de seus discípulos a respeito da vigilância, perseverança e oração: “Mas vocês, irmãos, não fiquem em trevas, de tal modo que esse dia possa surpreendê-los como um ladrão. Porque todos vocês são filhos da luz, filhos do dia. Não somos da noite nem das trevas. Portanto, não fiquemos dormindo como os outros, estejamos acordados e sóbrios.” (1Ts 5,4-6). No tempo do Advento a Igreja nos convida à perseverança, vigilância, oração, expectativa e alegria pela vinda do Filho de Deus que se fará homem para que todos os homens se tornem filhos de Deus.
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