SAGRADA FAMÍLIA: JOSÉ, MARIA E JESUS
Ano – A; Cor – branco; Leituras: Eclo 3,3-7.14-17; Sl 127 (128); Cl 3,12-21;
Mt 2,13-15.19-23.
“LEVANTE-SE, PEGUE O MENINO E A MÃE DELE E FUJA PARA O EGITO”.
(Mt 2,13).
Diácono
Milton Restivo
As festividades
do dia do Natal passaram, mas ainda continuamos saboreando a alegria de um Deus
que quis se fazer homem no seio de uma virgem, Maria, e escolhendo como pai
adotivo José, um homem justo. Está formada uma família: José, Maria e Jesus.
A idéia da
família sempre passeou nos pensamentos de Deus. A Trindade é uma família, a
família por excelência. Quando Deus criou o mundo, colocando nele todas as
maravilhas que o homem não soube preservar e conservar, “e Deus viu que era bom” (Gn 1,25),
Deus quis criar
o homem: “Façamos o homem à nossa imagem
e semelhança”. (Gn 1,26). Mas, percebendo que o homem estava muito
solitário, deu-lhe uma companheira, modelando-a da costela do homem (cf Gn
2,20-25). Agostinho de Hipona disse em um de seus sermões: "O Senhor fez a mulher não da cabeça do homem, para não ser sobre
ele, nem de seus pés, para não ser inferior a ele, mas a fez do seu lado, para
ser a sua companheira auxiliadora".
Entendemos com
isso que Deus não tirou a mulher do pé do homem, para que o homem se sentisse
superior a ela e a humilhasse. Não a tirou da cabeça do homem para que ela se
sentisse dominadora e subjugasse o homem. Tirou-a da costela, do lado do
coração, para que ambos tivessem a mesma dignidade e responsabilidade na
conservação das coisas que Deus criou.
Mas, Deus viu
que mesmo com a companheira, o casal permanecia solitário, e pensou que esse
casal só seria completo se tivesse filhos; por isso abençoou-os com a graça da
fertilidade para povoar a terra: “Sejam
fecundos, multipliquem-se, encham e submetam a terra. [...] E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo
era muito bom” (Gn 1,28.31). “Por
isso, o homem deixa seu pai e sua mãe, e se une à sua mulher, e eles dois se
tornam uma só carne” (Gn 2,24). Mais tarde, em discussão com os fariseus
que defendiam o divórcio, Jesus diria: “Vocês
nunca leram que o Criador, desde o início, os fez homem e mulher? E que ele
disse: ‘Por isso o homem deixará seu pai e sua mãe, e se unirá à sua mulher, e
os dois serão uma só carne? Portanto, eles já não são dois, mas uma só carne.
Portanto, o que Deus uniu, o homem não deve separar”. (Mt 19,5-6).
Ao entregar as
tábuas da lei para Moisés no cume do monte Sinai, no deserto, entre os dez
mandamentos ali citados, o Senhor não se esquece de chamar a atenção de todos
os filhos para que tenham respeito, amem e honrem seus pais, ao incluir entre
os seus mandamentos da Antiga Aliança, este: “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra
que Iahweh teu Deus, te dá” (Ex 20,12).
A primeira
leitura é uma jóia raríssima encontrada nas Sagradas Escrituras no livro do
Eclesiástico. É uma das páginas mais lindas sobre o amor e respeito que devem
reinar entre pais e filhos, onde o escritor sagrado fala do dever, do respeito
e dos cuidados que o filho deve aos seus pais. Está tão claro que até dispensa
comentários mais profundos, e começa valorizando a recompensa que Deus dispensa
para os pais que educam corretamente os seus filhos: “Deus honra o pai nos filhos e confirma, sobre eles, a autoridade da
mãe”. (Eclo 3,3). Depois o escritor sagrado aconselha o filho a honrar o
pai, a respeitar a mãe e a amparar a ambos na sua velhice e termina dizendo que
“a caridade feita a teu pai não será
esquecida, mas servirá para reparar os teus pecados e, na justiça, será para a
tua santificação”. (Eclo 3,15b-16).
A segunda
leitura, escrita por Paulo aos colossenses, Paulo começa fazendo uma
admoestação à comunidade sobre o amor e o perdão mútuo para agradecer a Deus o
amor e perdão que Deus lhe devota: “Como
escolhidos de Deus, santos e amados, vistam-se de sentimentos de compaixão,
bondade, humildade, mansidão, paciência. Suportem-se uns aos outros e se
perdoem mutuamente, sempre que tiverem queixa contra alguém. Cada um perdoe o
outro, do mesmo modo que o Senhor perdoou vocês. E acima de tudo, vistam-se com
o amor, que é o laço da perfeição. Que a paz de Cristo reine no coração de
vocês”. (Cl 3,12-15a). Na
continuação, Paulo exorta sobre a harmonia familiar, aconselhando que as
mulheres sejam solícitas para com os maridos, que os maridos amem suas esposas,
que os filhos obedeçam a seus pais e que os pais respeitem seus filhos: “Esposas, sejam solícitas a seus maridos,
pois assim convém a mulheres cristãs. Maridos, amem suas esposas e não sejam
grosseiros com elas. Filhos, obedeçam em tudo a seus pais, porque isso agrada
ao Senhor. Pais, não intimidem seus filhos, para que eles não fiquem
desanimados”. (Cl 3,18-21).
Em outras
cartas Paulo também se preocupa com a harmonia da família: “Filhos, obedeçam a seus pais no Senhor, pois isso
é justo. ‘Honre seu pai e sua mãe’ é o primeiro mandamento, e vem acompanhado
de uma promessa: ‘para que você seja feliz e tenha vida longa sobre a terra’. (Ef 6,1-3), e os cuidados paternos dos pais para com os filhos: Pais, não dêem a seus filhos motivo de revolta
contra vocês: criem os filhos, educando-os e corrigindo-os como quer o Senhor”. (Ef 6,4); “E que governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com
todo o respeito.” (1Tm 3,4). “Maridos,
amem suas mulheres, como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela... [...]
Os maridos devem amar suas mulheres como
a seus próprios corpos. Quem ama a sua mulher está amando a si mesmo. Ninguém
odeia a sua própria carne; pelo contrário, a nutre e dela cuida, como Cristo
faz com a Igreja. [...] Por isso, o
homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e os dois serão uma só
carne. Esse mistério é grande: eu me refiro a Cristo e à Igreja. Portanto, cada
um de vocês ame a sua mulher como a si mesmo, e a mulher respeite o seu
marido”. (Ef 5,25.28-29.30-33). Em algumas recomendações Paulo recomenda
que as mulheres sejam sujeitas, submissas ou solícitas aos seus maridos: “Mulheres, sejam submissas aos seus
maridos...” (Ef 5,22; Cl 3,18). Conforme o dicionário da língua portuguesa,
submissão significa: ato de submeter, sujeição, obediência voluntária,
docilidade. Submissão não é sinônimo e nada tem a ver com escravidão, maus
tratos, inferioridade ou dominação, assim como ser humilde não significa ser
inferior. A submissão, no sentido de colaboração, união, docilidade e
participação, deve existir de ambos para ambos para que a harmonia do casal
seja perfeita.
O Evangelho nos
traz a realidade do incômodo, maus tratos e até perseguição que a classe
abastada dirige aos menos afortunados com medo de que estes lhe roubem o poder
econômico e a posição social que ostentam. O rei Herodes quer matar o
recém-nascido Jesus porque os magos lhe disseram que ele seria o rei dos
Judeus: “Onde está o recém-nascido rei
dos judeus? Nós vimos a sua estrela no oriente e viemos para prestar-lhe
homenagem.” (Mt 2,2). A partir daí, vemos a preocupação de José, como chefe
e responsável da Família Sagrada, depois de ser avisado em sonhos por um anjo,
que lhe disse: “Levante-se, pegue o
menino e a mãe dele, e fuja para o Egito! Fique lá até que eu avise. Porque
Herodes vai procurar o menino para matá-lo”. (Mt 2,13b).
A família
constituída é, por excelência, a proteção de todos os seus membros.
A família é tão
importante na vida da pessoa humana que o próprio Filho de Deus, Jesus Cristo,
quando se fez homem, escolheu uma família, quis nascer de uma família, e essa
família de Nazaré, a qual os cristãos a denominam Sagrada Família, é o modelo a ser seguido por todas as famílias
cristãs. Os pais são os continuadores da criação de Deus; o Senhor dá aos pais
o poder de criar novas vidas, mas os pais devem assumir a responsabilidade de
orientar essas novas vidas, educá-las e encaminhá-las para o seu verdadeiro
destino, que é pertencer e serem herdeiros do Reino que Jesus Cristo veio
trazer para todos.
A família é o
primeiro contato que o homem tem com o seu Criador. A família é a Igreja
Particular de todos os cristãos e, bem por isso, Jesus escolheu, para nascer,
uma; quis ter uma família; por mãe, escolheu Maria, a virgem jovenzinha de Nazaré
e, para seu protetor e pai adotivo a José, “Homem
Justo” e, a partir de seu nascimento, já não eram somente dois, José e
Maria; passaram a ser três: José, Maria e Jesus, completando-se, dessa forma, o
tríduo sagrado da família; a trindade da verdadeira família está formada: pai,
mãe, filho, e ou filhos.
A Sagrada
Família de Nazaré está completa, e esta é a família mais sagrada que pisou o
nosso chão. É a família mais santa e que existiu para servir de modelo a todas
as outras famílias.
José, o homem
justo, o marido amoroso, o pai cuidadoso, o homem trabalhador, honesto,
correto, zeloso, compreensivo, possuidor de todas as virtudes e adjetivos
positivos de um homem que toda ou qualquer mulher gostaria de ter como marido. As
Sagradas Escrituras, quando falam de José, o chamam de justo: “José, seu esposo, sendo justo...” (Mt
1,19) e, ser justo na linguagem das Sagradas Escrituras quer dizer ser amante
da justiça, ser temente a Deus, colocar sua vida nas mãos do Senhor e não fazer
outra coisa neste mundo senão a vontade de Deus.
Pelo pouco que
sabemos de José nas Sagradas Escrituras já é suficiente para traçarmos dele um
perfil de um homem de caráter, com personalidade firme, que sabia bem o que
queria, que relutava com tudo aquilo que achava que não estava certo, mas que,
quando o Senhor manifestava a sua vontade, José não relutava e se entregava
totalmente aos desígnios do Senhor.
Este é José, o chefe,
o pai da Sagrada Família, o marido fiel, o pai amoroso, o guarda fidelíssimo da
Virgem Maria e o protetor incondicional do Filho de Maria, a quem ele sabia ser
também Filho de Deus e de quem era pai adotivo.
Maria é a mãe
da Sagrada Família. Poderíamos passar a vida inteira falando de Maria que mesmo
assim não lhe chegaríamos aos pés para lhe dizer tudo o que ela é e merece,
tudo o que o Senhor fez por ela e o que ela representa no Plano de Salvação de
Deus. Maria, como mulher e esposa, e como mãe da Sagrada Família, foi aquela
que se fez escrava: “Eis aqui a escrava
do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.” (Lc 1,37) e que, mais do
que ninguém, se entregou nas mãos do Senhor para que, através dela, fosse
realizado o plano de salvação de Deus para os homens, e, por isso, todas as gerações
a chamam de bem-aventurada: “Minha alma
engrandece ao Senhor, e meu espírito
exulta em Deus, meu Salvador, porque olhou para a humildade de sua serva. Sim!
Doravante as gerações todas me chamarão de bem-aventurada, pois o Todo Poderoso
fez grandes coisas em meu favor.” (Lc, 1, 46-49).
A gravidez de
Maria, ocorrida de maneira sobrenatural e de forma incompreensível aos olhos
dos homens, (Lc 1,26-38), começou por mudar totalmente a sua vida e a vida do
mundo.
Depois, o
parto, acontecido de maneira inesperada e sem o menor conforto (Lc 2,1-20). Como
Maria deve ter sofrido, não tanto pelo desconforto por estar grávida de mais de
oito meses e ter de viajar sob o sol escaldante do deserto, durante o dia e do
frio cortante da noite, de Nazaré a Belém. Como Maria deve ter sofrido, não
tanto pelas circunstâncias do nascimento de seu Filho, o Rei dos Reis que, ao
contrário de nascer em um palácio rodeado dos cuidados das criadas, nasceu em
um curral mal cheiroso de estrume e urina de animais, rodeado de animais.
Como Maria deve
ter sofrido, não pela viagem de Nazaré a Belém, e muito menos pelas
circunstâncias do nascimento de seu Filho, que também é Filho de Deus, mas,
sofrido por ver o coração de pedra dos homens por rejeitarem, desde o
nascimento, o seu filho, o Filho de Deus, que vinha a este mundo exatamente
para dignificar a humanidade e elevá-la à honra de ser filha de Deus e herdeira
do Reino Celeste. Como se isso não
bastasse, Maria e José têm de fugir às pressas de Belém para as terras estrangeiras
do Egito, porque um rei louco e sem escrúpulos
não quer rival para o seu trono e procura matar o recém-nascido (Mt 2,
-23).
Jesus é o filho
dessa Sagrada Família. É Deus que quer se servir de uma família legalmente
constituída para atingir a todos os homens. E com o seu nascimento no seio de
uma família, Jesus santificou todas as famílias legalmente constituídas no amor
de Deus. Jesus poderia ter vindo a este mundo de outra maneira, pois que, ele é
Deus e pode determinar o que quer e como quer, mas ele quis abençoar a família
e fazer da família a primeira Igreja, onde se forma uma trindade santa a
exemplo da Santíssima Trindade. José é o exemplo de marido e pai que todos os
maridos e pais deveriam seguir. Maria, o exemplo que deve ser seguido por todas
as namoradas, noivas, esposas e mães, e a quem devemos amar de verdade, por ser
ela a face feminina de Deus, pois que foi ela a portadora da salvação, o canal
que ligou Deus aos homens, a escada pela qual o Filho de Deus desceu de seu
trono celestial para a miséria da humanidade. Jesus santifica de verdade essa
família e todas as famílias do mundo, porque Jesus é Deus, e onde está Jesus,
Deus se faz presente, e a Sagrada Família deve ser o exemplo de todas as
famílias cristãs.
A família de
Nazaré é, por excelência, a Sagrada Família, mas todas as famílias constituídas
em dignidade, amor, doação fraternidade, auxílio mútuo e abençoadas com o
sacramento do matrimônio, é uma família sagrada, é uma Sagrada Família, porque,
a exemplo da Família de Nazaré, onde o Filho de Deus procurou abrigo e amor, a
nossa família também o tem, recebido que foi, diante do altar, no sacramento do
matrimônio.
O testemunho do
Cristo e de seus pais demonstra o imenso resplendor que pode atingir uma vida
familiar comum, vivenciada em Deus, na simplicidade e num grande amor
compartilhado.
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